FREDERICO VASCONCELOS
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Contratos de obras do Tribunal de Justiça de São Paulo provocaram uma disputa entre integrantes do órgão.
A desembargadora Maria Lúcia Pizzotti acusa o presidente da corte, Paulo Dimas Mascaretti, de omissão por não mandar apurar fatos graves e inconsistências em contratos. Ela deve protocolar um pedido de providências no Conselho Nacional de Justiça.
Pizzottti sustenta que Mascaretti não acolheu vários pedidos de impugnação que apresentou, tendo prorrogado contrato com o consórcio Argeplan-Concremat, alvo de investigações.
Em vez de cancelar uma nova licitação, como ela sugeriu, o presidente aprovou o terceiro aditivo num contrato firmado em 2013 com o consórcio, para elaborar projetos e acompanhar obras executadas por outras empresas.
“É um contrato valiosíssimo, de R$ 130 milhões”, diz Pizzotti.
Em relatórios enviados ao presidente do TJ-SP, a desembargadora registrou “o desconforto de o tribunal permanecer atrelado a uma empresa que, nos últimos meses, vem ocupando as páginas policiais dos jornais”.
Um dos sócios da Argeplan é o coronel da PM aposentado João Baptista Lima Filho, investigado na Lava Jato. Amigo do presidente Michel Temer, o coronel Lima é um dos alvos da delação da JBS.
A desembargadora também registrou que a Concremat é investigada por supostos erros de projeto e de execução da Ciclovia Tim Maia, no Rio de Janeiro, que desabou em abril de 2016, quando morreram duas pessoas.
Mascaretti diz que isso não impede a prorrogação dos contratos, que vêm sendo cumpridos. Ele afirma que submeteu os questionamentos da desembargadora ao Órgão Especial, a instância máxima do tribunal.
O presidente da Comissão de Assuntos Administrativos do tribunal, desembargador Ademir de Carvalho Benedito, informou ao colegiado que a comissão ouviu a desembargadora. “Nenhuma irregularidade existe”, disse.
CERCEAMENTO
Pizzotti afirma que Mascaretti proibiu que as secretarias do tribunal fornecessem dados diretamente a ela, centralizando as informações no gabinete da presidência.
Na semana passada, o presidente proferiu uma decisão monocrática, determinando que a questão não deve voltar ao Órgão Especial. Pizzotti diz que, na semana passada, o presidente disponibilizou a vista aos autos do orçamento, o que negara antes.
“Estou tendo o meu direito de desembargadora e de cidadã cerceado”, diz ela.
O caso veio à tona no Órgão Especial no dia 26 de julho. Pizzotti atuava como suplente e votou pela não aprovação da proposta orçamentária de 2018. Ela reclama que Mascaretti não publicou o voto divergente.
Coordenadora da comissão de restauro do Palácio da Justiça, ela analisou outros contratos de obras e serviços. Alegou que não obteve dados para justificar gastos com “cifras desproporcionais”.
“Os valores referem-se apenas a projetos, e não a obras a serem executadas”, afirma.
Responsável pela execução da obra de restauro, a Concrejato pertence ao mesmo grupo da Concremat, responsável pela fiscalização dessa obra. “Isso é conflito de interesse”, diz.
Em três anos, o tribunal pagou cerca de R$ 680 mil a um arquiteto da Concremat, especialista em restauração. Ele foi substituído por um funcionário do tribunal. Para Pizzotti, a fiscalização por empresas do mesmo grupo nunca foi necessária.
Ela pediu a abertura de sindicância. A desembargadora já havia criticado o aumento do número de engenheiros contratados para fiscalizar obras. Afirmou que eram “pífios” os relatórios sobre engenheiros “transitando de uma comarca para outra”.
A desembargadora diz que 91% dos projetos envolvem obras de proteção e combate a incêndio, mas quase a totalidade não foi executada.
“Possivelmente, por ter como sócio um coronel da PM aposentado, praticamente todos os projetos de proteção e combate a incêndio em órgãos públicos de São Paulo foram executados pela Argeplan”, diz a juíza.
Ela questionou, entre outros itens, R$ 3,9 milhões para manutenção preventiva nos carros da frota do tribunal e R$ 250 mil para “reforma da cozinha do apartamento funcional dos juízes de Jundiaí”.