PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – “Estou me sentindo maravilhosa”, diz Kattlyn Silveira, 15, após uma sessão de maquiagem. Ao redor, outras estudantes, a maioria de negras, seguem sendo embelezadas pelas meninas do projeto Empoderadas IG, que transformaram a biblioteca da escola estadual Otávio Rocha em um salão de beleza improvisado.

Além da maquiagem, que abusa dos brilhos e das cores, elas capricham no cuidado com os cabelos, com penteados que valorizam os cachos e produtos específicos para cabelos crespos. 

“Eu achava meio feio, eu não andava de cabelo solto, só de cabelo preso”, lembra Valesca Suzana Trindade Broquá. A jovem de 15 anos arruma o coque recém-instalado no alto da cabeça, de onde pendem livres os cachos negros. 

A Escola Estadual Otávio Rocha, na zona leste de Porto Alegre, é a quinta a receber a visita das Empoderadas IG, grupo formado por 22 alunos de outro colégio da capital, a Escola Estadual Ildefonso Gomes –cujas iniciais ajudam a dar nome à ideia. 

O sucesso do projeto, criado para aumentar a autoestima das estudantes, incentivou alunos e professores a levarem as atividades para outras escolas.

“Chega a dar um friozinho na barriga cada vez que a gente vai fazer uma visita”, diz Nickoly da Silva Aguiar, 17 anos, a mais antiga integrante do projeto criado em 2016 pela professora de educação física Luciana Dornelles Ramos. 

Nickoly lembra o quanto a professora insistiu para que deixasse o cabelo solto, até que houve o convite para participar das reuniões do grupo.

Os encontros eram uma vez por semana, no contraturno das aulas. “Só que a gente não falava só de cabelo. A gente abordava muitos assuntos como feminismo, como a mulher deve se impor, falava sobre política”, diz Nickoly.

Luciana conta que o cabelo não passou de uma isca, já que a proposta de criar um grupo de estudos assustava os alunos. “Então eu usei o cabelo como uma maneira de me aproximar delas para tratar essas outras questões também”. 

Neemias Ismael Domingues Pena foi um dos primeiros meninos a entrar no projeto. Parou de usar o boné e deixou o cabelo ao estilo black power crescer. “Quando tu tem vergonha, parece que isso te deixa menor. Quando tu te autorreconhece, tu se impõe, fica mais bonito”, explica o estudante de 16 anos.

As visitas às outras escolas seguem um ritual. Primeiro, o grupo vai até as salas buscar as alunas escolhidas para participar da atividade. 

Depois da “sessão de beleza”, as professoras Luciana, Thaynah Mena Barreto e Tainá Albuquerque fazem uma palestra sobre temas como racismo, privilégios e bullying. A atividade é encerrada com um desfile do qual participam as adolescentes das duas escolas. Todos são aplaudidos.

O professor de geografia da Otávio Rocha, Vagner Garcez Soares, diz como foi o processo de escolha das meninas que iriam participar da atividade. Algumas se candidataram. Outras, mais tímidas, ele teve que puxar pela mão.

Foi o caso de Queisy Fonseca, 13, que não se sente muito à vontade com o cabelo crespo. “Eu e meu cabelo não somos muito amigos”, brinca a menina.

Outros temas são abordados, como a gravidez na adolescência, comum quando Luciana chegou à escola. “Eu quero terminar de estudar, engatar a faculdade, viajar pelo mundo. E se der tempo, ter filhos”, diz Thaisiane Farias Dutra, 15.

A iniciativa se estende para a internet. Com ajuda de parceiros como o videomaker Kadu Casales, que registra as atividades forma voluntária, os vídeos são publicados na página do projeto no Facebook, que já conta com mais de 2.000 seguidores.