SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em passagem por cidades paulistas e baianas no ano passado, o autor moçambicano Pedro Pereira Lopes se alarmou com a falta de conhecimento dos brasileiros sobre a África contemporânea. 


“Fiquei espantado com a ideia que faziam da África, do africano e da sua literatura”, disse à Folha de S.Paulo. “Já tinha tido experiências similares na China, mas o Brasil, pela língua, é um próximo-distante.”


O Atlântico que separa Brasil e África em relação à difusão literária já foi, na verdade, mais profundo. 


A consolidação no nosso mercado editorial da obra de autores como os angolanos Pepetela, José Eduardo Agualusa e Ondjaki, a popularização recente dos livros da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie e o fortalecimento de editoras voltadas à literatura africana, especialmente a Kapulana, sinalizam algum avanço. Mas o progresso ainda é tímido. 


Nesse sentido, são bem-vindas iniciativas como o 2º Encontro Internacional com Escritores Africanos. Nesta quinta (23), às 15h, haverá a abertura oficial na Câmara de Vereadores de São Paulo. Os debates e palestras acontecem de sexta (24) a domingo (26) no Centro Cultural Olido. 


Uma das atrações do evento, Lopes, 32, vai comentar temas como o afrofuturismo, movimento cultural que estabelece pontos de contato entre a história do continente, a filosofia, a ciência, a tecnologia, entre outros campos.


Vencedor de prêmios como o Eduardo Costley-White, da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), o moçambicano tem dois livros infantojuvenis editados no Brasil, “Kanova e o Segredo da Caveira” (2013) e “Viagem pelo Mundo num Grão de Pólen e Outros Poemas” (2014), ambos pela Kapulana. 


Durante o encontro em São Paulo, ele vai lançar “a invenção do cemitério” (assim mesmo, em letras minúsculas) pela editora Desconcertos. Trata-se de versão para o Brasil de “o mundo que iremos gaguejar de cor”, livro de contos voltado para o público adulto. 


Lopes tem grande admiração por Mia Couto, o autor moçambicano mais difundido no Brasil. Mas sugere que os brasileiros também conheçam outros autores do país, como José Craveirinha (“nosso poeta-mor”) e Virgílio de Lemos (“espécie de Fernando Pessoa africano que jaz no esquecimento”). 


Lembra-se ainda de João Paulo Borges Coelho, romancista vencedor do prêmio Leya em 2009 por “O Olho de Hertzog”.


Entre os nomes da nova geração, Lopes chama a atenção para poetas como Sangare Okapi, Mbate Pedro, Hirondina Joshua e Andes Chivangue. 


A história de Moçambique é um dos temas centrais da produção literária de Lopes. É natural, portanto, que surjam referências nos seus próximos livros às recentes tragédias naturais que devastaram regiões do país. 


Em março, o ciclone Idai deixou mais de mil mortos. No mês seguinte, o país foi atingido por um segundo ciclone, o Kenneth, que matou mais de 40 pessoas.


Lopes já morou em Beira e Dondo, duas das cidades que foram arrasadas pelo Idai. “Os donativos e os apoios não chegaram, hão há transparência, há muita má administração.” 


Também participam do 2º Encontro Internacional com Escritores Africanos a romancista Ana Paula Fontaínha (Cabo Verde), o poeta Eliseu Banori (Guiné Bissau), o ensaísta Adebayo Vunge (Angola), entre outros. 


O evento é promovido pela Literáfrica Brasil, entidade comandada pelo escritor e produtor cultural João Canda, angolano radicado no Brasil. Canda também vai se apresentar no evento.