SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Como já haviam feito depois da vitória por 2 a 0 sobre a Polônia em seu primeiro jogo da Copa do Mundo de 2018, a comunidade senegalesa que vive no centro de São Paulo mais uma vez saiu às ruas em festa após uma partida da equipe.

Mesmo que o jogo tenha terminado empatado, dezenas de senegaleses e alguns brasileiros simpatizantes foram em festa do espaço onde assistiram à partida, na rua Vitória (no centro, perto da avenida São João) à esquina entre as ruas Guaianases e Aurora embalados por batuques, vuvuzelas e gritos.

Na esquina, os senegaleses pularam, cantaram e tocaram instrumentos musicais, mas uma outra cena chamou a atenção.

Os africanos “saquearam” o carrinho de frutas do vendedor Fernando da Silva, 50. Para distribuir as mexericas, bananas e laranjas que estavam à venda entre si, as arremessaram para todos os lados, gerando uma “guerra de frutas”.

Silva conta, porém, que recebeu R$ 400 dos senegaleses após a cena cômica. A reportagem viu um dos africanos entregando ao menos R$ 200 ao vendedor.

Ele diz que não ficou assustado com a “pilhagem” de seu carrinho, porque um senegalês havia prometido pagar quando arremessou as primeiras frutas.

Mesmo assim, houve uma pequena confusão quando compradores e vendedor discutiam o valor a ser pago.

No fim, Silva ficou feliz por ter vendido toda sua mercadoria em menos de cinco minutos e disse que vai torcer por Senegal na Copa.

Otimistas, senegaleses assistem ao jogo (e passam a vida) sem tomar uma gota de álcool O grito na espécie de boate adaptada com dois telões para que os senegaleses assistissem à partida na rua Vitória era “golla niaoubang” – a frase, em wolof, língua que, apesar de não ser oficial no país, é falada por muitos senegaleses, quer dizer “eu quero gol”.

Quando Sadio Mané e Molla Wagué atenderam ao pedido, um em cada tempo da partida, os cerca de cem presentes entraram em êxtase. Uma espécie de animador, com microfone, ajudou puxando gritos que os torcedores repetiram em apoio à seleção.

Alguns senegaleses acompanham a partida de uma forma peculiar: conversam entre si em wolof ou francês – esta sim língua oficial do Estado – mas xingam em português. A reportagem escutou gritos como “tira essa porra daí”, num ataque japonês, e “caralho”, numa chance perdida por M’Baye Niang no primeiro tempo. Nos gols japoneses, porém, apenas silêncio.

A principal diferença dos senegaleses em relação aos brasileiros assistindo futebol é que os primeiros não tomam uma gota de álcool enquanto veem a partida (e nem na vida) por causa de sua religião. 95% da população senegalesa é islâmica e não consome a substância. Sendo assim, nem pensar em “tomar uma cervejinha” com os amigos vendo a partida.

“Quem é muçulmano de verdade não bebe”, explica o comerciante Abdou Loato, 33, há oito anos no Brasil. (há, entretanto, algumas vertentes, como a alauíta, do ditador sírio Bashar al Assad, que admitem o consumo de álcool).

Loato é de Touba, segunda maior cidade de Senegal, e morou no Cabo Verde antes de chegar ao Brasil. “Vim porque precisava trabalhar, fui bem recebido e fiquei”, afirma. Sem esposa ou filhos, ele mora com um amigo. Mostrava otimismo no intervalo (quando a partida estava 1 a 1) e apostava na vitória senegalesa por 2 a 1.

O jogo acabou empatado mesmo, em 2 a 2, mas isso não tirou a empolgação dos africanos.

“Senegal jogou melhor, dominou a partida. Nós podemos ganhar a Copa. Somos um time pesado [usando a palavra como sinônimo para ‘bom’ ], diz Moustafa Diop, 30, nascido na capital, Dakar, e vendedor no Brasil há dez anos.

Ele se lembra da festa que houve em sua cidade natal em 2002, quando Senegal bateu a então campeã França na estria da Copa do Mundo da Coreia e do Japão por 1 a 0.

“Foi muita bagunça. Ganhamos da França, que era um time pesado. No dia dessa vitória parecia que tínhamos ganhado a Copa do Mundo”, afirma.

Já seu compatriota Samba Gaye, 29, também vendedor, é menos otimista. Acha que o time se classifica na primeira fase, mas para na seguinte. “É difícil passar das oitavas. Vamos pegar ou Bélgica ou Inglaterra”, diz.

No primeiro e único Mundial disputado por Senegal até esta edição, o país surpreendeu e, além de vencer a França na estreia, avançou até as quartas de final do torneio, quando foi eliminado pela Turquia. Nunca uma seleção africana passou desta fase em uma Copa do Mundo.