CURITIBA, PR, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Alvo de críticas dentro do próprio Ministério Público, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba pediu a suspensão da criação de um fundo bilionário que iria bancar projetos de cidadania e anticorrupção com recursos recuperados da Petrobras.


Em pedido enviado à Justiça Federal nesta terça (12), os procuradores do Ministério Público Federal disseram estar consultando órgãos como a AGU (Advocacia-Geral da União), a CGU (Controladoria-Geral da União) e o TCU (Tribunal de Contas da União), além da Petrobras, “na busca de soluções ou alternativas que eventualmente se mostrem mais favoráveis para assegurar que os valores sejam usufruídos pela sociedade brasileira”.


A criação do fundo, noticiada pela Folha de S.Paulo na semana passada, foi criticada por advogados e especialistas em direito, que questionavam o protagonismo do Procuradoria no processo.


Também nesta terça, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que anule o acordo firmado entre a Lava Jato e a Petrobras.


Pelo acerto, seria criada uma fundação privada, num processo sob coordenação dos procuradores no Paraná, com a participação de entidades da sociedade civil e órgãos do poder público.


A instituição iria gerir recursos de até R$ 2,5 bilhões, pagos como multa pela Petrobras como parte de um acordo com as autoridades dos Estados Unidos para compensar perdas de acionistas minoritários com os esquemas de corrupção revelados a partir de 2014.


Dodge afirmou que as cláusulas do acordo que resultaria no fundo “deixam bastante evidente o protagonismo de determinados membros da instituição, singularmente os que integram a força-tarefa Lava Jato Curitiba”.


Para Dodge, os procuradores que o assinaram o acordo extrapolaram suas atribuições constitucionais e legais e violaram preceitos básicos da instituição, como os de representar interesses sociais relevantes, defender os interesses públicos e os princípios fundamentais da democracia.


“Não é possível que órgão do MPF, em decorrência do exercício de suas atribuições funcionais, possa desempenhar atividades de gestão de recursos financeiros de instituição privada, nem definir onde serão aplicados, muitos menos ter à sua disposição um orçamento bilionário”, afirmou.


No STF (Supremo Tribunal Federal), parte dos ministros vê com reservas a criação do fundo. O ministro Marco Aurélio disse a jornalistas, também nesta terça-feira que, em casos semelhantes, envolvendo tribunais de Justiça, tem considerado impróprios medidas desse tipo.


“O Ministério Público atua, como também deve atuar o Judiciário, estritamente a partir do Orçamento. [A mistura de público e privado] Não interessa ao Estado, não interessa ao contribuinte. Isso acaba saindo caro em termos de administração”, afirmou.


“O reparo [dos danos causados pela corrupção] deve ocorrer considerados os prejudicados, e o Ministério Público não foi prejudicado. O que eu penso é que isso revela os tempos estranhos vivenciados, a perda de parâmetros, a colocação em segundo plano de certos valores muito caros à administração pública.”


A força-tarefa vinha sustentando que seu papel é apenas de indutor ao dar os primeiros passos para criar a fundação e que a gestão da entidade não seria dela, mas de representantes da sociedade civil.


Em nota nesta terça, os procuradores de Curitiba argumentam que a ideia foi baseada “na melhor experiência nacional e internacional”, para que os recursos fossem empregados “em favor da sociedade brasileira”.


Em entrevista à imprensa, o procurador Roberson Pozzobon disse que a força-tarefa recuou diante de “uma série de considerações” feitas nos últimos dias por diversos órgãos, e afirmou que pretende discutir o assunto e consolidar as sugestões. Para ele, parte das críticas ao fundo foram bem colocadas, mas outras foram “manifestamente injustas, baseadas em fatos totalmente mentirosos, que poderiam ser desconstruídas com a simples leitura do acordo”.


“Nós estamos acostumados a ataques. Mas a operação é transparente, aceita as críticas, reflete sobre elas e busca sempre o aprimoramento, em prol do interesse público”, afirmou.


O pedido dos procuradores ainda precisa ser acatado pelo juiz Luiz Antônio Bonat –que substituiu o ex-juiz Sergio Moro na Lava Jato.


Os valores depositados pela Petrobras continuam depositados em conta administrada pela Justiça Federal do Paraná.