Acho que há um claro equívoco no manual de autoajuda do século XXI. Depois da enxurrada de autoestima, autoconhecimento, autoavaliação, e tudo muito au, herança das décadas de 80 e 90 que entupiram o mercado editorial com livros de qualquer um sobre como ser uma pessoa melhor, feliz e de sucesso (até parece que a vida é esse mar de rosas); vários portais e perfis de redes sociais super produzem conteúdos na nossa linha do tempo e da vida, com regras que sempre nos colocam acima de tudo e de todos.

Não quero dissociar, desvalorizar a linha de pensamento ou de estilo de vida, em que temos que nos amar para amar alguém, ser feliz em primeiro lugar para poder fazer alguém feliz e não nos importarmos com a opinião alheia para ter nossa liberdade. Só percebo que está se fazendo uma nova distorção disso tudo. Se colocar na vitrine é diferente de se valorizar, de se reconhecer — acho que essa onda toda do eu em primeiro lugar, no topo da pirâmide, revela o quanto precisamos mostrar para o mundo nossa autossuficiência, mas, me desculpem novamente, não há tanta munição para dizermos eu me basto!

Concordo sim, que somos o ponto de partida, que o exercício do autoconhecimento se faz gradativamente e continuamente, mas descartar o outro em prol de autonomia? Hum, acho que é uma cilada para mostrarmos para não sei quem (já que se presume não precisar muito da terceira pessoa) que eu comigo mesmo já preenchemos o universo. Faço uma observação, não confunda esse raciocínio com saber viver sozinho, isso é outra conversa.

Realmente me assusta essa tese do só se importar com pessoas, coisas e situações que eu controlo, lamento informar, mas não se tem o controle o tempo todo, além de ser cansativo. A vida real tem tombos, sapos engolidos, olhar blasé e uma porção de situações adversas. O tempo, a experiência e o verdadeiro autoconhecimento, obviamente para aqueles que se propõem a abrir a cabeça e o coração, conseguem contornar, conviver com todas essas adversidades sem que isso os corrompa.

Essa Era do Eu acha que está blindada às intempéries, e todo mundo vira um super-herói com super poderes de viver a vida sem que o outro interfira. Creio que nossa formação tem muito mais do que ouvimos do que falamos, lógico, com sabedoria e filtro, mas sempre com intervenções. Mas se você ainda acha que o que você é te faz suficiente, dedico essa música do Ultraje a Rigor – Eu me amo. (http://www.vagalume.com.br/ultraje-a-rigor/eu-me-amo.html)

Ronise Vilela é jornalista e ativista de redes sociais.