O técnico Jorge Jesus, em pouco mais de dois meses de trabalho no Flamengo, conseguiu transformar dinheiro em liderança do Campeonato Brasileiro. Na Copa Libertadores, o elenco milionário do time rubro-negro está muito perto de uma vaga na semifinal, algo que não alcança há mais de 30 anos – nesta quarta-feira, a equipe enfrenta o Internacional, no estádio Beira-Rio, em Porto Alegre, com a vantagem de ter vencido a partida de ida por 2 a 0.

O português tem mudado alguns paradigmas no futebol brasileiro. Ele disse, por exemplo, não entender por qual razão valorizamos mais a Copa do Brasil do que o Campeonato Brasileiro. Quando ele assumiu o time da Gávea, a distância para o então líder Palmeiras era de oito pontos. Agora, é a equipe de Felipão que olha o Flamengo no topo da tabela de classificação, com três pontos a menos (33 a 30).

Não é exagero afirmar que a força do Flamengo está no seu elenco. Em 12 jogos no comando do clube rubro-negro, o treinador mandou a campo 12 formações diferentes e, mesmo assim, o time manteve o fôlego para lutar pelos títulos do Brasileirão e da Libertadores. Com o português, o time já não depende mais tanto do talento individual dos seus grandes jogadores e confia no jogo coletivo.

O melhor exemplo desse “novo Flamengo”, foi o segundo da vitória por 3 a 0 sobre o Ceará, no último domingo, em Fortaleza. Em 1 minutos e 15 segundos de posse de bola, foram 20 passes até Gabriel estufar a rede adversário com uma “bomba” de dentro da área.

É preciso destacar também a grande fase de Gabriel. No domingo, ele marcou o seu 12.º gol no Brasileirão, o 25.º no ano. Emprestado pela Inter de Milão, o atacante recebe R$ 1,25 milhão por mês de salário e tem correspondido ao alto investimento feito pela diretoria.

Não por acaso, os jogadores mais caros do elenco do Flamengo são aqueles que têm liderado o time na temporada. No início do ano, a diretoria desembolsou 15 milhões de euros (R$ 63,7 milhões) para comprar o uruguaio Arrascaeta do Cruzeiro. Antes, o Flamengo havia contratado o zagueiro Rodrigo Caio, do São Paulo, por 5 milhões de euros (cerca de R$ 22 milhões) por 45% dos direitos econômicos. No meio do ano, o clube reforçou as duas laterais com as repatriações de Rafinha (ex-Bayern de Munique) e Filipe Luís (ex-Atlético de Madrid). Também comprou o meia Gerson por quase R$ 50 milhões da Roma.

REESTRUTURAÇÃO – Todas essas contratações só puderam ser feitas depois de o clube passar por uma reorganização financeira. A Análise Econômico-Financeira dos Clubes Brasileiros de Futebol de 2018 promovida pelo Itaú BBA mostra que o Flamengo arrecadou R$ 536 milhões em 2018. O clube só ficou atrás do Palmeiras, que teve uma receita total de R$ 654 milhões. Alviverdes e rubro-negros concentram 24% das receitas do clubes brasileiros.

Em entrevista ao Estado no mês passado, o consultor do Itaú BBA, César Grafietti, ressaltou que tendência é a diferença aumentar. “Há um descolamento de Palmeiras e Flamengo, eles jogam uma liga diferente do ponto de vista financeiro. Há uma boa distância que deve aumentar nos próximos anos, porque o contrato da TV, por exemplo, fica maior por desempenho e número de jogos na TV aberta. Com o clube bem financeiramente, tende aumentar o desempenho e consequentemente a quantidade de jogos transmitidos”, afirmou.

A dívida do Flamengo vem caindo ano após ano. Em 2013 era de R$ 750 milhões e fechou em R$ 418 milhões no final de 2018. “O Flamengo entendeu lá atrás que era fundamental reorganizar a gestão para não quebrar, e os outros continuaram com suas gestões amadoras e não levaram a sério que o futebol precisa se profissionalizar. O Flamengo se apropriava menos do que poderia antigamente. Hoje é uma potência econômico-financeira”, disse César Grafietti.

O Flamengo aderiu ao Profut, programa de refinanciamento das dívidas criado em 2015, e destinou 15% do faturamento para abater dívidas. Assim, mesmo com contratações ousadas, a diretoria tem conseguido pagar em dia os seus compromissos.