A situação é a seguinte. Você vai à casa do amigo e, para entrar no prédio, passa sob a cerca de fios eletrificados. Quem tocar em um desses fios levará de oito mil a onze mil volts de choque, dolorido, mas incapaz de machucar gente ou animal, assegura o fabricante. 
Você vai levar o filho à escola e, ao entrar naquela fila de carros e pais, contempla a serpentina de lâminas afiadas que agora circunda o estabelecimento de ensino. Caso alguém tente pular o muro, divulga o fabricante, o formato espiral das lâminas faz com que ela corte e perfure a carne do imprudente em várias direções. É muito usada em presídios.
Dê uma volta no quarteirão e verá que cercas eletrificadas e a versão, digamos, moderna do arame farpado são a nova onda em condomínios, lojas, restaurantes, escolas, creches. É difícil encontrar casa ou prédio sem ao menos um desses equipamentos. Tem quem instale logo os dois. 
O que acontece? É muito provável você dizer que se trata de recurso último de proteção diante da violência que impera e da incapacidade dos governantes de prover segurança. Entendo. Mas digo eu, se me permite: creio não ser solução. Pelo contrário, fechar-se em muros só vai piorar o problema. 
A segurança de uma cidade não é resultado só do trabalho das forças policiais, por melhor e mais armadas que sejam. Uma cidade só é segura se os moradores também estão nas ruas, conhecem os vizinhos, o bairro onde moram, vão ao centro, saem de casa, saem do shopping. Não quer fazer isso sozinho? Melhor, convide os amigos. 
Quem se esconde atrás de muros e arames farpados abandona a cidade, não se importa com o que acontece lá fora. A mensagem é: “Estou protegido aqui no meu bunker, que me importa a rua”.
Criança, ia e voltava da escola a pé. Meus pais não se preocupavam. No caminho, os vizinhos conheciam aquele menino, viam-me das janelas, acenavam, sabiam de quem era filho e onde morava. Eu estava seguro. Quando viajávamos, os vizinhos cuidavam de nossa casa. Hoje, é impossível. Os paredões não deixam ver nada. Se há gente passando na rua, se há ladrões dentro da casa.
Primeiro foram os muros que começaram a crescer, depois chegaram as grades, os cacos de vidro colorido, os rottweilers, os pitbulls, as câmeras, os alarmes, as empresas de vigilância. Não foram suficientes. 
A onipresença das cercas de eletrochoque e de arame farpado está dando à cidade um visual feio, agressivo, Mad Max. Qual o próximo passo? Caldeirões de óleo fervente? Na Venezuela, as pessoas estão entijolando janelas e portas. Sim, põem tijolo e cimento onde antes se abria uma janela para o quintal.

* Flavio Costa é Jornalista