BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Sob pressão do Legislativo e do Judiciário, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) recuou nesta quarta-feira (22) e fez alterações no decreto que flexibilizou as regras sobre o direito ao porte de armas e munições no país.


A nova versão da medida foi publicada no Diário Oficial da União e proíbe que cidadãos comuns portem armas de fogo como fuzis, espingardas e carabinas, permissão que havia sido criticada por especialistas em segurança pública.


A iniciativa também estabelece em 14 anos a idade mínima permitida, com autorização dos pais, para a prática de tiro esportivo. O decreto anterior concedia a autorização para menores de 18 anos, mas não definia idade mínima.


Com o gesto do presidente, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado teve de adiar a discussão sobre o tema, prevista para a manhã desta quarta (22).


O governo ganhou tempo para enfrentar as resistências no Congresso, porém não diminuiu os obstáculos à medida, considerada ainda exagerada por parlamentares.


O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, chegou a dizer que esperava pacificar a situação com as mudanças. “Acaba a polêmica”, disse o ministro.


Diante das mudanças publicadas no DO, por exemplo, os decretos legislativos que haviam sido apresentados pela oposição para sustar o de Bolsonaro perderam o objeto, mas começaram a ser reapresentados em seguida.


A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) protocolou um, e Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Fabiano Contarato (Rede-ES), outro. O petista Humberto Costa (PE) pretende fazer o mesmo.


“A norma editada exorbita e colide com dispositivos já em vigor no Estatuto do Desarmamento. Na prática, o governo pretende contornar as limitações impostas e ampliar o porte de armas para categorias não contempladas pelo Estatuto”, afirmou Eliziane.


Relator da proposta na CCJ, o senador Marcos do Val (Cidadania-ES) terá de apresentar um novo relatório, provavelmente na semana que vem.


Do Val havia se manifestado a favor do decreto, apesar de pareceres contrários de técnicos da Câmara.


Há duas semanas, esses técnicos produziram notas que indicam que a medida de Bolsonaro extrapola limites legais, distorcendo o Estatuto do Desarmamento em vários pontos e exorbitando o poder regulamentar do Executivo.


Eles citam, entre outras coisas, que o decreto extrapola seu poder regulamentar ao estabelecer uma presunção absoluta de que todas as 20 categorias listadas no texto cumprem requisito básico para andarem armadas.


No parecer que seria apresentado nesta quarta, Marcos do Val começa sua defesa argumentando que o referendo realizado em 2005 aponta que 63% dos brasileiros votaram a favor do comércio de armas.


“Notória e logicamente, a população brasileira se manifestou favorável à liberação da posse e do porte de armas no Brasil. Caso contrário, por via reflexa, não haveria sentido em liberar a comercialização de armas”, diz o relator.


O texto publicado nesta quarta aumenta a lista de munições de uso restrito no país, incluindo de canhões e de morteiros, e restringe rojões, foguetes, mísseis e bombas.


O prazo para informar à Polícia Federal e ao Comando do Exército a aquisição de armas de fogo também foi ampliado, de dois para sete dias úteis após a aquisição do aparato.


A medida ainda especifica quantas armas de fogo podem ser adquiridas por colecionadores, caçadores e atiradores e por integrantes das Forças Armadas, limites que não tinham sido previstos.


Ela detalha a validade do registro do porte de armas em dez anos, período que não havia sido especificado na medida anterior, e estabelece que será a Polícia Federal quem expedirá a autorização para a prática esportiva.


Além disso, a iniciativa também expandiu as categorias consideradas de atividade de risco e que, portanto, têm direito ao porte, incluindo guardas portuários e integrantes do Ministério Público.


Na área rural, ela restringiu a autorização do porte de armas, estabelecendo que será concedida apenas para proprietários de imóveis que se dedicam “à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial”.


Além das mudanças publicadas nesta quarta, a Casa Civil iniciou uma reanálise de pontos considerados polêmicos do decreto de armas.


Segundo relatos à reportagem, duas questões que devem passar por estudo, com a possibilidade de alteração, são a regra que prevê a efetiva necessidade de transporte de armas a categorias profissionais, como políticos e jornalistas, e a extensão do porte dos dispositivos letais a todos os praças das Forças Armadas.


Os dois pontos têm sido criticados por especialistas em segurança pública e por professores de direito, que avaliam que essas mudanças não poderiam ter sido estabelecidas por meio de um decreto presidencial. Os itens também foram questionados por uma análise técnica feita pela Câmara dos Deputados.


O processo de reanálise é feito pelo setor jurídico do Palácio do Planalto e é voltado para trechos que são considerados sensíveis e com potencial de questionamento jurídico. O objetivo é identificar o que pode ser modificado e que não altere o sentido geral da medida.