Em caso de irregularidade na declaração de bagagem acompanhada, não é cabível a aplicação da penalidade de perdimento de bens, e sim a cobrança do tributo devido. Com esse entendimento, o TRF da Primeira Região negou provimento a recurso da Fazenda Nacional para manter a sentença que determinou a restituição de um aparelho de ar-condicionado apreendido pela Receita Federal.

O relator do caso na Corte Regional explicou que de acordo com o art. 102 do Decreto nº 6.759/2009, quando o viajante estiver trazendo na bagagem    bens estrangeiros sem destinação comercial ou industrial, de valor superior ao limite de isenção  –, aplica-se o regime de tributação especial. O art. 689, XX, do mesmo decreto dispõe que quando a mercadoria importada não possui guia de importação ou documento de efeito equivalente, isso gera dano ao erário e implica pena de perdimento.

Para o magistrado, o conceito tributário de bagagem disposto no art. 155 do Decreto nº 6.759/2009 está ligado ao uso ou consumo pessoal do viajante, sem finalidade comercial. No caso julgado a viajante trazia um único aparelho de ar-condicionado comprado no exterior, destinado ao seu uso próprio. “Portanto encaixa-se na definição de bagagem, o que não implica em pena de perdimento”, afirmou o relator. Essa decisão confirma entendimento majoritário dos Tribunais no sentido de que em caso de irregularidade na declaração de bagagem acompanhada, NÃO É CABÍVEL A PENALIDADE DE PERDIMENTO de bens, e sim a cobrança do tributo devido.

*Euclides Morais- advogado ([email protected]) 


ESPAÇO LIVRE

Doador de material genético: direito à informação ou ao anonimato?

* Debora Ghelman

No filme canadense Starbuck, baseado em uma história real, o personagem central David Wozniak, um simples açougueiro cheio de dívidas, descobre ser pai de 533 filhos, e, para apimentar a história, 142 deles tem o anseio de conhecer o pai. David não era nenhum louco, somente havia doado material genético, sob o pseudônimo “Starbuck” para uma clínica de reprodução assistida ao longo de anos, nunca esperando que esses “filhos” viessem procurá-lo.

Nas últimas décadas, a ciência descobriu novos métodos para avançar em relação às técnicas de reprodução assistida, permitindo a geração de milhões de famílias pelo mundo e realizando os sonhos de muitas pessoas, que até então eram incapazes de reproduzir.

A inseminação artificial heteróloga, que é aquela que recorre ao material genético de um doador, é um dos meios mais populares de reprodução assistida. No caso do filme Starbuck, o que está em questão é o direito ao anonimato do doador de esperma e um verdadeiro confronto entre o conceito biológico e o afetivo de paternidade.

Inicialmente, para o Direito de Família, o pai era aquele que biologicamente gerava seu filho, sendo uma concepção restrita da paternidade. Com o avançar da doutrina, hoje a paternidade se baseia no princípio da afetividade, não sendo mais necessariamente vinculada à questão genética. Daí decorre, por exemplo, a paternidade em caso de adoção, a paternidade socioafetiva e a paternidade em caso de filho gerado com material genético alheio.

Do outro lado, existe também o direito à verdade biológica. Ou seja, teria a criança nascida a partir de doação de material genético o direito de saber qual a sua origem biológica?

Tratando-se de casos médicos ou possibilidade de casamento consanguíneo, é passível que o anonimato do doador de esperma possa ser flexibilizado. Mas o que deveria prevalecer nos casos em que não ocorrem essas condições?

Em Portugal, a questão foi debatida diversas vezes. No ano de 2006, foi editada uma lei garantindo o sigilo completo à identidade do doador. A lei foi baseada no direito ao planejamento familiar, que não incluiria a introdução do doador no seio da família e no direito à sua privacidade, que não planejou ser reconhecido como pai no futuro. Mas, em 2018, o Tribunal Constitucional Português reverteu a lei e decidiu que o direito à verdade biológica deveria se sobrepor ao anonimato do doador. Hoje, essas informações são acessíveis para as pessoas geradas através de reprodução assistida.

Já em outros países, como na Espanha e na França, os tribunais decidiram que deveria prevalecer o anonimato, em respeito à atitude altruísta de quem doa material genético e possibilita a expansão das famílias.

No Brasil não há lei específica sobre a questão, o que gera insegurança jurídica. Mas temos a Resolução 2168 do Conselho Federal de Medicina, que traz diretrizes importantíssimas para o procedimento. O CFM determina que os doadores não tem direito a conhecer os receptores de material genético e vice-versa. O sigilo só pode ser levantado caso haja motivação médica e, mesmo assim, somente os médicos terão acesso à informação.

O direito ao anonimato ou à informação em casos de doação de material genético deveria ser discutido na legislação brasileira. Não ter uma lei que trata dessa situação cada vez mais frequente nas famílias brasileiras pode gerar confusões e situações complicadas que os tribunais vão ter dificuldades para resolver. Além disso, pode acabar afastando as famílias que desejam crescer usando este método e pessoas que querem ser doadores também, pois não há uma lei que os ampare.


*A autora é advogada especializada em Direito Humanizado nas áreas de Família e Sucessões, atuando na mediação de conflitos familiares a partir da Teoria dos Jogos. 


DESTAQUE

É possível a penhora de cotas sociais de empresa para garantir dívida pessoal do sócio

A 3ª turma do STJ negou provimento ao recurso especial de dois sócios que tentavam anular a penhora de suas cotas em empresas com processo de recuperação judicial.  A Advogada Sabrina Rui explica que não a vedação legal à medida e que o recurso teve origem em execução promovida por uma empresa para cobrar a dívida de cerca de 600 mil reais.

O juízo de primeiro grau deferiu o pedido de penhora sobre cotas sociais dos devedores em 6 sociedades empresárias, sendo que duas delas estavam em recuperação judicial. Contra essa decisão, dois dos devedores recorreram, sustentando entre outros pontos, que a penhora de cotas impõe aos sócios o ingresso de pessoa estranha ao quadro social, em prejuízo da affectio societatis. Foi alegado ainda que, tendo sido aprovado o plano de recuperação das duas empresas, a substituição de administradores nesse caso teria de ser aprovada pela assembleia de credores. Entretanto, “O TJ/SP rejeitou o recurso, considerando que a recuperação da pessoa jurídica não impede a constrição judicial de patrimônio que pertence aos sócios” explica a advogada.

O autor do voto que prevaleceu no julgamento do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que, nos termos do artigo 789 do Código de Processo Civil, o devedor responde por suas obrigações com todos os seus bens – entre os quais se incluem as cotas que detiver em sociedade simples ou empresária –, salvo as restrições estabelecidas em lei.

O ministro citou precedentes do STJ no sentido de que é possível a penhora de cotas societárias para garantir o pagamento de dívida particular do sócio, pois não há vedação legal nem afronta à affectio societatis, uma vez que a constrição não leva necessariamente à inclusão de novas pessoas no quadro social.

Quanto à hipótese de sociedade em recuperação judicial, o magistrado ressaltou que poderia haver restrição à liquidação das cotas penhoradas, mas não à penhora em si. 


PAINEL JURIDICO

Webinar

Processo migratório laboral para o Brasil é tema de webinar da Andersen Ballão Advocacia. Necessidade de visto, autorização de residência, documentação, aspectos tributários e trabalhistas da residência no país serão abordados em discussão virtualqueocorre no dia 17 de novembro, às 11h, pela plataforma Zoom, com inscrição gratuita. Quem explicará os tipos específicos de autorização de residência necessários é a advogada Gisele Pereira Mendes. O advogado Ariel Palmeira irá abordar as normas tributárias brasileiras que podem ser aplicadas aos expatriados que chegam ao Brasil e o advogado Edson Hauagge abordará aspectos que recaem na esfera trabalhista. Inscrições: https://bit.ly/2IjPaVN

Podcast

O escritório Accioly, Laufer Sociedade de Advogados acaba de lançar o podcast Fragmentos. O objetivo dos advogados Maria Francisca Accioly e Daniel Laufer é discutir temas ligados ao Direito Penal e ao Processo Penal sempre com um especialista convidado. Quinzenal, o primeiro episódio contou com a participação do criminalista Dr. José Luis Oliveira Lima. O tema da conversa foi o acordo de não persecução penal incluído no CPP com a edição da Lei 13.964/2019. Para ouvir acesse: https://acciolylaufer.com.br/podcast/ 

Congresso

O advogado Carlos Alberto Farracha de Castro participa do I Congresso Internacional de Direito Comercial (CIDCOM), realizado entre os dias 9 e 13 de novembro. O congresso é organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) da PUCPR, em parceria com a Escola de Direito da PUCRS e a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Inscrições gratuitas na  plataforma SymplaConfira aqui a programação completa. 


DIREITO SUMULAR

Súmula 606 do STJ – Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997. 


LIVRO DA SEMANA

Em presença da receptividade a este livro, igualmente direcionada a apreciação dos Procedimentos Especiais disciplinados pelo Código de Processo Civil, que incorporou os procedimentos da ação de dissolução parcial de sociedade, das denominadas ações de família, da regulação de avaria grossa e da ratificação dos protestos marítimos e dos processos testemunháveis formados a bordo. A oposição, modalidade interventiva de terceiro do Código revogado, e a homologação do penhor legal, um dos procedimentos cautelares típicos daquele diploma legal, são incluídas no rol dos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa do novo Código; por sua vez, a notificação e a interpelação, igualmente reguladas como procedimentos cautelares típicos no Código de 1973, agora pertencem ao capítulo dedicado aos procedimentos especiais de jurisdição voluntária. Não mais havendo previsão de procedimentos especiais para as ações de usucapião de imóvel, de recuperação ou substituição de título ao portador, de depósito e de nunciação de obra nova, no seu processamento será observado o procedimento comum.