Franklin de Freitas – “Mirian Gonu00e7alves (PT) sobre Fruet: u201cTive uma frustrau00e7u00e3o muito grandeu201d”

Advogada trabalhista há 35 anos, fundadora da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT), a ex-vice-prefeita de Curitiba Mirian Gonçalves (PT) quer assumir a vaga da companheira de legenda Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT. Depois de 8 anos de mandato no Senado, Gleisi decidiu não concorrer à reeleição. Mirian, que coordenou duas campanhas de Gleisi, agora tenta dar sequência ao trabalho petista no Senado. “Agora o momento político é muito mais difícil e complicado”, reconhece. 

Neste ano, com o fim do mandato de Gleisi e Roberto Requião (MDB), duas vagas estão em jogo na corrida eleitoral. Até agora, o PT indicou que deve lançar apenas uma candidatura na chapa. “Por enquanto, é o meu nome”, diz Mirian. Se eleita, a pré-candidata petista pretende seguir a linha que Gleisi adotou desde 2015. “Depois do golpe, o momento exige outra postura. Farei por aí”, afirma.

Apesar de militar e fazer parte do PT desde a década de 1980, Mirian ficou conhecida quando foi indicada à vice na chapa de Gustavo Fruet (PDT) à prefeitura de Curitiba. Naquele ano, em 2010, o PT ainda desfrutava de prestígio em boa parte da população, tinha no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fonte de grande popularidade. 

A indicação de Mirian surpreendeu parte da militância, que apostava na então vereadora Roseli Isidoro como provável ocupante da vaga proposta na aliança com o pedetista. A influência de Gleisi, no entanto, pesou na indicação e Mirian assumiu a vaga. Sócia de um dos maiores escritórios de Direito do Trabalho no Paraná, o Declatra, Mirian vê como sua principal contribuição durante o mandato eletivo a gestão que fez na Secretaria Municipal do Trabalho. Ela considera ter desburocratizado a pasta, permitindo melhorar o atendimento ao público, além de ter adotado medidas saneadoras e de modernização.

“Fizemos convênio, conseguimos zerar as filas do Sine (Sistema de Agendamento do Trabalhador), passamos a fazer agendamento e as pessoas começaram a ir com hora marcada, a ser tratadas como se deve a um ser humano”, diz. Mirian também atuou em projetos de mobilidade de implantação de carros elétricos, mas que não foram levados adiante pela gestão atual.

Bem Paraná — Por que quer ser candidata ao Senado?
Mirian Gonçalves —
O Brasil vive um momento de crise profunda, que acho que nunca viveu antes. Crise política, crise de instituições, crise econômica gravíssima, que atinge diretamente as populações com maior vulnerabilidade, em especial os trabalhadores. E acho que tenho condições de defender essa pauta, por isso me coloquei a disposição, tanto do partido, quanto dos paranaenses.

BP — Alguma corrente no PT apoia sua candidatura?
Mirian Não faço parte de nenhuma corrente no partido. Tenho simpatia por todas elas, mas sou independente.

BP — Quais as diferenças de um mandato de Mirian para os da atual senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT? Seguiria a mesma linha?
Mirian — Acho que são momentos políticos diferentes. Gleisi começou seu mandato enquanto ainda nós tínhamos o governo federal e a exigência era outra. Agora o momento político é muito mais difícil e complicado. Temos uma situação de golpe, golpe de Estado, que exige uma postura, que ela tem tido desde então, de enfrentamento das questões do Brasil, da democracia. Farei por aí. Acho que o Senado tem responsabilidade pelos grandes assuntos nacionais e também na particularidade do Estado. A diferença na atuação é a do momento político.

BP — Se Gleisi preferiu não dar continuidade ao mandato no Senado, sendo pré-candidata à Câmara, o que a faz pensar que teria mais condições que ela de se eleger pelo PT no Paraná?
Mirian —
Gleisi não deixou de ser candidata porque não seria eleita. Ela faz essa opção por conta das responsabilidades políticas que ela tem hoje no Brasil inteiro. Eu acho que tenho uma trajetória pessoal e política, que será considerada. Se vou ser eleita ou não, espero que sim. Mas a gente hoje não tem certeza de nada. Eu mesma participei de uma eleição em que nós estivemos em terceiro lugar até o último momento (nas pesquisas) quando fomos eleitos para surpresa geral. Não acho que tenho mais ou menos condições do que ela, só condições diferentes.


IMPEACHMENT

'O prefeito apoiou o golpe'

Bem Paraná — Qual sua visão sobre reforma na previdência?
Mirian Gonçalvez —
Quando você tem uma dívida você tem que escolher como pagar. Ou você tira dos mais pobres ou dos mais ricos. Muito antes de pensar em uma reforma previdenciária que mudes as regras para a aposentadoria eu tentaria por exemplo cobrar dívidas dos 500 maiores devedores. Tem algumas que são impagáveis, como Varig, Vasp, não sei se têm patrimônio para isso. Mas, pelo amor de Deus, JBS, Bradesco e Vale têm uma dívida com a previdência que essa sim tem que ser tratada. Além de alguns privilégios na previdência, como de militares, de filhas que recebem enquanto não casam.

BP — Qual é seu projeto para o Senado? Alguma proposta concreta?
Mirian —
Começamos pela Petrobras. É uma barbaridade o que estão fazendo com a Petrobras, entregando o Brasil. A venda dos direitos de exploração do pré-sal é inadmissível. A preservação de matrizes energéticas do País. Não é possível conceber, por exemplo, uma privatização de Itaipu Binacional. Sabemos que já tem uma empresa chinesa interessada. Acho interessante, me desculpe se saí do assunto, mas que Temer não tenha caído. Por que Temer não caiu? Uma rejeição inédita no país, com escândalos de corrupção, seus ministros caindo feito fruta madura, uma política de petróleo bárbara, com preço da gasolina a R$ 5,00. Por que não caiu Temer? A resposta é: (Dilma Rousseff caiu porque) havia, sim, um preconceito contra o PT. E Temer serve muito bem ao capital estrangeiro.

BP — Se o Congresso tivesse acatado a denúncia contra o presidente no ano passado, na sua visão, teria sido melhor para o País?
Mirian —
Nada pode ser pior para o Brasil, a não ser a Ditadura Militar, talvez (Jair) Bolsonaro, do que Temer. Nada que nos torne servil ao capital estrangeiro pode ser bom para o Brasil. A antecipação das eleições diretas talvez tivesse sido o correto. Na verdade, o erro começou com o golpe. Os próprios senadores, no dia da votação, diziam que Dilma estava caindo por impopularidade. Não diziam o motivo para tirá-la. Se fosse por impopularidade, o que é que estamos fazendo com esse senhor lá?

BP — Uma de suas divergências marcantes com o ex-prefeito Gustavo Fruet (PDT) foi quando a senhora assumiu a prefeitura por alguns dias e regularizou terrenos na CIC. O prefeito voltou de viagem e revogou o decreto. Como é a relação hoje?
Mirian —
Eu tive uma frustração muito grande, que foi exatamente na regularização daqueles terrenos. As pessoas moravam ali há muitos anos, há muito tempo se podia ter feito essa regularização e não foi feita. Com aquele decreto que eu assinei foi criada uma polêmica e um estratagema para não permitir a publicação do decreto que foi uma barbaridade. Com isso, nós deixamos de promover a segurança de moradia para cinco mil pessoas. Isso não teria gerado ônus para a prefeitura em nenhum centavo.

BP — Mas o relacionamento com o prefeito mudou?
Mirian —
Houve dois momentos. Um antes do golpe e outro depois do golpe. O prefeito fez coligação com o Partido dos Trabalhadores e enquanto não teve o golpe foi um. E depois foi outro. O prefeito apoiou o golpe. Obviamente que o relacionamento só podia mudar. O decreto não era contra o prefeito. Houve má vontade com as pessoas das ocupações e uma má vontade comigo.


FINANCIAMENTO

'Todo dinheiro que ganhei foi do meu trabalho'

Bem Paraná — Seu escritório tem entre os clientes uma carta ampla no movimento sindical, que representa volume significativo de dinheiro, seria beneficiado também por uma lei trabalhista rígida. O escritório tem um instituto que atua em defesa da classe trabalhadora. Isso não expõe o PT mais uma vez a um cenário em que uma senadora tem o escritório beneficiado por movimentos, ou mesmo por “leis rígidas”? Qual sua visão da reforma trabalhista?
Mirian —
Todo dinheiro que já ganhei nessa vida foi decorrente do meu trabalho, tudo declarado em imposto de renda e jamais foi questionado. Não devo um único centavo ao Fisco ou a ninguém. Segundo, é um mito colocar que trabalhadores sempre ganharam demais ou que a Justiça do Trabalho sempre privilegiou os trabalhadores. Ao contrário, privilegia os empregadores. O que é devido aos trabalhadores já é devido sem ter que entrar com ação na Justiça. Ele só entra com ação quando direitos deixam de ser pagos e só recebem daquilo que já tem direito o que conseguem provar. Aí tem aqueles que dizem que “é só entrar que ganha”. É, se o empregador tiver deixado de cumprir o que era seu dever. Uma ação hoje na Justiça do Trabalho pode levar 5, 8 ou 10 anos. A reforma não atinge, de qualquer forma, ações passadas. O que atinge é o trabalhador, desde já. E eu nunca deixei, em momento algum, minhas convicções políticas se misturarem com questões pessoais, financeiras ou da minha atividade de trabalho. Ao contrário. Ganhar dinheiro para mim foi um bônus. Nada do que eu fiz exatamente, de defender os trabalhadores, defender as causas, tinha como objetivo ganhar o dinheiro.

BP — Um dos problemas que a senadora Gleisi Hoffmann teve com a Justiça envolve um advogado de campanha dela que prestou serviço a uma empresa que prestou serviço ao Ministério do Planejamento, então comandado pelo marido de Gleisi, ex-ministro Paulo Bernardo. O fato de seu escritório prestar serviços à CUT e diversos sindicatos poder ser beneficiado, por exemplo, com acordos trabalhistas envolvendo o governo, hipoteticamente, não seria incorrer em um erro que o PT já cometeu?
Mirian —
 Vamos por partes. Meu escritório, eu ou qualquer pessoa do meu escritório jamais foi beneficiado por qualquer valor, ação ou qualquer coisa de qualquer governo, petista ou não. Jamais. Tive um instituto e ainda tenho que se chama Instituto de Direito e Democracia, que já tem 8 ou 9 anos e jamais recebeu um único centavo do PT, do governo federal ou qualquer governo petista exatamente porque ele sempre foi financiado por mim. Eu não queria que houvesse qualquer dúvida de que pudesse ter sido beneficiado indevidamente. Segundo, quando fui à prefeitura, até por uma questão legal, me afastei da advocacia.

BP — Quanto aos sindicatos?
Mirian —
Nós já somos contratados de antes. Nós fundamos a CUT. Nós só trabalhamos para sindicatos cutistas. Então, ao contrário, está (a candidatura) tirando uma advogada modestamente razoável do escritório. Não é um bônus para o escritório, é um ônus. Eu coordenei a primeira campanha da senadora Gleisi ao Senado, em 2006. Fiquei afastada do escritório para isso. Em 2008 coordenei o plano de governo dela para a prefeitura e nesse período também fiquei afastada do escritório. Eu espero que os trabalhadores me apoiem porque vou defender a causa dos trabalhadores.

BP — A senhora já se posicionou contra o financiamento de campanha por empresas. Como é a distribuição do fundo eleitoral para campanhas no PT? O recurso da sua candidatura será o mesmo de outros candidatos do partido ao Senado?
Mirian —
 Eu nunca me posicionei, mas o partido se posiciona, sim, ao financiamento privado. Mas, não, eu não sei quanto (do fundo será destinado à campanha). A única coisa que sei dizer é que certamente será uma campanha menos ostentosa. Acho que para todos, e até porque acho que o eleitor não quer mais.