“Sonhei com você essa noite. Acordei assustadíssimo. Quer saber como foi o sonho?” Esse era Marcos, Janaína ouviu e errou na escolha das três letras que usaria como resposta. Ela se desconcertou com a mensagem, já não se falavam há um tempo. Almoçavam juntos pelo menos uma vez por semana na época da editora. A editora faliu e o assunto que ocupava as duas horas de bandejão, café e lotérica degringolou junto. Não que Janaína nutrisse qualquer tipo de esperança, ou até mesmo gosto, por retomar a conversa. No fundo, se doía por insistir na camaradagem de mentirinha, de conveniência talvez. Nem sei se dá pra dizer isso, Marcos era tão inconveniente!
Enfim, estava confortável com o sumiço do rapaz. Agradecida até. Podia ter ignorado o whatsapp sem nenhum problema, mas por algum mistério, desses difíceis de serem desvendados, desses que chegam a dar raiva, desses que ‘nossa senhora!’ errou. “Sim! Quero ouvir”, respondeu em profusão de emojis.

E ele? Ah, o que você acha? Deixou passar segunda, terça e quarta. Na quinta-feira, já perto da meia noite, Janaína deitada, nervosa com o rumo da vida, recebe a mensagem: “melhor não”. Depois, já nem lembrava de tantos detalhes. “Sonho foge da cabeça da gente que é uma loucura, né? KKK. Te deixei com medo, não foi? KKK. Saudades de te zoar. E você? O que anda fazendo? Bora almoçar qualquer dia desses?”
Agora pensa comigo, quando alguém chega a ficar ‘assustadíssimo’ com um sonho, qual é a historinha que passa na cabeça de quem foi sonhado? Morte, doença grave, tragédia, no mínimo, uma demissão do trabalho novo, sei lá. Pois, da segunda para a quinta, Janaína, foi ao médico, ligou para mãe em Belém, deu até uma rezadinha, voltou para a análise, fez o namorado jurar de pés juntos que andava tudo bem entre eles. Tudo isso para ouvir que sonho é coisa que se foge?

Nem escrever mensagem ela quis. Mandou um áudio, dois ou três, tons acima do que Marcos conhecia. Ele não a conhecia. “Olha aqui, meu filho, não te dou direito de me incluir em nenhum outro sonho seu. E não, não quero almoçar qualquer dia desses, nunca nem gostei de almoçar contigo, não ando fazendo nada que te interesse, e tenho horror a KKK, é cafona como você. Passar bem!” Virou para o lado e dormiu deliciosamente, livre daquele encosto. Dormiu de sonhar. Acordou assustadíssima. Quer saber como foi o sonho?

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