No livro Como a Vida, a atriz e escritora Paula Giannini fez de receitas saborosas um livro de contos. Em cada história, batizada com nomes de pratos, o afeto pela comida despertava a imaginação para episódios tristes e felizes. Nesse mesmo caminho, ela estreia De Esperança, Suor e Farinha, uma peça que, ao contrário de Como a Vida, abre mão da barriga cheia para discutir uma realidade mais cruel no Brasil: a fome. “É difícil não pensar no tamanho do País como um lugar de fartura. Mas de um lado há o desperdício e de outro pessoas que se alimentam de farinha é água”, diz.

Em cartaz no Centro Cultural São Paulo, a montagem é integrante da Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos Cênicos, e propõe um olhar sobre o País em cinco monólogos que retratam pessoas das cinco regiões do Brasil em situação de marginalidade e na busca pela sobrevivência.

A autora de Casal TPM, espetáculo de comédia em cartaz desde 2006 e já visto por mais de 500 mil espectadores, abre o novo trabalho com o primeiro conto que escreveu. É em Santa Catarina que ela resgata a vida de Nona, uma parteira e benzedeira, conhecida por defender os mais necessitados. “Em certo momento, ela é colocada em uma situação vulnerável, pois carrega um segredo. E na comunidade em que vive, ela passaria a não ser tolerada.” Ainda sobre TPM, que contracena com Amauri Ernani, Paula conta que fará uma pausa com a comédia para não correr o risco de virar ‘Casal Menopausa’.

Em De Esperança, Suor e Farinha, algumas histórias são inspiradas em casos reais como a de um garimpeiro em Roraima – na peça é uma mulher. Diante do fechamento das minas, o trabalhador não encontrou alternativas para se manter.

Ele abriu uma buraco nos cômodos da casa para encontrar ouro e metais preciosos. Saindo do Norte, o monólogo que representa o Centro-Oeste conta uma história cheia de superstição, diz a autora que também atua ao lado de Ernani.

Nela, uma menina sofre preconceito por ser a sétima filha. Caso fosse um menino, ela iria herdar a maldição do lobisomem. Na versão feminina, a criatura chama-se Cumacanga, sua cabeça se solta do corpo e vaga sozinha. “Aqui, ela precisa enfrentar a discriminação que vem de um mito, mas também por ser filha de uma prostituta”, pontua a autora.

A trama viaja para o Rio de Janeiro para retratar o drama de um pai, que é ameaçado de perder a guarda dos filhos porque não os leva para a escola. “A família mora na região da Maré e todos temem que os conflitos com a polícia e a violência atinjam os moradores. Para proteger as crianças, ele toma a decisão de não deixá-las sair de casa. Apesar de não ser inspirada em um caso real, eu imagino que isso poderia acontecer”, diz Paula.

A cidade de São Paulo é cenário do monólogo centrado na vida de um ex-professor baiano e nesse texto o tema da alimentação surge com urgência. Na trama, o sujeito questionava os hábitos da escola sobre o consumo e descarte de alimentos. Ele é demitido e sem condições de se manter na capital, o profissional vai morar nas ruas. “Ele acreditava que uma boa alimentação também precisava considerar o quanto desperdiçamos de comida”, acrescenta a autora.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.