Há algum tempo vimos questionando e tentando mudar uma cultura equivocada que se criou no Brasil a partir do desenvolvimento da área que abriga o pool de entidades que prestam serviços à sociedade, sem se caracterizar como empresa propriamente dita nem como órgão público, chamada por isso de terceiro setor.

Por que a legislação cria obstáculos para que essas organizações paguem por serviços que lhes são prestados?
Depois de esgotar os recursos junto ao Tribunal de Contas do Paraná, que concluiu pela impossibilidade desse pagamento, estamos recorrendo ao governo do estado, por meio do vice-governador e Secretário da Educação, Flávio Arns, que conhece profundamente a problemática no âmbito de uma das maiores redes de entidades dessa natureza – as Apaes – Associações e Pais e Amigos de Excepcionais.

Estou falando como contador, mas a questão atinge profissionais de muitas outras áreas. E antes que me chamem de insensível, adianto que o segmento contábil possui um programa nacional de voluntariado, incentivando o espírito de solidariedade, altruísmo. Temos várias iniciativas em andamento, a maior parte relacionada às competências específicas dos contabilistas, como ajudar na fiscalização do uso de recursos públicos e na verificação da transparência das contas. São inúmeras, além disso, as ações de responsabilidade social. O CRCPR, por exemplo, ao longo do ano, oferece cursos e seminários, solicitando como inscrição apenas alimentos e brinquedos, doados a instituições beneficentes. Tradicionais são as campanhas Criança Feliz e Natal Solidário. Há muitos anos também, o Conselho apoia instituições que dependem de recursos captados por meio de incentivo fiscal. Embora a decisão da destinação seja das pessoas jurídicas e físicas, são os contabilistas que fazem os lançamentos nas declarações de renda, sabem dos prazos e valores, podendo informar os contribuintes sobre a possibilidade da doação. Graças a essa conscientização é que a arrecadação dos Fundos da Infância e da Adolescência (FIA) tem aumentado no Paraná.
Precisam ser clareadas, portanto, as fronteiras entre ação humanitária, movida por razões e valores morais, religiosos e sentimentais, e ação profissional, exercida como força de trabalho.

É uma das condições para que o terceiro setor supere distorções, amarras e vícios, fechando as brechas à pilantropia ( uso de instituições para fraudes ou para driblar o Fisco), corrupções de todo tipo, e amadureça, deixando para trás a improvisação e a ingenuidade que acredita poder salvar o mundo apenas com boa vontade.
Não somente no Brasil, mas em todo o mundo, o setor avança, no vácuo das políticas públicas, atuando nas áreas da educação, saúde, esporte, cultura, ciência, pesquisa, tecnologia, arte, lazer, meio ambiente, filantropia e outras.
As maiores entidades têm um ponto em comum: reúnem qualidades do primeiro setor – a vivência empresarial forjada na concorrência e na competência – e do segundo: as exigências legais e éticas.

A contabilidade ganha papel de destaque nessas organizações. Como o fim delas é sempre o ser humano e a fonte de recursos vem de subsídios, contribuições e doações, a obediência aos princípios e normas contábeis é imperativa, as demonstrações são complexas e devem ser evidenciadas com extremo rigor. Não podem ser mais ou menos e muito menos omitidas, mas elaborados por profissionais capacitados. É a contabilidade que vai dizer se seus recursos estão sendo usados corretamente; se são transparentes e continuam merecendo apoio.
Se quer cumprir bem o seu papel, o terceiro setor precisa investir em gestão, estrutura e mão-de-obra especializada, que precisa ser reconhecida e remunerada, nada impedindo a manutenção de frentes voluntárias.

Paulo Caetano é contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR