Política é sim importante e necessária, porém assuntos como crises sanitárias, pandemias, vacinas, desastres ecológicos e sistema educativo deveriam se manter à parte de discussões puramente ideológicas.

A Educação Especial parece estar se tornando um dos mais recentes campos de batalha, em que devotos das diversificadas igrejas, por melhores que sejam suas intenções, tem decidido mais que pesquisadores e professores de seu exercício. Inclusão é assunto sério e necessita estar à parte das polêmicas partidárias ou doutrinarias que tem caracterizado a cena pública brasileira atual.

A questão da educação inclusiva tem sido objeto de pesquisas no mundo todo, algumas sob responsabilidade da Unesco, e destas decorreram muitas conferências e compromissos internacionais, tais como a Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de aprendizagem (1990), as Normas sobre a Igualdade de Oportunidades para Pessoas com Deficiência (1993), a Declaração de Salamanca (1994), a Declaração de Dakar (2000) e a Declaração de Madrid (2002), que preconizam a “educação para todos”, uma “educação inclusiva” promotora do sucesso de todos e de cada um, assentada na obtenção de direitos e não de concessão, igualdade de oportunidades e não de discriminação, seja ela positiva ou negativa.

Todos temos algo que poderia ser chamado deficiência, e é isso que nos torna humanos, perfeição só existiu nos delírios nazistas; talvez o que deva ser superado seja o ato de fechar portas e janelas que deveriam estar escancaradas. Evidências coletadas pela própria Organização Mundial da Saúde mostram que a incapacidade algumas vezes pode não estar intrinsecamente relacionada com a deficiência, e sim com as possíveis insatisfações do indivíduo com seu próprio desempenho, nas quais a forma como ele é tratado na comunidade, no sistema de saúde, na escola ou na própria família, ou seja, a deficiência não depende apenas das limitações físicas ou mentais, mas também das condições ambientais e sociais do entorno, que podem capacitar ou incapacitar para o convívio e o trabalho.

No entanto, embora importantes, estes tratados nem sempre promoveram a melhoria das práticas em todos os lugares do planeta, pois, partindo desses compromissos, são indispensáveis políticas públicas que possam operacionalizar meios materiais e mudanças de mentalidade para que sejam concretizados, além de uma gestão eficaz do sistema educacional. A educação inclusiva não se fará se não forem introduzidos na sala de aula instrumentos distintos dos que têm sido utilizados.

Cabe compreender “diferença”, muito presente nos discursos atuais, principalmente na área escolar. Perrenoud já no final do século passado falava de alunos com pequenas e grandes diferenças entre um e outro, mas nem sempre isso é sinônimo de algo compreensível, pois sabemos que não é simples traçar uma fronteira clara entre normalidade e deficiência.

Diferenciar deficiência intelectual entre pessoas, dado que algumas têm alto desempenho em algumas áreas (como memorizar dados, sequencia musical, apreensão matemática e assim por diante) mesmo com baixo funcionamento cognitivo, não é elementar. Capacidades humanas, afetivas, cognitivas, motoras, distribuem-se de forma complexa, muitas vezes fora dos padrões socialmente aceitos; ser diferente não é um critério objetivo, e não são diversos apenas os alunos deficientes, pois muitos também não aprendem se não receberem uma atenção particular no seu processo de aprendizagem.

Muitos são os estudantes que necessitam inclusão em salas de aulas comuns, com bom aparato de atendimento enquanto outros estariam muito melhor atendidos em escolas especiais, com professores especializados, médicos, assistentes sociais, fisioterapeutas e outros profissionais que complementam as necessidades de síndromes graves e incapacitantes.

Ouvir especialistas, acreditar no conhecimento acumulado ao longo de décadas é fundamental.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.