Minha irmã se chama Polyana. Com a nomiação, a bichinha sofreu um tanto no quesito presentes. Ganhou inúmeras vezes de tios e amigos exemplares de Pollyanna e Pollyanna Moça. Assim mesmo com dois Ls e dois Ns. Em casa, nutríamos alguma antipatia pelo romance de Eleanor H. Porter. Primeiro porque ao ganhar mais um livro igual, ela deixava de ganhar outras coisas. Embora, eu também tenha vivido o drama do presente duplicado. Minha avó paterna passou anos me dando pega-varetas de natal e de aniversário. Vou te falar que fiquei bem boa nesse jogo, até hoje, na força do ódio. Depois porque Pollyanna (a de Porter) brincava do jogo do contente.

O jogo do contente é assim, não importa o que estiver acontecendo de péssimo – e olha que a história da personagem é um desfile de desgraças -, você sempre procura ver o lado bom. Foi o pai de Pollyana, que (vai vendo) morreu quando ela tinha 11 e a deixou órfã, quem apresentou o método à  menina.

O meu pai inventou outro jogo, sem querer bem parecido com o primeiro; o jogo do lascado (que tem outro nome que começa com F, mas vou poupar vocês do palavreado). Seguem as regras: quando alguém começa a reclamar, o outro reclama por cima e fica aquela competição pra ver quem tá sofrendo mais, ele entra e pergunta: “como é isso? Vocês estão brincando do jogo do lascado agora?”.  E assim dissolve-se o clima de “oh vida, oh dia, oh azar”.

Daqui, de meu lugar de Roberta quase senhora, penso que os dois joguinhos são igualmente perigosos. Em um, fecha-se o olho para o que não está dando certo. “Está chovendo, mas não está nevando. Fui demitido, mas não vou ter que trabalhar na segunda. Morri, mas passo bem”. E no outro, fecha-se o olho para o compartilhar da dor, no limite, para a escuta. É um grande “deixa disso, vamos falar de coisas boas, olha lá a iogurteira Top Therme”.

Toda essa introdução pra contar, que mesmo falando mal, estou aqui, desde sexta, em total conexão com o jogo do contente. É que levei uma queda das grandes. Caí de queixo no chão, ouvi o barulhão do meu osso no piso de madeira. A sorte e que amorteci com a mão, quebrada agora. Minha gente, eu fiquei tão inchada, tão roxa, tão esquisita, que quando cheguei em casa do hospital, os gatos tiveram medo de mim. E sabe a única coisa que eu consigo pensar? Caí de queixo, quebrei a mão, mas meus dentinhos estão todos aqui.  Não perdi nenhum. Tô tão contente. Quero mandar um beijo pra minha Poly, pra a de Eleanor, pra própria Elanor, mesmo que ela já tenha morrido em 1920, pra meu, pra minha mãe, pra Sasha e pra vocês. Ufa! Quase me lasco.

 

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