Eder Jofre, que está internado há três meses em uma clínica em São Paulo recuperando-se de complicações por causa de uma pneumonia adquirida em março, jamais perdeu a aura de maior boxeador peso-galo de todos os tempos, apesar de ter pendurado as luvas há mais de quatro décadas. O ‘Galo de Ouro’ lutou de 1960 a 1976, uma época em que o maior meio de comunicação era o jornal, pois a TV ainda engatinhava, enquanto a internet e as redes sociais nem eram cogitadas. Isso só mostra o imenso legado deixado pelo filho do senhor Aristides Kid Jofre, que cuidou pessoalmente de sua carreira.

Eder não gozou de privilégios ou de apoio de entidades ligadas ao boxe ou ainda de patrocinadores pessoais para construir uma história vencedora no boxe, ao contrário de mexicanos, americanos, japoneses e ingleses. Personalidades contam o que o garoto, que nasceu em São Paulo, na Rua do Seminário e passou a infância no Parque Peruche, fez em cima do ringue, como ficou eterno na memória daqueles que tiveram a possibilidade de vê-lo em ação e por que seus feitos são contados de geração em geração, tornando-o uma lenda da nobre arte em todo o mundo.

“Eder tinha tudo que um grande lutador deve possuir. Para coroar o pacote, ele também tinha um queixo de ferro e de resistência, a exemplo de Jake LaMotta e Carmen Basilio”, escreve o Cyber Boxing Zone, site especializado. “Talvez a qualidade mais impressionante tenha sido a capacidade de adaptação. Jofre era um lutador muito inteligente, que poderia mudar seu estilo para se ajustar a qualquer tipo de adversário. Ele poderia ser brigador, clássico… O cara era uma obra de arte.”

Para mostrar que o comentário do site sobre o pugilista brasileiro não é exagerado, pode-se lembrar que Sugar Ray Robinson, apontado em quase todas as listas como o maior boxeador de todos os tempos, fez questão de posar ao lado de Eder, em 1960, antes de o lutador nacional enfrentar o mexicano Eloy Sanchez, quando ganhou o primeiro título mundial, em Los Angeles.

O jornalista americano Ted Sares tem outra definição para o pugilista brasileiro. “Com um poder de soco em ambas as mãos, Jofre também tinha grandes habilidades técnicas e reflexos, ao melhor estilo Sugar Ray Robinson”, analisa. “Ele tinha o gancho e o direito em linha reta, um inferno. Ele tinha tudo. Um perfurador de corpos.”

Com tanto reconhecimento nos Estados Unidos, Eder entrou para o Hall da Fama do boxe em 1992. “A maioria dos fãs americanos não teve a oportunidade de vê-lo em ação, mas nos anos 60, Eder Jofre foi considerado o melhor lutador libra por libra em todo o mundo”, afirma Ed Brophy, diretor executivo do Hall da Fama.

Em livrarias de Nova York sempre foi possível comprar pôsteres do ex-pugilista brasileiro por US$ 30 (R$ 143) ou camisetas com o rosto do campeão por US$ 40 (R$ 68) desde o tempo em que seus nocautes eram manchetes nos jornais. Algo que só se tornou possível no ano passado, após seu nome ter sido colocado também no Hall da Fama do Boxe da Costa Oeste. “Eder Jofre só não é maior por causa da falta de imagens de seus combates”, diz o escritor Thomas Hauser, que escreveu, entre muitas outras obras, biografias de Muhammad Ali. “Jofre foi um dos maiores de todos os tempos.”

A lendária revista The Ring classificou Eder como o 9º melhor de todos os tempos. Dan Cuoco, diretor da International Boxing Research Organization (Organização Internacional de Pesquisa de Boxe), foi além. “Vi muitas lutas dele e posso dizer, sem medo de errar, que Eder Jofre foi o boxeador mais subestimado de todos os tempos.”

O respeito por Eder vem também até do único adversário a vencê-lo em 20 anos de carreira. “Foi o maior adversário da minha carreira. Fiquei em pânico quando descobri que iria lutar com ele. Era muito resistente e um grande pegador”, afirma o japonês Masahiko Fighing Harada, que bateu o brasileiro duas vezes. Em 1965 e 1966, ambas no Japão. No total, Eder lutou 81 vezes, com 75 vitórias (53 nocautes) e 4 empates.

Eder também se transformou em ídolo de lendas do boxe de outras categorias. “Quando penso em Brasil, penso em Eder Jofre. Assisti a muitos teipes de suas lutas e gostava do seu estilo agressivo. Foi um grande campeão”, diz Mike Tyson, ex-campeão mundial dos pesados.

O mexicano Carlos Zarate, outro grande campeão dos galos, mas nos anos 70, também enumera elogios ao brasileiro. “Gostaria muito de ter lutado contra Eder. Fomos grandes lutadores, mas melhor assim. Um poderia perder e poderia ter sido eu”, disse o pugilista, que ganhou 63 vezes por nocaute em 66 vitórias.

O também mexicano José Sulaymán, presidente do Conselho Mundial de Boxe por 40 anos, fez uma previsão antes de morrer em 2014. “Não acredito que o Brasil tenha outro Eder Jofre. Ele parou de lutar há mais de três décadas e quem gosta de boxe sabe quem é Eder Jofre. Ainda se fala muito dele. Vocês (brasileiros) devem se orgulhar dele tanto quanto nós nos orgulhamos.” Depois de Eder, nenhum outro boxeador em sua categoria reuniu todas essas qualidades em cima do ringue. Outros bons boxeadores surgiram depois de Eder, mas nenhum com sua pegada, graça e punhos.

Newton Campos, que dirigiu a Federação Paulista de Boxe por mais de 50 anos, definiu bem as características de Eder Jofre. “Geralmente um boxeador possui um golpe preferido, aquele que ele aplica com mais precisão, força ou perfeição. Ele era diferente, pois seu direto, de direita, jab de esquerda, gancho no fígado ou no baço, Upper no queixo, cruzados de direita e de esquerda…eram todos iguais: perfeitos”, disse o dirigente, morto em fevereiro.

NO HOSPITAL

Eder Jofre está internado em uma clínica em São Paulo desde 4 de março. O Galo de Ouro teve uma pnemonia e perdeu cerca de cinco quilos. Segundo a filha Andrea informou nas redes sociais, o ex-boxeador, de 85 anos, faz tratamento de fisioterapia acompanhado de fonoaudiólogo e nutricionista apenas para reposição de peso. Eder é integrante do Hall da Fama de Canastota desde 1992. No ano passado, se juntou a lendas como Muhammad Ali, Joe Louis, Rocky Marciano, George Foreman, Sugar Ray Leonard e muitos outros, ao ter seu nome incluído também no Hall da Fama do Boxe da Costa Oeste dos Estados Unidos.

Eder foi campeão dos galos de 1960 a 1965, além de ostentar o cinturão dos pesos penas de 1973 a 1974. Parou de lutar em 1976, aos 40 anos. “Venho informar que meu pai se encontra internado. Tratou primeiro de uma pneumonia que está 100% curado e hoje encontra-se na clínica do mesmo hospital fazendo tratamento de fisioterapia acompanhado de fonoaudiólogo e nutricionista apenas para reposição de peso porque durante esse período de pneumonia, ele perdeu peso. Eu (Andrea), meu marido Oliveira e meu irmão, Marcel, estamos acompanhando de perto o tratamento. Eu fico de segunda à quarta-feira, 24 horas, e meu marido Oliveira comparece todos os dias em horários alternados. O meu irmão Marcel comparece aos finais de semana. Com muita tristeza, recebemos a notícia de que tem algum irresponsável e inconsequente passando informações falsas de que meu pai estaria abandonado. Por conta disso estamos abertos a esclarecer qualquer dúvida de quem quer que seja”, publicou sua filha.