Jotta Maritz/Facebook/Appad

“Direitos valem mais, não aos cortes sociais”. Esse é o tema da 19º Parada da Diversidade LGBTI de Curitiba que será realizada neste domingo (18), no Centro Cívico. Pela 14ª vez organizada pela Associação Paranaense da Parada da Diversidade (APPAD), o evento, que terá concentração a partir do meio-dia na Praça Dezenove de Dezembro, é considerado um dos mais politizados do País. O ato é o primeiro de grande porte no gênero realizado depois da eleição de Jair Bolsonaro (PSL) como presidente da República.

São esperadas 60 mil pessoas em Curitiba. O recorde de público na capital paranaense ocorreu em 2009, quando 150 mil pessoas, segundo a Polícia Militar (PM), participaram do ato. “Em 2018 a expectativa é de superar os 60 mil do ano passado”, afirma o ativista Marcio Marins, presidente da ONG que organiza a parada. Neste ano, em razão de declarações consideradas homofóbicas do presidente eleito, o movimento LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e intersexuais) se mostra apreensivo, especialmente para o futuro. 

Segundo Marcio Marins, neste ano, em especial por causa das eleições, a procura de organizações por engajamento tem sido maior. Diferentemente da "Marcha da Diversidade", geralmente realizada entre maio e junho, que não permite que se assumam “bandeiras” no evento, a Parada é um dos que convergem com outros movimentos sociais. “Houve muita procura depois das eleições, muitos movimentos sociais aderindo. Não vai para a Parada apenas o movimento LGBTI, vai o movimento negro, feminista, juventude”, afirma Marins.

Para o organizador, o evento ainda terá as mesmas plataformas dos anteriores, já que não há indícios de uma política pública que seja claramente contra o ativismo LGBTI. “Acho que do público, não (tem diferença). Essa Parada em Curitiba é o primeiro evento de grande porte depois da eleição de Bolsonaro. Acho que no nosso público não muda agora. Para os próximos anos há uma preocupação. Existem vídeos de Bolsonaro dizendo que quer acabar com direitos sociais. Se manifestar é um direito constitucional. Mas como fervo é resistência, o povo está preparado para fazer manifestações culturais”, afirma.

Sem provocações

A Parada não pretende, de maneira organizada, fazer qualquer tipo de menção a Bolsonaro, embora os participantes sejam livres para se manifestar. O tema deste ano é específico e ataca a adoção pelo País desde 2016 de um teto de gastos públicos que impede investimentos superiores à inflação em Saúde, Segurança e Educação.

“(Bolsonaro) não está na pauta. A parada de Curitiba é reconhecida fora do Paraná como uma das mais politizadas do Brasil inteiro. Esse tema está em diversos grupos. Nosso tema neste ano é 'direitos valem mais, não aos cortes sociais'. Vamos levar a discussão a Emenda Constitucional 95, que é a do Teto de Gastos, que congela investimentos por 20 anos. A população vai aumentando, o recurso fica congelado, e isso prejudica toda a sociedade, jovens, incluindo LGBTI”, afirma.

Se depender da organização, a Parada LGBTI em Curitiba será “discreta”, sem temas que possam ser vistos como “provocações”, como em anos em que as religiões foram discutidas na Parada. “Nós não levaremos nenhum tema polêmico, será a Emenda 95. Não podemos evitar que alguém vá, eventualmente, vestido de Jesus Cristo, ou uma fantasia que faça uma referência religiosa. A manifestação é livre. Mas sempre recomendamos respeito. A religião já esteve na pauta. Mas não para atacar nenhuma religião, apenas para respeitar e promover a paz interreligiosa”, afirma o organizador.

Movimentos sociais

A Parada LGBTI permite a participação de “todo e qualquer movimento social”, que pode hastear bandeiras e levar sua pauta de manifestação, diferente da Marcha da Diversidade, que contém proibições de manifestações políticas. A marcha costuma ocorrer em 17 de Maio, no Dia de Combate à Homofobia, ou 28 de junho, Dia do Orgulho LGBT. Neste ano foi em julho. Já a Parada regula seu calendário ao clima e ao cronograma de turismo da cidade. “Antes fazíamos em junho, mas deixamos de fazer há muitos anos e passamos ao segundo semestre porque tem menos possibilidade de chuva. Estávamos fazendo no primeiro domingo de novembro, mas estava coincidindo com o Enem, então mudamos”, relata.

Público movimenta o turismo de Curitiba

Diversas excursões vêm a Curitiba no feriado em razão do evento, o que é comemorado pelo setor de turismo. “Temos confirmadas excursões de 16 diferentes, de São Paulo, Santa Catarina, Interior do Paraná, e também do Paraguai e Uruguai. Fora outras independentes. Isso movimenta a economia, lota os hotéis. O sindicato da rede hoteleira apresentou pra gente que a Parada só perde para o Festival de Teatro, chegando a 80% de lotação. O festival é 85% a 90%”, diz Marcio Marins.

De caráter liberal e independente, em Curitiba, a Parada LGBTI é paga por meio de parcerias com empresas e contribuições de voluntários. Segundo a organização, o evento custa em torno de R$ 40 mil. “Em qualquer outra capital custa mais de R$ 100 mil, por causa dos shows, com Preta Gil e outros grandes. Nós valorizamos artistas locais, bandas locais, performances locais. Com trios elétricos, bandas, banners, equipamentos, camisetas, ficaria em torno de R$ 35 mil, R$ 40 mil. É preciso ficar claro que fazemos tudo sem dinheiro público. Fazemos tudo por vaquinha”, garante.

A Parada recusa qualquer oferta de dinheiro público no evento. “Nós samos às ruas junto com a classe trabalhadora na luta por direito social. Nós não entramos nos editais de financiamento público, que cai na terceirização. Ninguém aqui na associação ganha salário, ganha nem vale transporte. Somos todos voluntários e voluntárias”, afirma.

Entre as empresas parceiras está a Uber, de motoristas. “Nos últimos três anos procuramos a iniciativa privada. E conseguimos uma parceria com a Uber, por exemplo, que colabora com responsabilidade social. Paga um dos trios elétricos. Além disso, eles fazem treinamentos com os motoristas para que sejam qualificados, que saiba tratar pessoas LGBTI”, afirma.

Outras grandes empresas, como Ambev, que financia parte do maior evento LGBTI do Brasil (talvez do mundo), em São Paulo, ainda não tem parceria em outros estados, por estratégia de mercado dos próprias empresas. “Em São Paulo tem um milhão e meio só na Parada. Curitiba tem um milhão e 800 mil habitantes. Em São Paulo costuma ser de maio para junho. Eles costumam aproveitar o Corpus Christi no feriado prolongado, até porque é o segundo maior evento de São Paulo, ficando arás apenas da Formula 1”, afirma Marcio Marins.

O público da Parada em Curitiba oscilou para mais e menos desde que começou a ser realizado há 19 anos. Não há uma escala ascendente ou descendente. Para o organizador da marcha, um dos fatores que influencia na adesão do público é a necessidade de engajamento e defesa de direitos. “Vários fatores, porque não foi diminuindo gradualmente. Oscila pra cima e para baixo. A parada vem cumprindo sua função de chamar atenção para os direitos LGBTI, e por isso, acredito que na medida em que os direitos vão sendo conquistados, menos necessidade de sair para rua para fazer reivindicação. É um indicador de que o movimento vem funcionando, e que a gente vem ampliando os direitos da comunidade”, avalia.