O atual ministro da Justiça e deputado federal pelo Paraná licenciado, Osmar Serraglio (PMDB), é citado na investigação da Operação Carne Fraca, deflagrada nesta sexta (17) e que apura a venda ilegal de carnes por frigoríficos por meio do pagamento de propina a fiscais agropecuários. Serraglio assumiu no início do mês o ministério, ao qual está subordinada a Polícia Federal.

Megaoperação contra fraudes em carnes cumpre mandados no Paraná

O ministro foi citado numa ligação telefônica interceptada com Daniel Gonçalves Filho, fiscal agropecuário e superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná entre 2007 e 2016. Segundo a PF, Gonçalves Filho era “o líder da organização criminosa” que atuava no órgão, permitindo o recebimento de propina em troca de vistas grossas na fiscalização de frigoríficos.

Em fevereiro do ano passado, Serraglio, então deputado federal pelo Paraná, ligou para o fiscal para obter informações sobre o frigorífico Larissa, de Iporã (PR), de propriedade de Paulo Rogério Sposito – que foi candidato a deputado federal em São Paulo, pelo PPS, em 2010. O ministro se refere ao fiscal como “grande chefe”.

“O cara que está fiscalizando lá apavorou o Paulo, disse que hoje vai fechar aquele frigorífico… Botou a boca. Deixou o Paulo apavorado”, comenta Serraglio ao telefone. Gonçalves Filho, então, entra em contato com a fiscal da área para obter informações sobre o tema. A servidora diz que não há nada de errado no frigorífico, e o chefe repassa, na sequência, a informação a Serraglio, de acordo com a PF.

Sposito é um dos investigados na operação, sob suspeita de pagar propina a fiscais para evitar autuações. Ele é alvo de um mandado de prisão preventiva nesta sexta (17).

Veja a transcrição das gravações de Serraglio e Daniel:

Osmar Serráglio: grande chefe tudo bom?
Daniel Filho: tudo bom
Osmar: viu, tá tendo um problema lá em Iporã, cê tá sabendo?
Daniel: não
Osmar: o cara lá, que..o cara que tá fiscalizando lá…apavorou o Paulo lá, disse que hoje vai fechar aquele frigorífico…botõ a boca…deixou o Paulo apavorado, mas pra fechar tem o rito, num tem? Sei lá. Como que funciona um negócio desse?
Daniel: deixa eu ver o que acontecendo…tomar pé da situação lá tá…falo com o senhor

 

Foro

O juiz Marcos Josegrei da Silva, porém, assim como o Ministério Público Federal, entenderam que não havia indícios suficientes que apontem o cometimento de crime pelo então parlamentar. “Não se extraem elementos suficientes no sentido de que o parlamentar (Deputado Federal) que é interlocutor em um dos diálogos, que detém foro por prerrogativa de função, esteja envolvido nos ilícitos objeto de investigação no inquérito policial relacionado a este feito”, afirma o juiz.

Para o magistrado, é “natural” que os servidores do Ministério da Agricultura “busquem auxílio ou intervenção de deputados de seu Estado a fim de viabilizar o atendimento de interesses do órgão”, desde que dentro da legalidade. “Essa circunstância, por si, não é indicativa de prática alguma de crime”.

“Até que se tenham, pelo menos, indícios mínimos da participação efetiva de pessoa detentora de mandato eletivo, com foro privilegiado, nos delitos de corrupção, falsidades, lavagem de dinheiro, dentre outros apurados na presente investigação, entendo que não há motivo para deslocamento de competência a instância superior”, escreveu o juiz.

DEPUTADOS – Além de Serraglio, assessores parlamentares de outros dois deputados federais são citados na investigação. Um deles é Heuler Iuri Martins, assessor do deputado federal paranaense e sobrinho do senador Roberto Requião, João Arruda (PMDB-PR). Martins foi interceptado em gravações demonstrando interferir em prol dos interesses de frigoríficos no afastamento de fiscais que se demonstravam rigor nas fiscalizações.

Um dos fiscais linha-dura é chamado de “capeta” por Martins. Ronaldo Troncha, assessor de outro deputado federal paranaense Sérgio Souza (PMDB), também aparece nas gravações. Ele demonstra proximidade com um dos fiscais investigados, Daniel Gonçalves Filho, e chega a receber o login e senha do servidor para acessar o sistema de procedimentos administrativos do Ministério da Agricultura.

Troncha ainda recebeu duas transferências, no valor total de R$ 10 mil, de Gonçalves Filho, entre 2009 e 2011. A suspeita, segundo a PF, é que ele atue em defesa dos frigoríficos, em parceria com o fiscal. Os dois assessores parlamentares foram alvos de medidas de condução coercitiva e busca e apreensão nesta sexta (17). O juiz Marcos Josegrei da Silva, porém, descartou a participação dos deputados, a princípio. “A atuação de deputados nas atividades administrativas do ministério não é clara, sendo possível, e até ínsita ao seu múnus público, a ingerência na estruturação de atividades e composição de órgãos públicos, desde que dentro da legalidade de suas atribuições”, afirma Josegrei.

Outro lado – Procurada a assessoria do ministro Osmar Serraglio informou que divulgará nota sobre o caso. A reportagem ainda não conseguiu contato com as assessorias dos parlamentares citados.

Sérgio Souza — O deputado federal Sérgio Souza (PMDB) divulgou nota na manhã desta sexta-feira (17), onde esclarece que Ronaldo Troncha, que aparece nas gravações que desencadearam a Operação Carne Fraca da Polícia Federal, não é mais seu assessor desde o ano passado, e que os fatos datam da época em que o mesmo não trabalhava em seu gabinete. No período que foi assessor, Ronaldo desempenhou suas funções com dedicação e, até onde o conheço, é pessoa ilibada e responsável , afirmou o parlamentar.