Uma grande pergunta que podemos fazer ao olhar o cenário político nacional é: o brasileiro se tornou mais politizado com a crise do sistema? Para refrescar a memória, vamos analisar o histórico dos últimos anos. Em 2013, acredito ter sido um marco, quando houve grandes manifestações, o assunto era o aumento da tarifa dos transportes públicos. Ao chegarmos em 2016, os protestos foram contra a ex-presidente Dilma e reuniram mais de três milhões de pessoas pelo País. E esse envolvimento dá a impressão de que a resposta para a questão é positiva.
Outros fatores apontam para essa rápida resposta. Uma recente pesquisa, realizada pela Datafolha, mostra que 84% dos brasileiros são a favor da continuidade da operação Lava Jato, que a luta contra a corrupção não deve parar. Essa e outros dados dão a impressão de que nos tornamos mais politizados, mas será que isso realmente aconteceu?
Quando analisamos a fundo as pesquisas, elas nos alertam que não existe, na verdade, uma racionalidade na hora da votação eleitoral, e isso é um problema. Ser politizado é ser capaz de compreender a importância da ação política e de se tornar consciente dos deveres e direitos do cidadão. Em um regime democrático, temos apenas o momento da eleição para realmente condenar a corrupção sistêmica da forma mais eficaz possível. E ainda escolher o candidato mais competente na administração pública.
Apenas para exemplificar o que pretendo dizer, é com tristeza que vemos um ex-presidente preso, que obteve direito de defesa em todo o sistema jurídico brasileiro, liderar as pesquisas para os presidenciáveis nas próximas eleições. Ele contratou excelentes advogados, foi para a segunda estância, recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça, foi debatido no STF, e, enfim, a prisão prosseguiu. Mesmo que a figura política seja um condenado, de acordo com a Datafolha, ele continua líder na corrida eleitoral de 2018. Como é possível que a população vote em um condenado?
Sem entrar no mérito da questão da defesa dos advogados para o seu cliente, esse comportamento mostra que o que determina as escolhas de votação não são critérios técnicos racionais. Algumas pesquisas alegam que até mesmo a “primeira impressão” e uma beleza facial afetam na tomada de decisão do candidato, além das questões da proximidade ideológica, doutrina e paixão. E isso não tem ligação com a alta formação acadêmica ou por pertencerem à população pobre ou privilegiada.
Encontramos uma ótima metáfora no futebol. Ninguém muda de time só porque o clube ganhou de forma injusta, jogando mal ou porque comprou o juiz. A torcida comemora a vitória e continua a torcer nos próximos jogos. Observamos assim que são muito raras as mudanças de paixão, seja no esporte ou na política.
No Brasil o voto não está nas mãos da razão e sim da paixão. Uma escolha que deveria ser feita por meio de critérios técnicos carrega o tom de algo totalmente irracional. Hoje, existem pensadores, acadêmicos e artistas que votariam no ex-presidente, e declaram que ele não é um “político preso, mas um preso político”. Então, essa conduta não é exclusiva de pessoas de baixa renda, com baixa escolaridade. Assim, podemos retomar a analogia do futebol. Existem torcedores do Corinthians, Palmeiras, Flamengo, entre outros times, de todos os níveis sociais, com diversos graus de escolaridade, porque a relação com o clube é de paixão. Atualmente, vemos a identificação com o político da mesma forma, por questões extremamente subjetivas.
Então, no Brasil, a política se tornou uma conversa de botequim. Antes, falávamos de futebol e ganhar dinheiro. Agora, falamos de política com mais frequência. Podemos perceber que o tema está mais na boca do povo, mas isso não quer dizer que o brasileiro tenha se tornado mais politizado. Ainda existe um longo caminho para que isso aconteça.

Rabino Samy Pinto é formado em Ciências Econômicas e é o responsável pela sinagoga Ohel Yaacov