Foi em um final de tarde do verão de 1981, que Marie Claude Dalahaye encontrou pela primeira vez, no mercado das pulgas de Saint-Ouen de Paris, uma pequena colher de metal, com estranhos e belos recortes. Curiosa, a professora de biologia celular em Jussieu, descobria a colher especial para viciados em absinto.

Foi o início de uma paixão, que acabou se transformando em museu. Marie Claude acabou comprando uma casa em Auvers-sur –Oise, lugar marcado pelo Impressionismo, época em que muito da inspiração de artistas como Van Gogh era proveniente do licor verde. O elixir originou uma coleção única de copos, garrafas, textos, gravuras, cartazes, reproduções de quadros, objetos publicitários, elogios e denúncias sobre as virtudes – e os vícios – da famosa fada verde.

Fotos: Divulgação

Fada verde, o absinto causou loucura e mortes, até ser proibido

Entre pequenas salas de exposição e bar restaurado, ao som de musiquinhas da época, de Pernod a Pernot, de Dupond a Dupont, de Sarah Bernhardt top model a pinturas de Picasso envoltas em vapores mortais, o visitante encontra o universo embriagador, tristemente popular no passado, ou abstratamente genial, do absinto. Que já foi proibido, depois guerra, em 1915,e hoje virou um vício menor, com tanta droga mais poderosa no comércio lícito ou ilícito.

No tempo do absinto, pobres e ricos bebiam até cair. Gente famosa também, como Alfred Jarry, Verlaine, Rimbaud, Toulouse-Lautrec, Van Gogh, todos procurando um pouco mais de gênio, de inspiração. Edouard Manet transformou seu quadro Buveur em patrimônio artístico da França. A partir de 1805, o absinto invadiu progressivamente os bistrôs e salões.


Era assim que o caixeiro viajante promovia os perfumes de Grasse no passado. Ganhou estátua em frente à Fragonard

Tudo começou,- como a cocaína, a internet e a televisão -, como um bem. O bem de uma planta medicinal que, na Antiguidade, Plinio e Gallien, imperador romano ( 260-268) letrado e filósofo, celebravam suas virtudes. Era a época em que a planta era utilizada para chás digestivos, com sabor amargo. Aos poucos, foi se transformando em droga. Voltaire, em Zadig, dizia que o primeiro mês de casamento era de lua-de-mel, o segundo já era lua de absinto.

Só no século XVIII o vegetal foi transformado em elixir. Na Suíça. Um médico, chamado Ordinaire, fez a transformação, melhorada por Henri-Louis Pernod, que comprou a fórmula e comercializou o novo produto em Pontarlier, berço da fada feiticeira.


Mais de trinta países – inclusive o Brasil – fornecem flores e plantas para os perfumes fabricados em Grasse, que utilizam também oito plantas regionais

Fruto da destilação de álcool com folhas de absinto misturadas com anis e erva doce, para mascarar o amargor, com 68 a 72 graus de força, o absinto foi logo elevado a bebida nacional francesa. Em 1900, cada francês bebia 162 litros de vinho por ano. Todas as ocasiões eram boas para beber: preguiça, tédio, miséria, fortuna. O absinto passou a ser conhecido como elixir dos poetas,- Fada Verde -, causador de loucura e de morte.

Proibido em 1915, foi preciso esperar 1922 para que os aperitivos com anis se transformassem em bebidas alcoolicamente corretas. Como o ouzo dos gregos, o raki dos turcos, o arak dos árabes, o pastis do francês. E é bom saber: na França as folhas do absinto são fervidas e pulverizadas nos roseirais, para acabar com os pulgões das plantas…

Para quem gosta de se inebriar de conhecimentos e descobertas, o endereço do museu bêbado: Musée de l’Absinthe – rue Callé, número 44 – Auvers-sur-Oise – França.


Pintores famosos perpetuaram o vício do absinto francês

GRASSE – TERRA DOS PERFUMES
Tudo o que você sonha sobre Provença está concentrado em Saint Paul de Vence e Grasse. Com seus extensos e floridos campos de lavanda, que se perdem no horizonte, Grasse é uma visão magnífica na primavera. Uma paisagem que vai se transformando, sempre guardando a essência de uma arte de viver que só existe no Sul da França: Côte d’Azur, Mônaco, Eze, Cap Ferrat. Tudo próximo, tudo lindo, tudo regado ao vinho da região, um dos pontos altos da economia local.

É a Rota da Lavanda, planta que originalmente existia na Pérsia (hoje Irã) e foi levada para Provença no tempos mais antigos. Os romanos usavam a lavanda para fragrâncias, como está nos escritos de Plinio, o Velho: A palavra lavanda vem do verbo lavare, porque é utilizada no preparo de banhos. Reconhecida e apreciada pelos óleos essenciais, é também procurada para produtos farmacêuticos , suas propriedades benéficas e para a indústria dos perfumes.


Quadros que retratam o vício, são disputados em leilões internacionais

Lavanda era colhida pelos pastores nas colinas e crescia naturalmente no lugares chamados de baïassières. Primeiro começou a ser cultivada junto de plantações regulares, até ter seu espaço especial, que substituiu as baïassières naturais. Os terrenos cultivados com a planta tiveram um crescimento exagerado entre 1920 e 1940. Hoje é plantada no Alpes, em Sault e nas áreas de Forcalquier e também em Drôme.

As primeiras flores aparecem em junho e são colhidas entre julho e agosto. A colheita, antes manual, agora é feita com máquinas, desde 1952. Depois de colher e secar a lavanda, há um longo processo de destilação. O chamado pescoço de cisne, antigo, é que faz a condensação para extrair o óleo. O processo do passado também foi modificado: chamas ao vivo e água foram substituídos por vapor.


Colher perfurada, açucar em tablete, fogo: elementos básicos no preparo da chamada “bebida da morte”

Desde meados do século dezenove os óleos essenciais para perfumes e cosméticos foram levado para Grasse, uma cidade que acabou recebendo o nome de capital do perfume. Os anos de ouro foram a década de 1950, em termos de crescimento e expansão da indústria. Depois do período áureo, plantações e utilização da lavanda natural caíram no mercado, por causa dos produtos sintéticos. Esforços têm sido feitos para manter o desenvolvimento da planta, apreciada no mundo inteiro, verdadeira herança da cultura provençal.

Grasse é uma cidade cheia de charme na Riviera Francesa que se dedicou durante muito tempo à tradição do perfume. Uma tradição que começou no século 16 com a família Medici e se desenvolveu até o século XVIII. Grasse teve vez no mundo no século XIX e seu apogeu fez internacionais as marcas Fragonard, Molinard e Gallimard. Hoje, por causa da crise, a maior parte da produção das perfumarias é dedicada à criação de aromas alimentares. Aquele que dá a impressão de que o pão acabou de sair do forno, mas está apenas na embalagem de um pão guardado durante dias no mercado. Ou o aroma de manteiga, no pacotinho de uma reles margarina feita com milho. Coisas do progresso e da vida moderna, feita de mentirinhas inocentes e grandes mentiras do dia a dia.


Van Gogh foi o artista que mais divulgou o absinto. O cartaz mostra o trocadilho: absente em francês, quer dizer ausente, fora do ar. Sensação procurada pelos experts em absinto

As perfumarias de Grasse organizam visitas especiais para os turistas, mostrando as várias etapas da transformação de pétalas de flores e plantas em perfumes famosos, ou vivenciando a criação de um perfume personalizado, com direito a mexer nos vidrinhos de essências para encontrar a melhor combinação de um perfume só seu. Há também roteiros de visitação aos campos de lavanda e oportunidade de conhecer os museus do perfume na região, como o International Museum of Perfume, instalado em uma perfumaria do Segundo Império, que pertenceu a Hugues Aïné . O acervo mostra a história da fabricação do perfume nos tempos antigos até os dias de hoje e os produtos finais: sabonetes, cosméticos e toda gama de loções, água de colônia, perfumes. Funciona de 1 de junho até 30 de setembro no número 8 da Place du Cours, Grasse.

O Harmas Museum em Sérignan-du-Comtat fica no prédio onde viveu Jean-Henri Fabre, em meio a um parque onde foi desenvolvida uma reserva botânica com mais de 8 espécies de plantas. O museu é base para pesquisas feitas por famosos entomologistas. Uma coleção de escritos, aquarelas, herbarium, coleção de minerais e de conchas prova a profundidade dos estudos e experimentos levados a cabo pelos apreciadores da botânica. Para contato e informações, procure a Prefeitura local.


Coleção das colheres especiais para o preparo da bebida proibida

O Aroma and Perfume Museum, em Graveson-en-Provence fica no meio do caminho entre Arles e Avignon. O museu está em uma antiga fazenda do século XIX e tem no acervo os instrumentos de cobre que serviam para retirar o óleo essencial, os garrafões do passado e acessórios que fizeram a história do perfume. Os visitantes recebem aulas de destilação e uso do instrumental antigo. Em La Chévêche, Petite Route de Grès – Graveson.

A Rota da Lavanda tem Associação, fundada pelos departamentos de Turismo de Vaucluse, Drôme, Hautes Alpes e Alpes de Haute Provence e por representantes dos cultivadores de lavanda. A associação coordena as principais áreas de cultivo e organiza para os turistas publicações com informações gerais, indicação de hospedagem e restaurantes, além de tours e locais de interesse mais destacados. Para correspondência use Avenue de Venterol, número 2 – 26111 Nyons Cédex – França.

Entre a embriaguez do perfume das flores e a embriaguez do absinto, toda uma história marcando os atrativos da Provence.