Nas eleições gerais de 2014, o grupo JBS (Friboi) doou R$ 366,8 milhões para os candidatos de diferentes partidos. A informação consta de declaração ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Para efeito comparativo, os delatores da Odebrecht na Lava Jato afirmam que, em 2014, a doação política teria sido de R$ 300 milhões. No legislativo a chamada bancada do bife teria eleito 162 deputados federais. Candidatos aos governos estaduais, ao Senado e às presidenciais receberam milionários recursos para suas campanhas. Paralelamente a essa fartura de dinheiro para políticos, o JBS ocupa, entre as empresas ativa no mercado, o primeiro lugar como devedora da previdência social. A sua dívida junto ao INSS é de R$ 1,8 bilhão (a maior dívida histórica no sistema previdenciário é da Varig que deixou um passivo de R$ 3,7 bilhões, mas com a falência tornou-se impossível a cobrança do débito).
O grupo JBS, o maior devedor do sistema previdenciário, justifica que já propôs pagá-la com créditos que acumula junto à Receita Federal. Oficialmente disse: A JBS não pode ser penalizada pela demora da Receita Federal em ressarcir seus créditos. O Fisco não reconhece a correção dos créditos da companhia, de outro, tenta exigir os débitos tardiamente, corrigidos e com multa. O conflito envolvendo a empresa, a previdência e a receita federal chega a ser surrealista, pela objetiva razão do nível de relacionamento privilegiado que, a partir de 2007, aquele grupo empresarial vem tendo do governo brasileiro, particularmente junto ao BNDES que alavancou recursos na escala de bilhões de reais para transformá-la na maior empresa mundial de proteína animal.
Na sua composição acionária o BNDES, através a BNDESpar detém 20,4% das suas ações e a Caixa Econômica Federal de 6,9%. O restante da sua composição acionária é assim distribuído: 42,4% pertencem ao acionista controlador; 25,5% aos acionistas minoritários; e, 4,8% de ações na Tesouraria. A fonte é o próprio grupo empresarial. Não obstante os dois agentes públicos serem subscritores de 27,3% do seu capital, em 2016, o governo foi obrigado a impedir a transferência da sede da empresa para a Irlanda. A organização, através a subsidiária JBS Foods Internacional, pretendia fixar o seu domicílio fiscal no Reino Unido, ficando a parte que opera no Brasil como subsidiária.
O BNDES ao vetar a operação considerou que a proposta significaria desnacionalização da empresa ao transferir para o exterior ativos que representam 85% de sua geração de caixa operacional. A justificativa da transferência para o Reino Unido representaria cinicamente aumento do seu valor de mercado e acesso a empréstimos internacionais mais baratos. Alegavam que a empresa é tratada como integrante de mercado emergente por banqueiros e investidores internacionais. A operação foi desmontada e cancelada. Se concretizada, os seus acionistas brasileiros ficariam submetidos à legislação estrangeira.
Integrante da estratégia (governos Lula e Dilma) de estruturar campeãs nacionais do desenvolvimento, o JBS tem sua origem em pequeno frigorífico de Goiás, na década de 50. A partir de 2007, alavancado com recursos do BNDES, além de expandir-se no mercado interno, começou agressivo plano de inserir-se no mercado internacional. No mesmo ano, comprou Swift Foods e em 2009, a Pilgrim’s, as duas norte-americanas. No mesmo pacote foi comprada a Smithfield Beef, consolidando posição no mercado de carne bovina e de aves nos EUA. Detém liderança no setor, inclusive no mercado de carnes na Austrália e em outros países. Para esse gigantismo empresarial teve a âncora segura do BNDES, e do ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, na condição de consultor econômico.
Agora, dez anos depois, o TCU (Tribunal de Contas da União), em julgamento que teve unanimidade, constatou que na compra do grupo Swift Foods, o BNDES fez aporte de 750 milhões de dólares para viabilizar a compra. No seu relatório técnico atesta a existência de irregularidade na aprovação daqueles recursos públicos que representariam R$ 2,4 bilhões em valores atuais. Levando o Ministério Público e a Polícia Federal a deflagrar a Operação Bullish (valorização do mercado financeiro) envolvendo o banco de fomento e o grupo JBS que teria recebido R$ 8,1 bilhões para a sua expansão mundial, entre os anos de 2007 e 2011. É um retrato sem retoque do capitalismo estatal brasileiro, muito bem definido pelo economista Rogerio Werneck, professor da PUC/Rio: O segredo da prosperidade é estabelecer sólidas relações com o Estado, ser financiado pelo Estado, apropriar-se do patrimônio do Estado, receber doações do Estado, transferir passivos para o Estado, repassar riscos para o Estado e conseguir favores do Estado.

Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991)