BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O jornal nicaraguense El Confidencial, dirigido pelo filho da ex-presidente Violeta Chamorro, Carlos Fernando Chamorro, e de oposição à ditadura de Daniel Ortega, denunciou na manhã desta sexta-feira (14) que sua Redação foi invadida pela polícia durante a noite anterior.

Nos escritórios, funcionam também os estúdios dos programas de televisão Esta Semana e Esta Noche.

Foram levados vários computadores, papéis e documentos dos jornalistas que trabalham ali.

Chamorro, que já foi diretor do jornal oficial do sandinismo e aliado de Ortega no passado, hoje é um dos principais denunciadores dos abusos de seu regime, dos atos de repressão por parte do Exército e do constrangimento à liberdade de imprensa.

Segundo Chamorro, a invasão policial foi “ilegal e violenta, um ataque direto à liberdade de expressão no país”. Eleacrescentou: “Não conseguirão calar nossos meios, continuaremos do lado do povo denunciando os abusos desse regime”.

Em entrevista à Folha, por telefone, desde Manágua, o repórter Wilfredo Miranda Aburto disse que “já estávamos vendo abusos e ataques contra a imprensa, mas não imaginávamos uma invasão como esta, que foi um verdadeiro assalto, um saque. Eles renderam os seguranças que estavam de guarda, ficaram três horas aqui e levaram máquinas, documentos e câmeras, tudo o que era necessário para inviabilizar nosso trabalho”.

Aburto é o principal jornalista do El Confidencial, autor de uma das reportagens de investigação que mais incomodaram o regime nos últimos tempos, na qual mostrou, por meio de um vazamento de emails da vice-presidente e mulher de Ortega, Rosario Murillo, que as forças de segurança estavam orientadas a matar durante as manifestações que vêm ocorrendo no país nos últimos meses.

O ataque ao Confidencial não foi único. Na mesma madrugada foram reportadas invasões a sedes de movimentos sociais do país, como o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos.

Há poucas semanas, Miguel Mora, diretor do 100% Notícias, outro meio de comunicação crítico ao governo, foi preso.

A crise na Nicarágua começou em abril, com uma tentativa do governo de impor uma reforma que cortava aposentadorias. A medida levou a protestos de rua, que o governo reprimiu de maneira violenta.

Usando as forças de segurança e grupos paramilitares, como os integrantes da Juventude Sandinista, os enfrentamentos com os manifestantes deixaram, em seis meses, mais de 350 mortos.

“Nós estamos reportando tudo isso desde o início, e então começaram as ameaças, mas nós seguimos expondo a escalada autoritarista do governo”, diz Aburto.

O posicionamento crítico do Confidencial vem desde o retorno ao poder de Ortega, em 2007. O jornal digital realizou reportagens sobre os impactos negativos do acordo feito com a China para construir um canal similar ao do Panamá, atravessando territórios indígenas, casos de desvio de dinheiro para obras públicas e a promiscuidade entre as instituições que passou a haver nesta gestão de Ortega, que submeteu a Justiça e expulsou a oposição do Legislativo nos últimos anos.

Chamorro fez a denúncia sobre a invasão à sede do El Confidencial na manhã desta sexta-feira (14), exigindo que o regime “devolva todos os equipamentos e documentos saqueados de nossa Redação”.

Entre eles, conta, estava seu próprio computador. “Não há justificativa para este ataque e para essa perseguição”, disse.

Tanto a ONU como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condenaram o ataque.

Sobram hoje poucos meios independentes na Nicarágua, fora a cadeia nacional de transmissão de informações oficiais que é realizada por Murillo, diariamente, quando relata apenas dados positivos sobre a gestão Ortega.

Em outubro, a CIDH já havia denunciado ameaças do regime contra jornalistas locais, além da deportação de repórteres estrangeiros.