SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nas eleições municipais de 2016, a candidata Magally da Silva Costa, 22, foi até a urna eletrônica, mas não votou nela mesma. No pleito, não obteve nenhum voto.


O julgamento da possível candidatura fictícia de Magally Costa e de mais quatro mulheres em Valença do Piauí, a 216 km de Teresina, pode abrir precedente aplicável aos casos de candidaturas-laranjas em todo o país.


É o primeiro processo de fraude na cota de gênero analisada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O ministro Edson Fachin pediu vista e o julgamento deverá ser retomado em maio.


O processo pode gerar um efeito cascata para as candidaturas fictícias de mulheres no PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, nas eleições de 2018, em casos revelados pelo jornal Folha de S.Paulo. O TSE não tem números sobre candidaturas fictícias no país.


A exigência de cota mínima de 30% de mulheres nas coligações eleitorais -lei de 2009- foi burlada em Valença do Piauí, segundo o ministro do TSE, Jorge Mussi, relator do processo.


O magistrado -ao apresentar seu voto em 14 de março deste ano- cassou os registros das duas coligações, atingindo 29 candidaturas entre eleitos e não eleitos. 


A decisão afasta seis vereadores eleitos, dos 11 existentes na Câmara de Valença do Piauí. A alegação é que a fraude das cinco candidaturas femininas beneficiou toda a coligação proporcional. 


“A gravidade dos fatos é incontroversa”, disse Jorge Mussi, que manteve a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí com base no artigo 10, parágrafo 3º, da Lei das Eleições (9.504/1997).


No relatório, o ministro apontou como fraude a candidatura de Ivaltânia Nogueira, 56, do Pros, mãe de Leonardo Nogueira, também do Pros, que foi o segundo vereador mais votado da cidade com 827 votos. A mãe, segundo o relator, não realizou propaganda e apoiou publicamente o filho.


Outro caso incomum citado por Jorge Mussi foi o de Maria Eugênia de Sousa Martins Gomes, 56, do PSL, que obteve um voto e fez campanha no Facebook para o marido, candidato pelo mesmo partido. 


Segundo Mussi, chama atenção o caso da candidata Maria Neide da Silva Rosa, 60, do PRB, que não compareceu às urnas para votar. Magally da Silva que foi à cabine de votação e não obteve nenhum voto, alegou problemas médicos e não requereu a substituição.


Tanto o TRE do Piauí como o relator afirmaram que as cinco candidaturas tinham extrema semelhanças dos registros de campanhas, tipo de despesas, valores, datas de emissões de notas fiscais e até mesmo sequência numérica.


“Denotam com perfeita nitidez índicos de maquiagem contábil”, disse Mussi, que, além de cassar os registros, tornou inelegível o vereador Leonardo Nogueira e Antonio Gomes da Rocha (PSL). 


O advogado Luís Francivando Rosa da Silva, que defende a cassação dos registros, afirma que é um mau costume dos partidos preencherem a cota de gênero com candidaturas fictícias.


“A fraude foi constatada em primeira e segunda instâncias. Se o TSE não punir exemplarmente vai aumentar o número de candidaturas laranjas nas eleições.”


José Norberto Campelo, advogado que defende os vereadores, afirmou que a cassação interfere na soberania do voto e pode mudar a configuração política brasileira. 


“Mais de 50% dos eleitores de Valença votaram na coligação que vai cair. É um equívoco porque a pena afeta pessoas que não participaram da fraude e que seriam eleitos com ou sem candidatura fictícia.”


Candidatas com indícios de fraudes:


Magally da Silva Costa


Acusação: compareceu as urnas, mas não votou nem em si


Partido: PR


Votos: zero


Ocupação: estudante


Gastos: R$ 3.458,00


Georgia Lima Verde Brito


Acusação: não realizou campanha


Partido: PSB


Votos: 2


Ocupação: dona de casa


Gastos: R$ 1.888,00


Ivaltânia Vieira Nogueira Pereira da Silva


Acusação: não fez campanha e trabalhou para eleger seu filho que é do mesmo partido e foi eleito com 827 votos


Partido: Pros


Votos: 1


Ocupação: aposentada


Gastos: R$ 1.680,00


Maria Neide da Silva Rosa


Acusação: ausência de campanha e não compareceu as urnas para votar


Partido: PRB


Votos: 3


Ocupação: professora


Gastos: R$ 2.108,00


Maria Eugênia de Sousa Martins Gomes


Acusação: Ausência de campanha e pediu voto para o marido no Facebook


Partido: PSL


Votos: 1


Ocupação: dona de casa


Gastos: R$ 1.570,00