PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – O presidente da França, Emmanuel Macron, anunciou, na noite desta segunda-feira (10), um pacote de medidas para responder à sequência de manifestações dos “coletes amarelos”, que há quase um mês leva centenas de milhares de pessoas às ruas e estradas do país.

Em pronunciamento transmitido pelos principais canais de TV, ele disse que o salário mínimo, hoje fixado em 1.500 euros (R$ 6.500), será reajustado em 100 euros (R$ 445).

A recomposição do poder aquisitivo é a principal pauta do movimento, que surgiu em oposição ao aumento de uma taxa sobre combustíveis, já revogado na semana passada.

Além disso, o presidente afirmou que a remuneração de trabalhadores por horas extras não será taxada (ou seja, não haverá deduções tributárias) e que anularia a alta de uma contribuição compulsória que incide sobre aposentadorias “”a medida valerá para quem recebe até 2.000 euros (R$ 8.900).

Por fim, incentivou empregadores a oferecer um abono de fim de ano a funcionários, pagamento que também estará isento de taxas e deduções.

Mas Macron afirmou que não recuará da extinção do imposto sobre fortunas (na verdade, convertido em imposto sobre propriedades imobiliárias), uma das de suas primeiras medidas ao chegar ao Eliseu, em maio de 2017.

O fim do tributo é uma das decisões do chefe de Estado mais atacadas por opositores e por integrantes do movimento dos “coletes amarelos”, que o chamam de “presidente dos ricos” e criticam o suposto descolamento da realidade do antigo executivo de um banco de investimentos.

Macron abordou essas alegações de insensibilidade social, pedindo desculpas indiretamente. Para aquele que é comparado a antigos reis pela empáfia e pouca disposição em ceder a apelos populares, trata-se de uma “descida de salto” inédita.

“Não conseguimos trazer resposta rápida e forte a um sofrimento de mães solteiras, aposentados e trabalhadores que já dura 40 anos. Assumo minha parte de responsabilidade por isso”, afirmou.

“Por vezes, posso ter magoado alguns de vocês com minhas palavras.”

Ele se referia a episódios de interação com cidadãos comuns que acabaram em saia justa, como aquele em que, diante da reclamação de um jovem sobre a dificuldade de encontrar emprego na França, disse que poderia achar um posto para ele no ato, atravessando a rua, em qualquer restaurante ou hotel (“eles só querem quem esteja disposto a trabalhar”).

A taxa de desocupação entre franceses de até 24 anos é de 20%, enquanto fica nos 9% na população como um todo.

Também durante o discurso, Macron voltou a condenar a violência de alguns manifestantes (“nenhuma raiva justifica atacar policiais e prédios”) e falou em termos vagos sobre a necessidade de descentralizar o Estado francês e de conduzir um “debate sem precedentes” sobre a identidade nacional e a imigração. Mencionou ainda a urgência de uma discussão sobre o oferecimento de serviços públicos em todo o território francês.

Nessa seara, os “coletes amarelos”, que mobilizaram 136 mil pessoas no último sábado (8), se queixam de “desertos de hospitais” em algumas regiões e argumentam que o governo não deveria tornar mais onerosos os deslocamentos em carros particulares de quem mora onde há poucos ônibus e trens.

Mais cedo na segunda, em outro aceno ao diálogo, Macron recebeu no Eliseu os presidentes do Senado e da Assembleia Nacional, presidentes dos principais sindicatos franceses e líderes de entidades patronais.

A reunião coincidiu com a divulgação de uma má notícia pelo banco central do país: em parte por causa do bloqueio de ruas, rodovias e depósitos desde 17 de novembro, a economia crescerá no último trimestre de 2018 apenas 0,2% em relação aos três meses anteriores, bem menos do que 0,4% previsto.

O movimento dos “coletes amarelos”, cujo nome faz referência ao acessório obrigatório em carros que circulam na França, é considerado pela opinião pública local o mais vigoroso desde a revolta estudantil e sindical do Maio de 68 –em um país, não custa lembrar, em que protestar é quase uma modalidade esportiva.

Lucas Neves