Todas as políticas públicas atuam em conjunto e seu funcionamento pleno depende de avanços contínuos em diferentes frentes para alcançarmos índices positivos que permitam a melhoria da qualidade de vida da população. Apesar disso, é comum que determinados setores (geralmente de maior visibilidade) recebam maior atenção enquanto outros são deixados de lado, mesmo que possuam importância fundamental para as comunidades. Um exemplo claro disso é o abandono do saneamento básico no país.

Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) indicam que o abastecimento de água no país, em 2015, era de 83,3%, enquanto o esgoto tratado alcançava apenas 42,7% e a coleta de esgoto é disponível apenas para 50,3% da população. A situação é tão alarmante que levou o Brasil a ficar na 112ª posição entre 200 países no ranking de saneamento básico realizado pelo Instituto Trata Brasil em 2014. Entre os países da América Latina, somos o 10º, atrás de Equador, Venezuela, Peru e Bolívia.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada R$ 1 investido em saneamento representa uma economia de R$ 4 em saúde. Não é difícil entender a lógica, uma vez que a falta de saneamento foi indicado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma das principais causadoras do surto do vírus Zica no país, enquanto o Ministério da Saúde registrou mais de 340 mil internações por infecções gastrintestinais no último Censo, com um gasto estimado de R$ 355,71 por pacientes para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Os dados pioram quando analisamos exclusivamente a cobertura da rede de esgoto do país, onde apenas quatro estados (São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro) e o Distrito Federal possuem índices acima de 60%, enquanto outros cinco estados não alcançam sequer 10% (Piauí, Amazonas, Pará, Roraima e Amapá).

De 2007 a 2015 o crescimento da cobertura da rede de esgoto foi de apenas 8,3%. Enquanto estados como São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Bahia realizaram os maiores investimentos em saneamento básico do país nos últimos três anos, com cerca de 63% do total, os que possuem a menor cobertura, e deveriam investir mais, representaram apenas 1,7% do investimento no setor.

Em 2011 o Paraná possuía uma cobertura de esgoto tratado de 58% e em 2017, de acordo com dados da Sanepar, o índice já está em 70%, um avanço muito superior a média nacional em quase metade do tempo. Obviamente ainda existe muito para aprimorar, mas demonstra uma preocupação com um setor que ao longo dos anos tem recebido apenas descaso do poder público.

Infelizmente muitos políticos se prendem a grandes obras ou aportes em pastas que ganham maior divulgação e ignoram ações de menor visibilidade que realmente trariam um impacto positivo para as comunidades e, consequentemente, melhorariam os índices em outros setores como turismo, educação, trabalho e meio ambiente. É inconcebível um país falar de avanços estruturais quando enfrentamos problemas primários de saneamento, dificuldades que deveriam ter sido solucionadas no século passado e ainda hoje não recebem a devida atenção e investimento.

 

Marcello Richa é presidente do Instituto Teotônio Vilela do Paraná (ITV-PR)