SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um delator da Lava Jato, o empresário e operador financeiro Adir Assad, disse em depoimento ao Ministério Público de SP que o caixa dois destinado a políticos pela CCR, empresa de concessão de rodovias, aeroportos e metrô, foi muito maior do que o volume inicialmente estimado pela companhia.

Assad afirmou que, dos cerca de R$ 46 milhões que recebeu da empresa, 80% eram destinados a pagamentos ilícitos, segundo três profissionais que atuam na investigação ouvidos pela reportagem. O percentual corresponde a R$ 36,8 milhões.

A CCR havia estimado que os recursos usados para pagamentos a políticos era de R$ 17 milhões, o equivalente a 37% do total. O montante relatado por Assad é R$ 29 milhões a mais do que a projeção da concessionária.

A CCR está negociando um acordo com o Ministério Público e mencionou que entregou recursos de caixa dois para três políticos do PSDB: o ex-governador e candidato à Presidência Geraldo Alckmin, o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira, e o senador José Serra. Todos negam ter recebido recursos ilícitos em suas campanhas.

A empresa é proibida de fazer doações a políticos por ser concessionárias de rodovias como o sistema Anhanguera-Bandeirantes, parte do Rodoanel e de linhas de metrô como a 4-amarela.

Assad está preso em Curitiba desde agosto de 2016, fez um acordo de delação com procuradores um ano depois e deve deixar o presídio no próximo mês. Ele prestou o depoimento ao Ministério Público por meio de videoconferência há cerca de duas semanas.

Assad foi o único operador do caixa dois da CCR entre 2009 e 2012, segundo relato feito em seu acordo, e dizia ser amigo do ex-presidente da empresa, Renato Vale. O executivo foi afastado em julho por causa de sua relação com Assad.

O volume de recursos destinado ao caixa dois para políticos é importante porque Assad prestava serviços lícitos e ilícitos para a CCR, de acordo com ele próprio.

Os serviços ilícitos eram a venda de notas fiscais simulando a prestação de serviços. A CCR pagava Assad por um serviço que não era prestado, ele cobrava uma pequena taxa e devolvia o dinheiro para a empresa, que por sua vez entregava o montante a políticos.

Em sua delação, Assad diz ter gerado cerca de R$ 1,7 bilhão em caixa dois para empreiteiras como Andrade Gutierrez e OAS por meio desse esquema de venda de notas frias.

No caso da CCR, porém, o empresário também prestou serviços lícitos: a companhia patrocinou um equipe de corrida de carros na categoria stock car e Assad intermediou um merchandising da empresa em novela da Globo.

Esses contratos também eram superfaturados e serviam para gerar dinheiro vivo que ele entregava à empresa, segundo Assad relatou no depoimento prestado ao promotor José Carlos Blat.

No interrogatório ele disse que a CCR pagou a mais no caso de um contrato de patrocínio à equipe de carros de corrida. Se fosse seguido o preço de mercado, o patrocínio seria de R$ 250 mil por ano, num exemplo hipotético, de acordo com Assad. A empresa, porém, desembolsava quase R$ 2 milhões e pegava a diferença de volta para usar em pagamentos ilegais.

A delação de Assad teve um forte impacto sobre as ações da CCR: assim que os termos do acordo foi revelado, em fevereiro, o valor de mercado da empresa na Bolsa caiu R$ 4,6 bilhões.

Assad relatava que foi Paulo Vieira de Souza, o ex-diretor da Dersa conhecido como Paulo Preto, que apresentou o operador financeiro para o presidente da CCR.

No depoimento ao Ministério Público paulista, o operador confirma que pagou comissão a Paulo Preto por ele ter apresentado a CCR como cliente.

Apesar de ter sido formada por duas empreiteiras que já confessaram uma série de denúncias (Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez), além de uma empresa sem reputação manchada (Soares Penido), a CCR tinha imagem ilibada.

É para recuperar essa imagem e estancar as perdas que a empresa está negociando um acordo com a Promotoria.

Em fevereiro, quando a delação de Assad se tornou pública, a companhia anunciou a criação de um comitê que investiga o que foi feito com os R$ 46 milhões.

Fazem parte do comitê um ex-ministro do Supremo, Carlos Velloso, advogados e executivos especializados em crimes corporativos. Mas, sete meses depois de ter sido criado, o grupo não apresentou nenhum resultado.

A assessoria da CCR afirma que a empresa "está contribuindo com as autoridades para que a investigação em curso elucide a denúncia veiculada na mídia".

Segundo a CCR, o comitê constituído pelo conselho de administração do grupo fará "uma investigação profunda e meticulosa dos eventos citados no depoimento divulgado na imprensa e conexos".