Oito anos depois das alterações na Lei de Lavagem e só após as denúncias contra advogados investigados na Lava Jato pelo desvio de recurso do Sistema S, no Rio, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) diz que vai regulamentar as normas de prevenção a este tipo de crime para a advocacia.

“A OAB reconhece que aprimoramentos de medidas de compliance são necessários. As regras em discussão devem necessariamente proteger o sigilo da relação com o cliente, que é privada, e não pode ser violado. As prerrogativas para o pleno exercício da advocacia são garantidas pela Constituição”, informou, por meio de nota.

A manifestação da Ordem aconteceu depois de ela ter sido cobrada pelo Ministério da Justiça sobre recomendação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla) feita em novembro. No ano passado, os notários passaram a seguir as regras para informar operações suspeitas com imóveis, deixando a advocacia no incômodo papel de ser a única das profissões que ainda não estabeleceu normas de autorregulamentação.

Diretor executivo da Transparência Internacional Brasil, Bruno Brandão, diz que, com a falta de regulamentação na advocacia, o Brasil corre o risco de ver prejudicada sua inserção internacional. “Essa pendência leva ao descumprimento de obrigações internacionais do Brasil”, diz ele. “A principal é com o GAFI, que regulamenta essas práticas anti-lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, e tem uma recomendação explícita para advogados. O Brasil já sofreu algumas advertências do GAFI, e isso (a falta de regulamentação) pode criar uma situação de inconformidade.”

Para a subprocuradora-geral de Justiça Luiza Frischeisen, o exercício da advocacia não pode sugerir ou proteger atos criminosos de clientes. Ela cita o caso Panamá Papers. “O escritório Mossack Fonseca montava operações irregulares de lavagem de dinheiro. A advocacia precisa ter regras de compliance.”

Especialista em compliance e professor da Universidade Estadual do Rio (Uerj), o procurador regional da República Artur Gueiros defende o modelo adotado pela Holanda para o Brasil. Ali, a entidade dos advogados montou um órgão para receber as comunicações dos advogados sobre operações suspeitas. É este órgão – que deve ser independente da comissão de ética – que decide quando se deve repassar a informação às autoridades de combate à lavagem.

Riscos

Professora de direito da FGV, Heloisa Estellita diz que, caso o sigilo profissional não seja contemplado na regulação, existe de fato “um risco de que uma determinação de comunicação de operações suspeitas possa prejudicar o exercício do direito à defesa”. Para ela, a regulamentação é importante quando o advogado é quase um gestor na abertura de negócios e para proteger o que seria uma “zona cinzenta”. “Por exemplo, quanto devo cobrar nos meus honorários por um parecer? Claro que a OAB não tem que determinar o valor, mas tem que fazer uma cartilha de boas práticas.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.