Embora nem todas as pessoas tenham um mesmo grau de acesso aos recursos tecnológicos, e estes possam até aumentar a desigualdade social, é evidente que sofremos alterações na forma de vida e atitudes em função da tecnologia.
A estratificação resultante das novas mídias, ou seja, as desigualdades resultantes do seu uso nas diversas classes sociais de cada região – algumas praticamente alijadas delas – produz aquilo que denominamos hoje de lacunas de conhecimento, pois países mais ricos, e principalmente suas classes sociais mais altas, tem acesso facilitado às modalidades mais sofisticadas de trabalho e aos novos empreendimentos. Pessoas conectadas em rede tem mais facilidade não apenas às informações, mas a tudo que decorre destas: mais oportunidades de emprego, mais segurança, saúde, lazer, entre outros itens que trazem conforto e inovação na rotina diária.

No entanto, tudo isso se altera também na dependência da estrutura das personalidades envolvidas, e percebe-se hoje que as identidades pessoais têm sofrido alterações profundas se estamos off-line ou online: jovens e crianças estão desenvolvendo duas formas de identidade, inéditas em nossa cultura até o momento. Seres humanos sempre apresentaram diferenças sensíveis entre seu comportamento privado e público, pois a sós temos um certo padrão de comportamento que nem sempre se repete quando acompanhados, já que as normas sociais interferem significativamente neste último caso. Comunidades e até povos podem ser mais expansivos ou introvertidos em comparação com outros, é o caso, por exemplo, da emotividade brasileira versus a contenção associada a europeus ou orientais. Se o meio permite mais contato físico, como abraços ou demonstrações explícitas de afetividade, mesmo pessoas mais tímidas – no plano pessoal – tendem a soltar-se um pouco mais, socialmente falando. E é interessante verificar que muitos estrangeiros, sisudos em seus países de origem, se contaminam com a alegria brasileira.

Isso sempre existiu, mas vemos hoje o desabrochar de um controle bem mais difícil sobre nossas identidades sociais, já que nossas características pessoais podem ser extremamente passíveis de serem alteradas quando estamos online, e o tipo de vida que vivemos pode ser classificado como digitalmente mediada. Claro que alterar nossos avatares pode modificar a forma como somos percebidos pelos demais, e isso certamente provoca confusão intima entre impulsos autênticos ou cultivados, até o ponto em que sejamos incapazes de discernir entre um e outro; e isso justifica inclusive o uso da internet para divulgar dados extremamente pessoais, que possivelmente trarão dissabores ou mesmo complicações judiciais. Nestes casos estão aqueles que enviam nudes, declarações racistas, detalhes de renda ou atividades de lazer, xingamentos, machismos, homofobias, agressões de vários tipos, como se estivessem falando apenas entre amigos de estrita confiança. Tais comportamentos, mais visíveis quanto mais jovens são os usuários das redes sociais, infelizmente é visto também entre adultos, numa época em que ninguém quer crescer, ou seja, amadurecer; e assim subestima-se o risco corrido em tempos de violência extremada, que muitas vezes extrapola o verbal e é explicitada no plano físico.

Observando crianças e jovens no ambiente escolar, é fácil verificar que as relações custo-benefício de alguns de seus procedimentos não estão nos universos emocionais, e que o desejo de aprovação social é preponderante a qualquer outra perspectiva em seus atos. Colocar-se com intimidade, oferecer o prazer do compartilhamento, concordar com o outro em suas mais estapafúrdias declarações, sentir-se membro daquele grupo parece cegar a autocrítica. A instabilidade da identidade pessoal produzida pela enorme insegurança de quem pode ou não ter acesso às postagens – já que amigos compartilham com outros amigos – tem criado hoje identidades sociais assentadas em premissas falsas, e as agressões crescem