Claro que o objetivo desta coluna não é discutir cinema, porém não posso deixar passar sem um comentário a premiação do Oscar 2010 da Academia de Artes e Ciência de Hollywood. Os contrastes entre o filme premiado “Guerra ao Terror” de Kathryn Bigelow e “Avatar” de James Cameron – o seu maior competidor – são tão extremos que alguns anos atrás seria inimaginável a premiação de uma película que é praticamente um documentário. A crueza do tema – a Guerra do Iraque – as tomadas, a velocidade dos “takes” para acompanhar a rapidez das ações militares, a realidade e o destino dos soldados aparecem tal qual acorrem no cotidiano de uma luta sem trégua e sem resultado outro que a retirada das tropas como estará acontecendo ainda este ano. 

Evidentemente que o outro filme “Avatar” que concorria se apresenta com uma poética ou estética de cores, formas e tridimensionalidade que transforma as lutas em movimentos que talvez possam ser chamadas de dança ou ballet de personagens.

Entretanto, apesar da disparidade entre os meios e a visualidade apresentados nas telas dos cinemas, a temática dos dois filmes que concorriam à maior premiação da noite era exatamente a mesma, ou seja, a guerra e suas conseqüências. Isso sem falar da desigualdade econômica entre ambos os orçamentos com “Avatar” custando US$ 500 milhões e “Guerra ao E aqui coloco uma síntese do que escreveu Ferreira Gullart em sua coluna de domingo, 07 de março, na “Folha de São Paulo”, sobre a próxima Bienal de São Paulo, que, segundo foi divulgado pelos curadores, vai exibir filmes, instalações e fotografias da realidade que vemos todos os dias. Gullart então indaga: “A arte existe porque a realidade não nos basta, sabiam?”.

Neste libelo a favor da criatividade e do papel da arte, ele destaca a pintura que possibilita a visão de universos que não existem na vida real. Os movimentos de vanguarda do século 20, como o Cubismo, o Dadaísmo, o Neoplasticismo, o Surrealismo, o Fauvismo, o Futurismo, o Construtivismo, para citar apenas alguns, propiciam territórios antes inimagináveis que enriquecem a vida do ser humano.

Assim, a criatividade dos artistas trabalha para levar o público a ter vislumbres de sonhos, de fantasias, de universos concebidos somente na concretude da matéria artística e é este o papel da arte – o qual nos faz fugir da difícil realidade da vida. A matéria dos sonhos se transforma em elementos visíveis através dos meios de expressão – tinta, pincel, buril, pedra, argila – para nosso deleite, para nosso enriquecimento visual. Afinal, toda a história da arte é uma história da criatividade humana em seus diversos modos de expressão.

E aí reside a principal diferença entre os dois filmes já citados: a fantasia, a invenção. Um deles que reproduz o que não se quer ver: as lutas, as batalhas, o calor, o suor dos soldados, os ferimentos, o suspense, os gritos, a tensão nervosa diante da real possibilidade de se levar um tiro ou morrer agora e ali mesmo, a torcida para a sobrevivência, o pensamento sobre o retorno vivo – sim ou não – para a casa ou então o corpo já sem vida que será devolvido para a família em luto e que será enterrado nos Estados Unidos da América.  Não faço referência às demais nações que também estão ali aquarteladas, porque o maior contingente militar é, sem dúvida nenhuma, o americano; porém estes procedimentos são iguais para todos os demais exércitos dos países que lá prestam serviço.
Voltando a “Avatar”, o que este nos dá, além de um vôo na imaginação, é a possibilidade de vislumbrar e participar da vida em outro planeta, que, aliás, não deixa de ter uma notável semelhança com a Terra, e mais especificamente a sua flora com a nossa floresta amazônica.

E também participar, graças à projeção IMAX, na tridimensionalidade de todos os cenários que nos transportam a uma nova e fascinante etapa de exploração visual. Invenção de canadenses, o IMAX tem registrado uma série de filmes que vão do laboratório espacial russo MIR ao laboratório Internacional da NASA às profundezas dos mares e agora à sofisticada animação em três sentidos.
Então, no território dos sonhos, o que Hollywood preferiu? Estranhamente, foi premiada a dura realidade, com o filme “Guerra ao Terror”, por sinal, dirigido pela mulher de James Cameron.  E o que se pode deduzir disso?
Talvez as cenas chocantes respondam melhor ao clima de séries de TV baseadas na realidade como as de análise periciais de crimes – que adoro! – ou um retorno ao “cinema verdade” realizado com orçamento mínimo ou ainda – e creio ser este o principal fator – uma necessidade de repelir a extrema visualidade à qual hoje somos submetidos. Tudo é visão, então é melhor permanecer com a que pareça mais com o real.