SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, disse nesta quarta-feira (3) que a Assembleia Constituinte é a chance do chavismo para “tirar o espinho da derrota” nas eleições parlamentares de 2015, vencidas pela oposição.
A declaração foi feita no Conselho Nacional Eleitoral (CNE), onde entregou o decreto sobre a troca da lei máxima. Ao mesmo tempo, seus rivais eram alvo das forças de segurança em manifestações que terminaram com um adolescente morto em Caracas.
Em discurso no órgão eleitoral, o mandatário declarou que haverá eleições nas próximas semanas e desafiou seus rivais a se candidatarem, embora as regras sobre quem poderá e como será a disputa ainda não estejam claras.
“Eles conseguiram essa maioria circunstancial, sempre disse isso. Agora temos a oportunidade com a Constituinte de voltar aos caminhos da vitória popular bolivariana chavista. Essa é a hora. Ninguém pode se abster.”
E voltou a atacar contra o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges, e o ex-líder do Legislativo Henry Ramos Allup –a quem responsabiliza pela violência na onda de protestos contra seu governo iniciada em abril.
“Querem diálogo, tomem a Constituinte”, afirmou. “Se vocês dizem que são maioria, lancem seus candidatos. Que a oposição participe da Constituinte e o povo decidirá. Eu confio no povo e na vitória.”
Como em outras ocasiões, Maduro atribuiu a derrota em 2015 à “confusão dos eleitores”, desta vez usando como justificativa a guerra econômica, como chama a crise de desabastecimento no país.
Em resposta ao chavista, Julio Borges voltou a chamar a Constituinte de fraude. “Estamos nas ruas exigindo que queremos votar, queremos eleições nas que todo mundo vote e não uma Constituinte apontada a dedo.”
Apesar de Maduro ter dito esperar a oposição, o decreto que convoca a Assembleia diz que os representantes serão escolhidos “nos âmbitos setoriais e territoriais”. Porém, as regras de participação continuam incertas.
Caberá ao CNE definir as condições para a eleição da Constituinte, mas a presidente do órgão, Tibisay Lucena, não deu um prazo para a regulamentação. Dos cinco reitores do conselho, quatro são aliados de Maduro.
O único opositor, Luis Emilio Rondón, disse em uma rede social que a redação de uma nova Constituição deveria ser aprovada em plebiscito, mecanismo usado por Hugo Chávez para desatar a troca da lei máxima em 1999.
“É importante não confundir iniciativa com convocação e respeitar que o povo é o depositário do Poder Constituinte. Só depois que o povo se pronunciar sobre a convocação e suas bases seria possível ir à fase de eleições.”
PROTESTOS
Maduro entregou o decreto em um ato com militantes governistas no centro de Caracas. No leste da capital, porém, a oposição voltou a ser impedida pelas forças de segurança de avançar.
O estudante Armando Canizales, 17, foi morto ao ser atingido por uma bomba de gás lacrimogêneo, testemunhas afirmam, atirada pela Guarda Nacional Bolivariana que tentava dispersar um grupo de manifestantes.
Os agentes atiraram também jatos d’água e balas de borracha contra os grupos que, em sua maioria, protestavam pacificamente. Em seguida, centenas de encapuzados passaram a enfrentar as forças de segurança.
Neste momento, os jornalistas foram impedidos de avançar, primeiro por uma barreira policial e depois sendo alvo de gás lacrimogêneo e água. Segundo as autoridades de saúde, mais de 300 pessoas ficaram feridas.
A violência nos protestos deverá ser o mote da campanha eleitoral do chavismo, como Maduro deu a entender em seu discurso. “O povo tem que decidir se quer guerra ou paz, se quer violência ou constituinte”, disse.
“Denuncio ao mundo uma violência armada, fascista, antipopular que se levantou em armas contra a República, e a República tem direito a se defender do terrorismo e vamos nos defender.”
O chavista voltou a ser alvo das críticas da procuradora-geral da República, Luisa Ortega Díaz, por não conter a repressão das forças e violar o devido processo legal dos presos em manifestações.
“Não é possível exigir comportamento pacífico e legal dos cidadãos se o Estado toma decisões que não estão de acordo com a lei”, disse, em entrevista ao americano “The Wall Street Journal”.
Indicada por Chávez em 2007, Ortega Díaz tem se distanciado do governo. Ela chamou de ruptura constitucional a decisão da Justiça que tirava os poderes do Legislativo em 30 de março, estopim para a onda de protestos.