A previdência municipal de São Paulo deve fechar este ano com um déficit de R$ 5,9 bilhões, e esse rombo deve aumentar nos próximos anos de forma que, dentro de dez anos, terá consumido toda a capacidade de investimento da capital. O tema ganhou destaque nestas eleições ontem, quando o candidato Guilherme Boulos (PSOL), em sabatina ao Estadão, sugeriu combater o aumento com a contratação de mais servidores, de forma a aumentar a base de contribuintes. A ideia foi rebatida por especialistas no tema.

O consultor e ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento Raul Velloso calculou, a pedido do Estadão, as projeções da previdência para os próximos anos. “O total investido pela Prefeitura em 2019 foi de R$ 3,8 bilhões. Diante da última projeção oficial, o déficit da Previdência continuará subindo rapidamente, de forma tal que o investimento e as inversões financeiras (quando se compra imóveis ou máquinas e equipamentos que já estão em uso) cairiam pela metade em 2024, no fim do próximo mandato. Em termos reais, eles seriam de R$ 1,9 bilhão.”

Se nada for feito para conter essa crescente nos gastos, em dez anos a Prefeitura não vai ter recursos para investir na infraestrutura da cidade.

Segundo a Prefeitura, São Paulo vai desembolsar este ano cerca de R$ 10,7 bilhões com o pagamento de 92,5 mil aposentados e 23,3 mil pensionistas. As contribuições de ativos, inativos e pensionistas somam R$ 2,1 bilhões, a patronal R$ 2,7 bilhões. Os R$ 5,9 bilhões restantes são custeados com os recursos de impostos.

“Todo ano, a previdência paulistana fecha com déficit. Como a prefeitura é obrigada a pagar as aposentadorias e pensões, o Tesouro tem de cobrir esse rombo, colocando recursos no fundo que administra o sistema”, segundo Fabio Klein, especialista em contas públicas da Tendências Consultoria. “Pelas projeções atuariais, o sistema vai ter déficit pelos próximos 30 anos”, afirma.

Klein ressalta que, como o gasto previdenciário é obrigatório e o Tesouro precisa cobrir esse buraco nas contas, essa despesa drena recursos de outras áreas e acaba sendo coberta com o que a Prefeitura arrecada com impostos.

Em 2018, a Câmara Municipal aprovou uma reforma previdenciária que aumentou a alíquota de contribuição dos atuais servidores de 11% para 14%. “A reforma aumentou a receita dos servidores que estão na ativa e restringiu o acúmulo de benefícios”, diz Klein. “Mas as reformas de previdência são impopulares”, destaca – o processo foi feito sob protestos de servidores.

Propostas

As duas campanhas que estão no segundo turno nestas eleições municipais, de Boulos e de Bruno Covas (PSDB) trazem abordagens diferentes sobre o assunto em seu planos de governo.

O professor de economia da Unicamp Marco Antonio Rocha, um dos coordenadores do plano de governo de Boulos, afirma que o aumento da base de contribuintes se daria pela substituição de novos contratos terceirizados pela contratação de servidores concursados.

“A forma como as contratações têm sido feitas causa parte do desequilíbrio. Você contrata por meio de OS (Organizações Sociais, entidades que administram a maior parte dos serviços da Saúde e creches) pessoas que contribuem para o INSS, não contrata servidores que contribuem para a previdência municipal”, afirma. Rocha argumenta que a Lei de Responsabilidade Fiscal permite aumento de gastos com o pessoal da ativa. “Os recursos da previdência são para financiar um direito, que é a aposentadoria. Essa lógica também deve estar presente quando se debate esse assunto.

O economista propõe revogar a reforma de 2018, entre outros motivos, por ter estabelecido um aumento igual para servidores com altos e com baixos salários. “Quando se pensa no funcionalismo, se lembra da elite dos servidores, não da base que ganha pouco”, disse Rocha.

No lado de Covas, o plano de governo não traz propostas específicas para conter o déficit. Mas destaca que o tema está no foco do prefeito, que promoveu a reforma mais recente.

Segundo o secretário municipal da Fazenda, Philippe Duchateau, indicado da campanha de Covas para debater o tema, a gestão do prefeito aguarda a evolução, no Congresso, das discussões sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) Paralela da reforma da Previdência federal, que pretendia estender a Estados e municípios as regras da reforma feita pelo governo Michel Temer. A proposta previa, entre outros termos, que a idade mínima dos servidores também fosse aumentada nos demais entes federativos. “A situação previdenciária é muito delicada”, admite.

Duchateau disse que a Prefeitura vem adotando medidas administrativas, como concentrar a emissão de novos benefícios no Instituto de Previdência. Antes, cada órgão da Prefeitura que concedia a aposentadoria de seus servidores. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.