O Canadá anunciou que está autorizando os bancos a congelar as contas de pessoas suspeitas de estarem envolvidas nas manifestações contra vacina e outras medidas anticovid do “comboio da liberdade”. Além disso, as plataformas de financiamento coletivo, utilizadas pelos manifestantes para receber doações, terão de reportar atividades suspeitas.

O anúncio foi feito na última segunda-feira, 14, pela vice-primeira-ministra e ministra das Finanças, Chrystia Freeland, durante coletiva de imprensa na qual o primeiro-ministro, Justin Trudeau, invocou poderes de emergência.

“A partir de hoje, um banco ou outro provedor de serviços financeiros poderá congelar ou suspender imediatamente uma conta sem a necessidade de ordem judicial. Ao fazê-lo, eles estarão protegidos contra responsabilidade civil por ações tomadas de boa fé”, disse a ministra.

“Trata-se de seguir o dinheiro. Trata-se de parar o financiamento desses bloqueios ilegais. Estamos hoje notificando: se seu caminhão estiver sendo usado nesses bloqueios ilegais, suas contas corporativas serão congeladas. O seguro de seu veículo será suspenso”, continuou ela.

“Mande seus semirreboques para casa. A economia canadense precisa que eles façam um trabalho legítimo, não que nos tornem mais pobres”, finalizou.

Além disso, os sites de financiamento coletivo que desejarem operar no Canadá devem se registrar no Centro de Análise de Transações e Relatórios Financeiros do Canadá (Fintrac), o que na prática obriga as plataformas a notificar ao governo sobre transições consideradas suspeitas e grandes movimentações com moedas virtuais.

“Isso ajudará a mitigar o risco de que essas plataformas recebam fundos ilícitos, aumentará a qualidade e a quantidade de inteligência recebida pelo Fintrac e disponibilizará mais informações para apoiar as investigações das autoridades policiais sobre esses bloqueios ilegais”, disse Freeland.

Segundo a imprensa canadense, os organizadores do comboio conseguiram arrecadar mais de US$ 10 milhões (R$ 51 milhões) pelo site GoFundMe. Mas a plataforma bloqueou que os manifestantes acessassem o fundo e decidiram, inicialmente, enviar o dinheiro para a caridade. Mais tarde, o site informou que faria o reembolso dos valores.

Desde então, os apoiadores do comboio se voltaram para o site cristão GiveSendGo, onde arrecadaram mais de US$ 8,4 milhões (R$ 43 milhões). Porém, o site está offline para manutenção e atualizações do servidor após o relato de ataques hackers.

“Suspeito que seguir o dinheiro e depois bloquear o dinheiro é provavelmente uma boa estratégia e não uma que é fácil de fazer. Medidas temporárias de curto prazo que normalmente não seriam aceitáveis ??podem ser implementadas”, Jack Lindsay, presidente do departamento para estudos aplicados de desastres e emergências na Brandon University em Manitoba.

Lei de Emergência

Na segunda-feira, Trudeau invocou poderes de emergência, raramente usados, para enfrentar os protestos. A Lei de Emergências de 1988 permite que o governo federal suspenda o poder das províncias e autorize medidas temporárias especiais para garantir a segurança durante emergências nacionais.

A lei foi usada apenas uma vez em tempos de paz – pelo pai de Trudeau, o ex-primeiro-ministro Pierre Trudeau – que invocou uma versão anterior da lei — Medidas de Guerra — em 1970, depois que um pequeno grupo militante de separatistas de Quebec sequestrou um ministro de província e um diplomata britânico.

“Com essa lei, o governo pode requisitar bens, serviços e pessoas, dizer às pessoas aonde ir, aonde não ir. Há poucos limites para o que o governo pode fazer”, explicou Geneviève Tellier, professora de estudos políticos na Universidade de Ottawa.

Os protestos do ‘comboio da liberdade’, iniciados por caminhoneiros canadenses que se opõem a um mandato de vacinação ou quarentena para motoristas transfronteiriços, se tornaram um ponto de encontro para pessoas que se opõem às políticas do governo de Trudeau, cobrindo tudo, desde restrições pandêmicas a um imposto de carbono.

Nas últimas duas semanas, centenas e às vezes milhares de manifestantes em caminhões e outros veículos lotaram as ruas de Ottawa, a capital. Eles também bloquearam várias passagens de fronteira EUA-Canadá. A mais movimentada e importante delas — a Ponte Ambassador que liga Windsor, Ontário, a Detroit, Michigan — foi reaberta no domingo depois que a polícia prendeu o último dos manifestantes e quebrou o cerco de uma semana que interrompeu a produção de automóveis nos dois países.

Desafiando a ordem de emergência, manifestantes em caminhões e outros veículos prometeram nesta terça-feira, 15, permanecer do lado de fora do parlamento canadense até que o governo suspenda os mandatos de vacinas e outras restrições.

“Nós não vamos embora. Nós lutamos tanto tempo”, disse Gord, um motorista de caminhão de Manitoba que se recusou a dar seu sobrenome. O uso de poderes de emergência “é apenas mais uma tática de medo”, disse ele enquanto estacionava em frente ao parlamento em Ottawa.

Enquanto ele falava, outro manifestante apareceu para lhe oferecer café da manhã e uma rosa vermelha. Ele diz que quer que os mandatos de vacinas e as restrições contra a covid-19 sejam retirados, e que ele e os outros manifestantes estão dispostos a permanecer firmes, não importa o que aconteça.

Na manhã de terça-feira, manifestantes em Coutts, Alberta, planejavam encerrar seu protesto, informou a Canadian Broadcasting Corp, depois que 13 pessoas foram presas na segunda-feira com um esconderijo de armas, munições e coletes à prova de balas.

Os caminhoneiros encontraram apoio entre conservadores e aqueles que se opõem às ordens de vacinação contra a covid em todo o mundo, mesmo quando as medidas anticovid estão sendo suspensas em muitos lugares.

As manifestações inspiraram movimentos semelhantes em países europeus, na Austrália e na Nova Zelândia. Alguns caminhoneiros dos EUA estão considerando realizar um protesto em março. Republicanos dos Estados Unidos expressaram apoio ao comboio, incluindo o ex-presidente Donald Trump.

A Bélgica anunciou nesta segunda-feira que a polícia interceptou 30 veículos como parte de uma operação para conter uma caravana semelhante. (Com agências internacionais)