Franklin de Freitas – Jackson Friesen se divide entre a faculdade

Nas duas últimas décadas, as portas do ensino superior no Brasil se abriram para o povo, tanto nas universidades públicas, com a criação de cotas raciais e sociais, como nas universidades particulares, com o lançamento de programas como o ProUni e o Fies. Mas se o ingresso nas faculdades, universidades e centros universitários foi ampliado, por outro lado permanece a dificuldade em conseguir se manter durante os estudos. E é aí que muito jovem tem de ‘se virar como pode’ para fazer a coisa toda acontecer.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicados no suplemento “Educação” da PNAD Contínua, no Paraná 17,09% dos jovens com idade entre 15 e 29 anos estudam ao mesmo tempo em que trabalham. Os dados, com 2018 como ano de referência, apontam que mais de 432 mil paranaenses se enquadram nessa situação, enquanto 626,5 mil jovens (24,77%) apenas estudam, outros 1,02 milhão (40,48%) apenas trabalham e 446,7 mil (17,66%) não estudam e não trabalham.

Aos 18 anos, Isac Messias Michelon se enquadra entre aqueles que conciliam o estudo com o trabalho. Cursando Matemática na Universidade Federal do Paraná (UFPR) desde o começo do ano passado, ele começou a dar aulas particulares no segundo semestre de 2019 a fim de conseguiir dinheiro para arcar com os custos da universidade (compra de livros, xerox, materiais, etc).

“Estava precisando de dinheiro para pagar as coisas da faculdade e consegui uma aluna que estava no primeiro ano do ensino médio. Acompanhei ela bastante no último trimestre, nos encontrávamos duas a três veses por semana para estudar de 1 a 2 horas”, conta Isac. “Agora estou divulgando meu trabalho pro início do ano letivo. Já consegui dois alunos e possivelmente aparecerão mais quando chegarem as provas, vestibulares, essas coisas”, complementa.

Outro que está tendo de se desdobrar para poder estudar e se sustentar é Jackson Friesen. Aos 31 anos, ele está terminando a sua primeira graduação, em biblioteconomia. Para poder pagar o curso e manter a família — é casado e tem um enteado adolescente —, trabalha no período da tarde em uma biblioteca, fazendo estágio, e no período da noite atua no Purple Reis como bartender.

“O curso que eu faço é EAD, então fica mais fácil de esquematizar os horários, conciliar com o trabalho. Não é fácil, mas é necessário. Só assim para conseguir pagar as contas de casa e bancar o curso”, comenta Jackson. “Agora na metade do ano eu me formo e daí quem sabe dá uma aliviada. Minha esperança é ser contratado para continuar trabalhando na biblioteca onde eu estagio.”


Condição de estudo e situação na ocupação no Paraná

(jovens de 15 a 29 anos. Ano de referência: 2018)

Não trabalha, mas estuda 626.539
Trabalha, mas não estuda 1.023.853
Trabalha e estuda 432.239
Não trabalha e não estuda 446.649

Total 2.529.280

Fonte: IBGE, PNAD Contínua Educação.


446 mil

Geração ‘Nem-Nem’?

Enquanto um grande número de jovens se divide entre trabalho e estudos, outros tantos não fazem nem uma coisa, nem outra. É a chamada geração ‘nem-nem’, que não trabalha e nem estuda, e que no Paraná soma 446,7 mil jovens com idade entre 15 e 29 anos. Apesar do tom pejorativo que a expressão ganhou, a maioria desses jovens não está ocioso e também não se encontra nessa situação por vontade própria, simplesmente. “Eles têm expectativas baixas em relação aos outros jovens, pois acreditam que exercem menos poder sobre os acontecimentos da vida deles e que têm menor capacidade em resolver problemas, em alcançar objetivos de longo prazo”, explica Joana Costa, economista do IBGE, apontando ainda políticas educacionais como solução ao problema.


O que era para ser temporário virou opção de carreira

Em seu primeiro trabalho como professor particular, Isac Michelon conseguiu resultados expressivos. Sua aluna, que havia tirado nota 4 no trimestre anterior, conseguiu um 9 no trimestre derradeiro, deixando de lado o temor da reprovação em matemática. Como estuda no período da tarde, as aulas acontecem de manhã, de noite ou então nos finais de semana.

O mais curioso, no entanto, é que, quando começou a dar aulas, Isac tinha apenas a intenção de complementar a renda, conseguir um dinheiro extra. No final das contas, o que era para ser um bico já acabou virando uma opção de carreira.

“Na verdade, minha ideia com Matemática era ir para a área de pesquisa. Mas com as matérias, vendo, dando as aulas, comecei a me interessar por isso, gostei bastante de dar aula”, diz Isac. “Eu estou decidido que quero ir para essa área mesmo. Meu objetivo é seguir numa instituição de ensino superior, ser pesquisador e professor”, finaliza.