Fungos e bactérias têm um papel central na dinâmica biológica dosmanguezais. Apesar disso, pouco se conhece sobre os microrganismosdesses ecossistemas que cobrem uma área de 13.400 quilômetros quadradosao longo da costa brasileira.

Para preencher essa lacuna científica, um projeto conduzido no âmbitodo Programa Biota-FAPESP realiza estudos filogenéticos e de atividadesfuncionais visando a um levantamento completo da biodiversidade demicrorganismos nos manguezais paulistas. O Projeto Manguezais, em umano e meio de atividade, isolou cerca de 1,2 mil fungos, 450 bactérias,34 actinobactérias e 37 cianobactérias dos manguezais paulistas.

De acordo com o coordenador do projeto, Itamar Soares de Melo, daEmbrapa Meio Ambiente, unidade da Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (Embrapa), os primeiros resultados serão publicados emrevistas internacionais nos próximos meses. O projeto também já gerouduas teses de doutorado que serão defendidas em fevereiro naUniversidade de São Paulo.

Um dos principais objetivos da pesquisa, além de mapear a quantidade ediversidade de bactérias, fungos, leveduras e cianobactérias, écompreender suas atividades funcionais. “Embora sejam ricos em matériaorgânica, os manguezais são quase desprovidos de nitrogênio e fósforo,micronutrientes essenciais para as plantas. Temos quase certeza de quesão os microrganismos que se encarregam de fixar esses micronutrientesnas plantas, permitindo que elas subsistam”, disse Soares de Melo àAgência FAPESP.

Segundo o pesquisador, a compreensão das atividades funcionais dosmicrorganismos terá aplicações práticas, como o uso de bactérias demanguezais no controle biológico de doenças de plantas e a extração demetabólitos úteis para a indústria farmacêutica.

“Estamos estudando a diversidade química desses microrganismos com oobjetivo específico de extrair metabólitos como antibióticos,anticancerígenos, antifúngicos e herbicidas”, explicou.

Outro objetivo do projeto, segundo Soares de Melo, é a estruturação deum banco de germoplasma dos organismos estudados. “Queremos viabilizaruma base de recursos genéticos microbianos para realizar estudos sobrefisiologia de crescimento e preservação de microrganismos”, explicou.

Inovações biotecnológicas

Os resultados do projeto até agora incluem a descoberta de bactériasque produzem biossurfactantes que ajudam na biodegradação do petróleo.Outro avanço importante foi a descoberta de actinobactérias do gêneroStreptomyces, que produzem metabólitos antifúngicos, indicandopotencial de utilização no controle biológico em sistemas hidropônicos.

“Os cultivos hidropônicos, de alta importância econômica, sofrem comfungos fitopatogênicos aquáticos. Buscamos bactérias adaptadas que semantenham ativas por longos períodos em soluções nutritivas que podemviabilizar a prática do biocontrole e reduzir o uso de fungicidasquímicos”, disse Soares de Melo.

A maior parte das pesquisas, segundo o pesquisador, está sendo feitanos manguezais de Bertioga e Cananéia. “Temos vários estudos voltadospara a busca de bioprodutos e inovações biotecnológicas. Mas ofundamental do projeto é mesmo estudar a biodiversidade dessesmicrorganismos, tão pouco conhecida”, contou.

O próximo relatório do projeto deverá ficar pronto em abril. “Vamosfazer a identificação química dos compósitos bioativos que encontramos,além de colocar alguns desses organismos em condições de campo para oestudo de estratégias de controle biológico de doenças em cultivoshidropônicos”, disse.

O relatório também incluirá análises genéticas de vários dosmicrorganismos encontrados que ainda não foram identificados. SegundoSoares de Melo, a maioria das bactérias presentes em amostrasambientais não pode ser detectada por meio de microscopia convencional,porque elas ficam aderidas a partículas de solo e sedimento.

“Usamos o seqüenciamento genético, análise molecular, análisecromatográfica e ressonância magnética nuclear para identificar aestrutura de compostos e técnicas de biologia molecular para análise dadiversidade genética”, disse.