BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Em menos de 10 minutos depois do fim do jogo, já estava sozinha neste bar da Recoleta, com meu computador, ainda olhando para os telões que repetiam os três gols da Croácia, a falha do goleiro Willy Caballero, a cara de depressão de Messi durante o hino nacional, a torcida croata em festa, Sampaoli e seus gestos exagerados expondo suas tatuagens e seu desespero.

Quando o juiz apitou o fim de Croacia 3 a 0 Argentina, quase todo mundo já estava pagando a conta e indo embora, inclusive minha amiga, que de repente se lembrou de que tinha que ir buscar o filho na escola. Largou umas notas sobre a mesa, pediu desculpas e saiu correndo.

O clima era exatamente o oposto de antes de o jogo começar. Primeiro, porque demorei um tempão para chegar, entre 14h e 15h, o trânsito em Buenos Aires estava todo engarrafado.

Os carros, com bandeirinhas argentinas nas janelas, buzinavam de modo ensandecido, gente apressada em voltar do trabalho para casa ou para um bar (na Argentina, como na Inglaterra, é muito comum assistir a jogos em bares), os táxis desistiram de pegar passageiros, apagaram as luzes vermelhas de “livre” e voavam vazios para suas casas. Os ônibus também, pareciam trens fantasmas com poucas pessoas alheias ao futebol que tentavam chegar a algum lugar. Quando finalmente alcancei o lugar onde tínhamos combinado ver a partida, o lugar estava apinhado de gente e era pura alegria.

“Vamos, Argentina!”, gritavam as crianças. “Quero que o Dybala jogue”, riam e se cutucavam as adolescentes. “Que pongan huevos” (que tenham coragem, em tradução livre), diziam os homens, sentados em grupos.

O restaurante estava enfeitado como muitos na cidade, com bandeirinhas brancas e celestes, fotos de Messi, “Pipita” Higuain e Aguero. Com dificuldade, eu e minha amiga encontramos a última mesa que tinha uma visão boa de um dos telões. Todos cantaram o hino nacional, alguns aos brados, mas ninguém ouviu o hino da Croácia, pois era a hora de pedir as bebidas e petiscos.

Logo que o juiz apitou, já começaram as reclamações. “Isso está lento, não sai do meio de campo”, dizia um dos cidadãos presentes, com um grupo de amigos. Nervoso, ele subia e baixava e zíper do moletom azul.

“O Messi está jogando?”, perguntava uma senhora. Não por seu desconhecimento de futebol “por ser mulher”, mas porque de fato ninguém tinha visto nenhuma jogada incrível do camisa 10. Um coro respondeu: “Parece que não, está deprimido”. “Põe o Dybala”, dizia um grupo de adolescentes que tinham sido liberadas da aula para ver o jogo.

Quando Luka Modric marcou, os torcedores já mostravam que estavam desistindo de seu time. “Que golaço!”, e levantaram para ver mais de perto o replay do impressionante chute do jogador do Real Madrid.

O fim do jogo dividiu os presentes. Enquanto uns, quietos, pagavam a conta e saíam, outros faziam contas. “Não, mas se a Islândia ganhar da Croácia e nós da Nigéria, talvez.” Um dos que haviam tomado umas a mais, encerrou a discussão: “E vocês querem que esse time seja campeão jogando assim?”, e se foi, com uma batida da porta de saída que quase trincou a porta de vidro do bar.

O caminho para casa foi como sair de um plantão num feriado. Ruas vazias, papel picado no chão, bandeiras abandonadas. Até pode ser que a Argentina se classifique, mas o que ocorreu nesta quinta (21) parece ter selado o destino dessa geração até pouco tempo celebrada pelos argentinos.

Enquanto esperava o metrô, ouvi de um sujeito dizendo a outro. “Messi não é Maradona, esse teria colocado ´huevos´ (ovos, ou coragem, em tradução livre), feito gol de mão, qualquer coisa para evitar essa vergonha.”