Em razão do agravamento da pandemia, diante das medidas restritivas de funcionamento do comércio e das demais atividades empresariais adotadas recentemente pelo Governo do Paraná, novamente surgem discussões acerca do cumprimento dos contratos. O mesmo cenário de um ano atrás se repete, mas com novos contornos.

Embora não exista mais a imprevisibilidade do fato, os seus reflexos, especificamente sob o aspecto econômico, continuam afetando diretamente e, em alguns casos, até mesmo agravando a situação das pessoas e das empresas. Neste contexto, quais as alternativas e o melhor caminho para remediar a situação? Negociar ou judicializar?

Em 2020, quando a pandemia iniciou, de um modo geral em relação aos contratos, muitos optaram por propor medidas judiciais visando a obtenção de liminares para a suspensão ou redução do pagamento do valor das suas prestações. Especificamente no TJ/PR, restringindo a pesquisa à matéria de Direito Civil, envolvendo contratos em geral, propriedade e relações de consumo, constam que até o momento foram julgados 300 recursos envolvendo o tema COVID e, pinçando alguns casos, dos fundamentos das referidas decisões, podem-se extrair algumas orientações.

A parte que pretende a suspensão/redução da parcela do contrato deve comprovar (ou trazer elementos factíveis) que demonstrem a impossibilidade de arcar com o montante contratado. Diante da recente lei de liberdade econômica, como a regra é de intervenção mínima do Poder Judiciário nos contratos privados, exige-se a demonstração concreta de mudanças supervenientes nas circunstâncias vigentes ao tempo da contratação.

Ou seja, a alegação não pode ser genérica e, embora notório o estado da calamidade pública em razão da pandemia, a alegação de onerosidade excessiva e os prejuízos alegados devem ser minimamente comprovados. O inadimplemento da obrigação não deve ser anterior, a fim de que não pareça que o argumento da pandemia seja somente uma escusa para o descumprimento do contrato. Ainda, quando a alegação se restringe aos prejuízos, não se pode simplesmente reverter os impactos financeiros suportados por uma das partes em desfavor da outra, principalmente quando isso não decorre de um desequilíbrio na relação contratual.

Aliás, por falar em equilíbrio, diante do contexto da pandemia, num caso em que houve a redução do valor do aluguel, considerou-se que tal medida atendeu a ambas as partes, vez que fixado em montante razoável, preservando a renda da locadora e, de outro lado, os empregos mantidos pela locatária. Num caso em que a parte pretendia suspender integralmente a sua obrigação, entendeu-se que tal pretensão, no cenário que estamos vivendo, pode acabar criando um efeito cascata, já que o credor também possui obrigações para se manter em operação, inclusive perante funcionários que dependem da manutenção dos seus empregos para seu sustento, de modo que deve ser encontrada uma solução que não sobrecarregue, de forma desproporcional, apenas uma das partes contratantes.

Como a maior parte das decisões até o momento proferidas referem-se à análise dos pedidos liminares, por certo, as partes ainda deverão aguardar um tempo até que haja uma sentença ou até mesmo que haja a apreciação do mérito da ação novamente pelo Tribunal. Considerando a demora inerente ao trâmite processual, isso pode levar alguns anos.

Assim, da breve análise realizada, percebe-se, que para aqueles que optaram por judicializar a questão envolvendo as dificuldades contratuais enfrentadas em razão da pandemia, nos casos em que liminares foram deferidas, as decisões têm imputado a quem alega o dever de comprovar minimamente os prejuízos experimentados, bem como, pautando-se pela razoabilidade, o Poder Judiciário tem buscado, quando possível, um equilíbrio contratual. Além disso, existe o fator tempo do processo e o fato de que a decisão quanto ao mérito, que ainda será proferida nessas demandas, necessariamente não satisfará os anseios das partes.

Logo, voltando à pergunta, quando se olha para as alternativas a serem seguidas no atual cenário, ainda que não se ignore que o direito de ação seja uma garantia constitucional, esse não é melhor caminho, ou ao menos, não deve ser a primeira opção. Independentemente das discussões doutrinárias surgidas acerca de ser um dever (ou não), negociar ainda se revela a melhor alternativa para as partes, principalmente em relação às questões contratuais que envolvem a pandemia.

E aqui, para se tentar chegar a bom termo, podem as partes lançar mão das mesmas orientações que os juízes têm levado em conta na apreciação da matéria (equilíbrio contratual, razoabilidade, efetiva demonstração de prejuízos), e acima de tudo, a boa-fé.

Aliás, ainda sobre o tema negociar, a orientação vale também para os advogados, que na condição de operadores do Direito e como o “primeiro juiz da causa”, têm condições de municiar as partes de elementos, que podem justamente vir a balizar um acordo ou uma negociação. E, neste sentido, acerca do excesso de judicialização no cenário brasileiro, vale a menção sobre a recente fala do ministro Luis Roberto Barroso, em sessão plenária do STF, ao afirmar que o advogado do futuro não é aquele que propõe ação judicial, mas aquele que resolve já na via extrajudicial o problema do cliente por meio de uma negociação e composição amigável.

Como negociar é uma arte, que demanda uma predisposição de cada uma das partes, se ao final, uma delas for intransingente, daí, sim, infelizmente, a medida judicial é o caminho que resta.

Vanessa Lois é advogada, especialista em Direito Tributário e Processual Tributário, mestre em Direito Empresarial