Um dos maiores problemas da política brasileira são os comportamentos incoerentes de nossos representantes e partidos, que constantemente deixam os interesses de seus projetos de poder sobrepujarem as melhorias que a população anseia. A reação de alguns representantes púbicos em relação ao projeto de lei aprovado pela Câmara sobre a regulamentação da terceirização é apenas mais entre muitos destes episódios.

Antes entrar nos méritos e problemas da regulamentação, é importante perceber que, teoricamente, ele deveria ser apartidário, como comprova sua história. Inicialmente concebido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o projeto teve continuidade na gestão Lula e também de Dilma, que o defendia entusiasticamente, como pode ser verificado facilmente em pesquisas nos principais jornais do país. Bastou o PT sair do poder e passaram a demonizar a regulamentação.

As leis trabalhistas brasileiras, em sua base, foram criadas em 1943. Desde então existiram avanços e, em alguns casos, como a terceirização, criação de relações jurídicas que são difíceis de analisar em qualquer modalidade de teoria do direito.

Medidas relacionadas à terceirização não são novidades. Em 1970 foi introduzida a regulamentação do contrato de trabalho temporário, com um absurdo entendimento de ilegalidade na contratação de trabalhador por empresa interposta (que prestam serviço para outra com o objetivo de viabilizar sua atividade econômica e produtiva). Obviamente isso gerou decisões jurídicas contraditórias e falhas para lidar com contratos de prestação de serviços.

Anos depois foi criada a distinção de atividade-meio e atividade-fim, que conflita com definições de administração e economia e não resolveram as condições jurídicas de empresário e trabalhadores. Em uma nova tentativa de melhorar este cenário, a Câmara de Deputados aprovou este ano o projeto de lei que busca regulamentar a questão da terceirização no Brasil.

Entre os aspectos positivos da regulamentação encontramos maiores garantias contra fraudes, com exigências econômicas das empresas, como capital compatível ao número de empregados, CNPJ e registro na Junta Comercial. Também prevê maior combate a desvio de funções, definição de valores no contrato firmado e fiscalização e aplicação de multa caso não ocorra o cumprimento de condições adequadas de trabalho.

Logicamente que alguns temas ainda podem receber aperfeiçoamentos, como a implantação da responsabilidade solidária do contratante, que iria estimular a fiscalização e cumprimento das obrigações trabalhistas, bem como a questão do enquadramento sindical, pouco abordado na regulamentação.

A regulamentação não é perfeita, mas representa um avanço ao cenário de limbo jurídico que empresários e empregados vivem neste segmento. A realidade é que já se passaram mais de 70 anos da sanção da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e ainda não temos uma resposta adequada à questão da terceirização, que só poderemos começar a vislumbrar quando a classe política começar a dialogar para a conjunção de interesses opostos, construindo com visões diferentes soluções consensuais que beneficiem nossa sociedade.

Marcello Richa é presidente do Instituto Teotônio Vilela do Paraná (ITV-PR)