PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Os negociadores britânicos e europeus chegaram a um acordo sobre os termos da saída do Reino Unido da União Europeia (UE), o “brexit”.

A sintonia por ora é meramente técnica. Falta acertar os ponteiros políticos e diplomáticos, o que pode levar algum tempo.

O acerto prevê o estabelecimento de uma união aduaneira cobrindo Grã-Bretanha (Inglaterra, País de Gales e Escócia), Irlanda do Norte e os países do bloco comum, dentre os quais está se encontra a República da Irlanda, que faz fronteira com a do Norte.

Esse cenário se concretizaria se não houvesse outra combinação até 29 de março de 2019, data do desligamento britânico.

O documento ainda precisa ser analisado pelo gabinete da primeira-ministra britânica, Theresa May, do qual ecoaram nos últimos dias críticas veladas (e outras nem tanto) ao que seria uma “rendição” da chefe às condições fixadas por Bruxelas, onde fica a sede da Comissão Europeia.

Espera-se que Londres feche a questão sobre o acordo até esta quarta (14). Depois disso, os líderes europeus têm de aprovar o teor do texto (já havia datas reservadas no fim de novembro para uma cúpula excepcional), que também passará pelo crivo dos Parlamentos britânico e Europeu.

A união aduaneira cobrindo toda a extensão do Reino Unido foi uma contraproposta de May à ideia europeia de, não havendo acordo até o “brexit”, manter provisoriamente a Irlanda do Norte sob o guarda-chuva de Bruxelas.

Nos dois casos, o intento era evitar que a fronteira entre as Irlandas voltasse a ser “dura”, ou seja, com controle rígido de mercadorias e pessoas, o que inexiste desde 1998 -ano em que um acordo de paz acalmou tensões nacionalistas no Norte.

A União Europeia teria aceitado a proposta de Londres em troca de algumas concessões, como o que tem sido chamado de “alinhamento dinâmico” do lado britânico a regulações futuras da UE (sobre as quais Londres não terá mais poder de voto) sobre estímulo estatal, mercado de trabalho, proteção ao ambiente e proteção social.

O que se quer com isso é evitar que empresas e negócios britânicos tenham vantagens competitivas nessas searas em relação a concorrentes europeus.

Se confirmada, a combinação deve contrariar os defensores mais radicais do “brexit”, que veem no divórcio a chance de dinamizar a economia justamente por liberá-la do arcabouço jurídico europeu.

Um ponto contencioso da última rodada de negociações envolvia as condições em que a hipotética união aduaneira poderia ser encerrada. Membros do gabinete de May insistiam em que o Reino Unido pudesse se “ejetar” do acordo quando bem entendesse.

Segundo o jornal inglês The Guardian, negociadores europeus propunham em lugar disso que o Tribunal Europeu de Justiça servisse como instância moderadora de conflitos sobre a extinção do mecanismo, além de monitorar o respeito pelos britânicos das regras de “fair play” econômico.

Após o anúncio do acordo, o ex-chanceler britânico Boris Johnson, um dos mais ferozes críticos da forma como as conversas com Bruxelas foram conduzidas por May, voltou a atacar o governo do qual fez parte até julho passado.

“É coisa de Estado vassalo. Pela primeira vez em mil anos, este Parlamento [do Reino Unido] não terá poder de decisão sobre as leis que regem o país”, afirmou. “Isso é completamente inaceitável para qualquer pessoa que acredite na democracia.” Johnson, que integra o Parlamento, adiantou que votará contra o texto quando esse chegar à Casa, o que deve acontecer em meados de dezembro.

Outra figura de proa da bancada conservadora no Legislativo, Iain Duncan Smith, foi pela mesma linha, ao dizer que o governo May pode desmoronar se os termos divulgados na terça estiverem de fato no documento redigido em Bruxelas. “Eles [o gabinete da primeira-ministra] estarão bem encrencados se trouxerem algo inaceitável para seu partido”, declarou.

O Partido Unionista Democrático, da Irlanda do Norte, peça-chave na coalizão que sustenta a gestão May, também se mostrou reticente.

O grande temor da legenda nas últimas semanas era o de que, para evitar a “fronteira dura” entre as Irlandas, as partes concordassem em realizar checagens alfandegárias no mar que separa a Grã-Bretanha de Belfast, na prática criando uma cisão no interior do Reino Unido.

Ainda em resposta à divulgação do pré-acordo, o líder da oposição, Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista, afirmou que, “dada a natureza caótica das negociações, é improvável que se trate de um bom acordo para o país”.

De seu lado, a UE enfatizou que as negociações não chegaram ao fim, já que ministros britânicos e chefes de Estado e de governo europeus, além de parlamentares dos dois lados, ainda têm de se pronunciar.