RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Após pressão interna de sindicatos e empregadas, a Petrobras revisou na semana passada sua política de remuneração variável, acusada de promover discriminação de gênero ao descontar tempo de licença maternidade ou período de amamentação dos bônus pagos aos trabalhadores.


O programa foi criado em 2017 e está sendo implementado pela primeira vez em 2019, para distribuição do lucro de 2018. As críticas sobre discriminação de gênero começaram a surgir depois que a Petrobras disponibilizou um simulador para que os empregados calculem quanto vão receber.


Empregados que passaram algum período fora em licença maternidade ou médica perceberam valores diferentes com relação a colegas, mesmo que a avaliação de desempenho seja semelhante. Mulheres que usufruíram do abono-amamentação, que garante duas horas por dia, também reclamam perdas.


Um grupo com mais de cem trabalhadoras se mobilizou no WhatsApp para discutir a questão. Além de acusar discriminação, elas se queixam que a regra foi estabelecida “no meio do jogo”, sem que as empregadas pudessem planejar suas licenças.


“Se bem que até parece que o intuito seja bem esse: forçar as mulheres a pensar duas vezes se querem ter filhos para não ficar de fora na carreira e na participação nos lucros”, diz um dos textos de protesto que circula no WhatsApp.


Os sindicatos foram acionados para questionar as regras. Em carta enviada à área de Recursos Humanos da empresa, à qual a Folha de S.Paulo teve acesso, o Sindicato dos Petroleiros do Rio (Sindipetro-RJ) diz que o modelo pune mulheres que se afastam por gravidez.


“As mulheres deveriam ser avaliadas pelo tempo que trabalharam”, diz o texto. “Caso se confirme todas essas discriminações, ressaltamos que há descumprimento do código de ética, além de ser incompatível com o selo de equidade de gênero da ONU [Organização das Nações Unidas].”


Na sexta (21), após confirmar à reportagem que o programa não considerava apenas o tempo trabalhado, a companhia divulgou nota interna revendo a questão. No texto, diz que “entendeu os questionamentos sobre a não inclusão dos dias relativos à licença paternidade ou maternidade”.


“A Petrobras apoia a participação dos seus empregados nos cuidados com a família e entende que os dias de licença maternidade e paternidade são fundamentais para estabelecer os vínculos com seus filhos”, diz o comunicado. A empresa adota licença maternidade de 180 dias e paternidade de 20 dias.


Os sindicatos reclamam, porém, ainda há dúvidas com relação ao período de amamentação, que garante duas horas por dia às empregadas lactantes. O programa está sendo implantado pela primeira vez este ano porque a estatal não teve lucro em 2017. Em 2018, a estatal fechou o ano com lucro de R$ 25,8 bilhões.


Os bônus são pagos sobre a PLR (Participação nos Lucros e Resultados): o empregado beneficiado com remuneração variável só recebe efetivamente o valor adicional ao que já é distribuído normalmente —na PLR, a Petrobras distribui entre 4,25% e 7,25% do lucro líquido a seus empregados.


A criação do novo programa recebeu críticas dos sindicatos na ocasião – em texto de fevereiro de 2018, o Sindipetro-RJ chama a proposta de “insulto” e diz que gera riscos de ampliação de acidentes. As divergências se ampliaram em abril, quando a Petrobras propôs um novo programa de bonificação.


Batizado de Programa de Prêmio por Desempenho (PPP), o novo modelo foi proposta para substituir a PLR,com o argumento de premiar os empregados de melhor desempenho. “É o reconhecimento do valor individual de todos os empregados”, disse à Folha de S.Paulo em abril o gerente-executivo de Gestão de Pessoas da empresa, Cláudio da Costa.


O programa estabelece oito diferentes níveis de remuneração variável, de acordo com os níveis hierárquicos da companhia. Em caso de atingimento das metas, o presidente receberá dez salários, enquanto os empregados sem função gratificada terão dois.


Se as metas forem ultrapassadas, o bônus do presidente pode chegar a 13 salários e o dos empregados sem função gratificada, a 2,6 salários. A empresa defende que o modelo atual é mais alinhado a práticas de mercado do que o anterior, que tinha um piso de R$ 21,9 mil e teto de quatro salários por empregado.


A ideia é que o modelo novo substitua o antigo já a partir de 2020. Este ano, os dois convivem. Os sindicatos ligados à empresa são contra o modelo novo e tentam reverter a decisão em negociações do novo Acordo Coletivo de Trabalho —o atual vence no fim do ano.