BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Após um filme chinês ser tirado da programação do Festival de Berlim sob circunstâncias misteriosas, outro longa produzido no país desponta como um dos favoritos ao Urso de Ouro.


O mais curioso é que “So Long, My Son”, de Wang Xiaoshuai, é carregado de ressonância política -motivo que, segundo parte da imprensa, poderia estar por trás da retirada de “One Second”, de Zhang Yimou, da disputa. 


Durante três horas, a obra de Wang perpassa os infortúnios de um casal de operários, atravessados pelo luto, pela penúria econômica e, sobretudo, pelas mudanças socioeconômicas que moldaram a China nos últimos 30 anos.


A trama faz uma crítica contundente à política do filho único, implantada pelo Partido Comunista até poucos anos atrás, e à abertura econômica, que trouxe desemprego e alterou a vida nas cidades. 


O enredo começa com a morte do menino Xingxing, que se afoga numa represa e leva seus pais a se mudarem de cidade, onde adotam um novo filho. Na nova morada, o casal enlutado não compreende o dialeto local e é visto como estrangeiro pelo rebento, que se revolta e foge de casa. 


Entre esses dois episódios, o diretor costura idas e voltas no passado desses personagens mostrando como as mudanças do país impactaram suas vidas.


Nos anos 1980, trabalhando numa fábrica da China ainda um tanto fechada e que herdava o rescaldo da Revolução Cultural, os dois têm de seguir à risca os ditames da política do filho único. Também são afetados por demissões em massa que vêm ao cabo da abertura econômica do país. 


No presente, suas agruras são outras. Existe o choque geracional entre os protagonistas e seu filho adotivo, há o poço social que cada vez mais aparta pobres e ricos, e a modernização dos grandes centros urbanos, que sepultou alguns dos traços característicos da vida no país. 


Com essa embalagem politizada a embrulhar um melodrama bem estruturado, “So Long, My Son” torna-se um dos candidatos mais naturais a levar o principal prêmio do festival, que será anunciado neste sábado (16). Conta a seu favor também o infortúnio que afetou o conterrâneo Zhang Yimou, e seu “One Second” -a justificativa oficial dada pela equipe do filme e pela mostra alemã é que “problemas técnicos em sua pós-produção” o impediram de deixar a China.


Mas não demoraram a pintar conjecturas de que o longa, que se passa no tempo da Revolução Cultural, tenha irritado a censura do Partido Comunista. 


“Não posso especular o que de fato aconteceu”, disse Wang, em conversa com os jornalistas. “No nosso caso, sempre fomos conscientes do quanto precisamos respeitar essas regras do sistema”, afirmou o diretor. Ele não crê que seu filme vá encontrar dificuldades em seu país de origem.