Reprodução – Theresa May

PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – O Parlamento britânico rejeitou nesta terça (12), pela segunda vez, o acordo que define os termos do brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia (UE), aumentando a incerteza sobre a permanência da conservadora Theresa May no cargo de primeira-ministra.

Desta vez, o placar foi de 391 votos contrários ao texto a 242 a favor, ou seja, uma diferença de 149 –menos elástica do que a de 230 registrada na primeira consulta, em 15 de janeiro, na derrota mais expressiva de um governo britânico no Legislativo.

May anunciou imediatamente após a divulgação do resultado que a Casa poderá votar na quarta (13) sobre uma saída da UE com ou sem acordo, e liberou o voto para os membros de seu Partido Conservador.

Se os parlamentares descartarem a possibilidade de um divórcio sem acordo, uma nova votação deve acontecer na quinta (14), desta vez para determinar se o governo precisa ou não solicitar à UE o adiamento da ruptura, programada para 29 de março, enquanto se tenta chegar a uma outra versão do acordo que o Legislativo julgue razoável.

Essa postergação, no entanto, precisa ser aprovada por unanimidade pelos 27 Estados-membros do consórcio europeu, que esperam uma justificativa “plausível e convincente”, nas palavras do premiê holandês, Mark Rutte.

A Comissão Europeia, braço executivo da UE, já indicou que, caso o brexit vá adiante, os britânicos precisam deixar o bloco antes das eleições para o Parlamento Europeu, no fim de maio.

Em nota após a derrota, May disse: “Continuo a acreditar que o melhor resultado, de longe, é que o Reino Unido deixe a União Europeia de maneira ordenada, com um acordo”.

“E o acordo que negociamos é o melhor e na verdade o único acordo disponível.”

Para o conservador Graham Brady, os dois cenários mais prováveis são a saída da UE sem acordo ou “algum tipo de adiamento perpétuo”.

Na terça, os ajustes cosméticos que a chefe de governo conseguiu obter de autoridades europeias a menos de 24 horas da votação, em visita a Estrasburgo (França), não foram suficientes para reverter a oposição maciça ao texto entre os parlamentares.

Uma ala numerosa critica o mecanismo previsto para evitar a volta de controles alfandegários na fronteira entre as Irlandas, caso, após o Dia D do brexit, um novo acordo comercial entre UE e Reino Unido demore a ser desenhado.

O dispositivo, chamado em inglês de “backstop”, prevê o estabelecimento de uma união aduaneira entre as partes, a partir de 2021, se e enquanto a relação 2.0 entre Londres e Bruxelas (sede da governança europeia) não estiver definida até lá.

Detratores da medida veem nela uma armadilha europeia para “prender” os britânicos indefinidamente.

Na segunda (11), May obteve da UE um adendo (com valor legal) ao acordo fechado em novembro de 2018.

Na prática, as partes “lustraram” uma carta de janeiro passado em que Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, e Donald Tusk, número 1 do Conselho Europeu, comprometiam-se a dedicar seus melhores esforços à busca de uma alternativa ao “backtop”. Se ela não fosse encontrada, a vigência do mecanismo seria limitada.

No entendimento de May, esse apêndice do acordo afastaria o risco de uma tocaia europeia, garantindo a Londres a prerrogativa de contestar e até de suspender a aplicação do “backstop”.

Na manhã de terça, o procurador-geral Geoffrey Cox deu seu parecer sobre os documentos divulgados na véspera em Estrasburgo.

Afirmou que o instrumento interpretativo conjunto (nome pomposo dado à carta reciclada) e a declaração unilateral de May (de que o Reino Unido poderia se retirar da hipotética união aduaneira se a discussão da nova relação comercial não estivesse avançando) reduziam o risco de os britânicos ficarem presos à Europa. Mas a ameaça, segundo ele, ainda existia.

Foi um banho de água fria nas esperanças do governo de ver o pacto ser aprovado horas mais tarde, já que muitos parlamentares haviam dito que definiriam seu voto com base nas impressões de Cox.

Assim que a derrota se confirmou, Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista (principal força de oposição), disse que a legenda vai buscar apoio suprapartidário a sua proposta de brexit “leve”, pela qual o Reino Unido permaneceria na união aduaneira europeia em caráter definitivo e manteria uma relação próxima com o mercado comum.

Há também pressão nas fileiras trabalhistas para que o líder endosse a campanha por um novo plebiscito, o que ele tem hesitado em fazer.

Além desse cenário e dos que envolveriam uma separação sem acordo ou um adiamento do brexit, existe a hipótese de uma queda do governo May, o que poderia abrir caminho para eleições antecipadas.

Na terça, uma vez conhecido o resultado, o negociador-chefe pelo lado europeu, Michel Barnier, afirmou que, de agora em diante, só Londres poderia salvar a própria pele.

“Não haverá uma terceira chance”, disse Juncker. “Não haverá outras interpretações das interpretações, ou novas garantias das garantias se o ‘voto significativo’ de amanhã [quarta] fracassar.”

Mais cedo, o vice-presidente da Comissão Europeia já havia dado o tom: se o acordo fosse derrubado novamente, só restaria “apertar o cinto de segurança”. O tamanho da derrota do governo faz mesmo pensar que a pilota sumiu.