Há um mito acerca das avestruzes: estas gigantescas aves quando em situação de perigo esconderiam a cabeça em algum buraco, ficando supostamente a salvo por não enxergarem o que as ameaça. Claro que não funcionaria, pois o restante do corpo ficaria exposto, e as avestruzes estariam extintas. Nem suas primas emas, a quem a Nação tanto deve, fariam algo tão estúpido.

No entanto, a síndrome de avestruz parece ser uma constante em nosso país, em todos os níveis de governo, começando pelo federal: realidades desagradáveis não são olhadas, e muito menos enfrentadas.

Um bom exemplo vem do desrespeito ao bioma, em muitos casos “mata-se o mensageiro” como ocorreu na demissão de Ricardo Galvão da direção do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais; o motivo foi a divulgação de dados de desmatamento na Amazônia diversos da fantasia oficial.   

Segundo Aristóteles, o homem é um animal político, feito para viver em comunidade. Essa concepção do ser humano implica conceitos como solidariedade, pertencimento e responsabilidade comunitária, além da necessidade de buscar qualidade de vida para todos. A geração de riqueza pelo trabalho tem o limite do próprio planeta, no qual podemos apenas transformar o já existente, sem criar ou destruir matéria, apenas transformando-a em algo benéfico ou maléfico ao ser humano ou outros animais.

Por isso, acelerar os processos econômicos de geração de riqueza normalmente significa privar as gerações futuras da qualidade de vida. Se extrairmos do meio mais do que o razoável, a extração crescente implicará na perda de condições dignas de sobrevivência para nossos filhos e netos, ou a morte do próprio planeta.

Essa prática se repete, mais como tragédia do que farsa, se o ministro da Saúde cumpre seu dever, e em virtude da Covid-19 ser objeto da atenção geral, parecer ter protagonismo midiático que ameaça a vaidade da família real, é levado a pedir demissão e substituído por outro que tem a dignidade de não permanecer no cargo mais do que um mês quando percebe que só o que se espera dele é submissão. Atualmente temos um interino aparentemente especialista em logística e não em saúde pública, e que não se manifesta contra as milagrosas panaceias oficiosas, que deveriam ter consequências sérias, já que exercício ilegal da medicina é crime tipificado em lei.

O Brasil está em processo acelerado de dissolução, o enfrentamento da imensa crise econômica que atravessamos é feito por voluntarismo pseudo liberal, propostas meramente eleitoreiras e  tentativas de aumentar ainda mais a carga tributária; a desmoralização de nossa política externa parece ser objetivo do outrora eficaz e orgulhoso Itamaraty; nosso governo se alinha automaticamente à política do presidente norte americano, envergonhando-nos pela subserviência, mesmo os piores “entreguistas” de outros tempos associavam-se a políticas de Estado e não de pessoas. 

Relembra, infelizmente, a triste época da ditadura, em que, preocupado com a imagem do Brasil no exterior pelas notícias de mortes de civis, tortura, repressão e sequestros, o governo brasileiro agia como avestruz, impondo ao mundo uma outra imagem, mostrando em cartazes e filmes uma idealizada mulher brasileira, com destaque na exuberante natureza, no sol, no mar e nas grandes festas como o carnaval. A tentativa era alterar o imaginário brasileiro, com um discurso ufanista que naturalizava o simples absurdo, buscando neutralizar a imprensa, que tentava denunciar as prisões e desmandos.

Propagandas da Embratur à época mostravam mulheres exibindo belos corpos, e nelas as fotos ou filmagens mostravam claramente as jovens brasileiras como “sem pé nem cabeça”.

É isso que voltamos a desejar para nossa juventude?

  

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.