SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O escultor Richard Serra não gosta de monumentos. Nem do “brutalismo extremo, quadrado, sem nuances” de São Paulo. Mas sua primeira obra na cidade parece negar todo esse discurso


Na contramão da ideia de leveza e transparência da torre envidraçada do Instituto Moreira Salles, as duas lâminas de aço que ele fincou no pátio do centro cultural numa das pontas da Paulista são lápides secas, duras, impenetráveis.


E, ao menos nas dimensões, monumentais -elas têm quase 20 metros de altura e juntas pesam mais de 140 toneladas. Tanto que tiveram de esperar dois anos para serem montadas, o tempo que engenheiros levaram para estudar as correntes de vento da avenida até ter certeza que as placas não tombariam sobre gente -uma peça do americano já desabou e matou um operário- nem sobre os prédios.


Serra, um dos maiores nomes da arte contemporânea, é da geração de autores que despontou na década de 1960 e então redefiniu a ideia de escultura, a maioria deles homens que fizeram de suas obras um desafio à escala da paisagem. Deixaram marcas gigantescas no horizonte, em rios, desertos, campos e praias, a chamada land art.


Mas não são monumentos. “É equivocado falar em monumentalidade em relação ao meu trabalho”, ele afirma. “Monumentos elogiam uma pessoa, um lugar, um acontecimento. Uma escultura em grande escala não significa monumentalidade.”


No caso de Serra, são obras que não expressam mais que o impacto acachapante do próprio peso, a força da matéria pura como espetáculo.


“O peso é um valor para mim”, diz. “Não é mais convincente do que a leveza, mas tenho mais a dizer sobre o equilíbrio do peso, a concentração do peso, o posicionamento do peso, os efeitos psicológicos do peso, a rotação do peso, a desorientação do peso.”


Toneladas à parte, Serra reconhece nessa nova escultura o efeito contrário. “A verticalidade faz o trabalho parecer mais leve que sua massa”, diz. “E a experiência da escultura vista do chão é inquietante por causa da agitação que ocorre ao olhar para cima.”


Ele fala da vertigem causada pelas placas, que se tornam blocos um tanto ameaçadores quando vistos contra o céu da cidade. Do quinto andar do Instituto Moreira Salles, no entanto, são só obstáculos meio carrancudos retalhando a vista da metrópole.


Muito antes de mover carregamentos mastodônticos de metal para forjar essas peças que já encheram o Grand Palais, em Paris, o Guggenheim de Bilbao, na Espanha, e praças públicas mundo afora, Serra já tentava traduzir a ideia de movimento mesmo em suas obras um tanto estáticas.


Os nomes de suas primeiras esculturas, por exemplo, eram verbos. Rolar, cortar, arremessar, escorar foram algumas das ações que embasaram as peças dos primórdios de seu trabalho. Num filme da mesma década de 1960, ele mostra mãos tentando agarrar um pedaço de chumbo em queda livre, tornando visível o atrito entre as ideias de peso e leveza, imobilidade e movimento, que embasam toda escultura.


Mais tarde, já na fase mais espetacular de sua obra, a preocupação com o movimento se desloca das peças para o corpo do espectador, que adentra seus labirintos metálicos. “O movimento corporal pela escultura é uma premissa básica do meu trabalho”, diz.


Serra nega, no entanto, uma dimensão política desse caminhar. Mesmo já tendo criticado em cartazes os abusos políticos do governo americano na Guerra do Iraque e fazendo questão de chamar o presidente Donald Trump de “mentiroso patológico” e “ditador narcisista”, ele diz que seria exagero pensar a forma como suas obras ditam os passos do público como metáfora para um comentário político qualquer.


“Isso seria hiperbólico”, diz o homem que passou suas mais de oito décadas de vida pensando e construindo coisas muito maiores do que ela.


RICHARD SERRA


Quando Ter., qua. e sex. a dom.: 10h às 20h. Qui.: 10h às 22h. Abre sáb. (23)


Onde IMS – av. Paulista, 2.424, tel. (11) 2842-9120


Quanto: grátis