Na medida em que a arte foi saindo do cavalete e se descartando dos suportes tradicionais como o desenho do papel, a pintura da tela, a escultura dos materiais rígidos, a questão do espaço foi se tornando um dos requisitos mais importantes da arte do século 20 e, conseqüentemente, dos anos 2000.

A obra de arte passou a não ser simplesmente colocada e sim, entronizada em recintos – quer fossem eles palácios, residências ou museus – demandando um espaço que relaciona suas dimensões com as do cômodo, levando em conta itens como: a importância do trabalho do artista, a relevância da pessoa retratada ou o tema da obra, a amplidão do local, o tamanho dos móveis, o aspecto arquitetônico das construções, incluindo até sua harmonia com as obras vizinhas.

Voltando no tempo, nas exposições do século 19, mesmo nos Salões Oficiais, os trabalhos eram colocados lado a lado, amontoados de cima abaixo nas paredes sem sobrar um centímetro livre entre eles. Nas casas de família também o espaço era exíguo devido à influência da era vitoriana *, e as obras de arte disputavam o espaço com os papéis de parede floreados, os detalhes decorativos, os veludos pesados nas cortinas e estofados e os maciços móveis entalhados cobertos de bibelôs, vasinhos e miniaturas.
As obras de arte começaram a sair desta restrição de área aos poucos, e principalmente após o período da Art Nouveau – final do século 19 e início do 20 – o primeiro movimento a conseguir conciliar o espaço interior de uma casa, uma vez que esta vertente artística acabou por transformar a casa inteira numa obra de arte.

Ao término da Primeira Guerra Mundial e o início do movimento Dadaísta se chega à arquitetura dos grandes edifícios desenvolvida em torno de 1920 nos Estados Unidos. Ali, a Art Deco, cujo nome vem de arte decorativa, vai geometrizar as edificações e os ambientes criando nichos especialmente concebidos para a exibição de obras de arte. Assim as pinturas, as pequenas esculturas – o que a Art Deco tem muito – começam a integrar com destaque e a decoração de qualquer casa, sendo encaradas como arte e não mais como meros enfeites.

Esta situação da obra de arte em si, permaneceu no período entre 1945 e 1960, fazendo frente às novas tendências artísticas surgidas após a Segunda Guerra Mundial.
Porém, a década de 1960 se constituiu num divisor de águas no campo das artes visuais, com a emergência de inúmeros conceitos artísticos que subverteram as questões teóricas da arte que existia até então, derrubando inclusive os limites entre as diversas modalidades. Assim, não existem mais os territórios separados do desenho, da pintura, da gravura, da escultura.E aqui, mais uma vez, cresce novamente o espaço da obra de arte, não só o espaço dentro de uma tela de pintura, mas também e principalmente a necessidade do entorno que é o espaço ao redor de uma obra. Também a pintura que possui relevos necessita que as paredes adjacentes a ela não tenham outras obras para evitar interferências. Requisitar maior espaço em cada sala – seja em residências ou outros locais – significa cômodos ampliados, grandes galerias, museus maiores.
Paradoxalmente, numa época em que as moradias comuns se restringem ao estritamente necessário, com os quartos e salas apertando seus moradores, a arte requer aumento para ser observada. Nas revistas de arquitetura pode-se ver todo o entorno se acomodando a uma única pintura gigantesca na parede da sala minúscula!

E isto acontece exatamente nesta civilização que, da história da humanidade, é a que mais objetos têm para guardar! É só comparar o que hoje se possui nas casas com a disposição espartana de utensílios nos séculos anteriores até aos anos 1950.
Diferentemente dos Tizianos e Rembrandts conhecidos pelas generosas dimensões de suas telas, que realmente necessitam grandes paredes, a arte de hoje pode ser até sutil, com poucos elementos a ocupar uma sala. Porém, esta terá que satisfazer certas exigências espaciais como pé direito alto, distâncias mínimas entre cada obra, a cor das paredes, pontos de luz, entre tantos outros itens milimetricamente dispostos e configurados para a criação do ambiente. Então a sala, ao invés de ser um local para o lazer dos moradores, passa a ser uma instalação de arte!

* Era vitoriana (1838-1901) – o reinado da Rainha Vitória da Inglaterra que exerceu grande influência na arquitetura e artes decorativas.