SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Lídia Corrêa Alves de Martins, sócia e sobrinha do deputado Miguel Corrêa (PT-MG), afirmou em depoimento ao Ministério Público de Minas Gerais que o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), contratou sua empresa, a Fórmula, durante a campanha eleitoral por R$ 150 mil.
Neste ano, Dias foi reeleito em primeiro turno, com 55,65% dos votos válidos.
A Fórmula é investigada por contratar influenciadores digitais para que eles publicassem elogios a candidatos do PT em suas redes sociais. As publicações não informavam que eram pagas, nem exibiam qualquer informação sobre a empresa ou político que os contratou. A prática é proibida pela legislação eleitoral.
A investigação mostra indícios de que a prática foi usada na campanha de Dias, mas também dos petistas Luiz Marinho (SP), Gleisi Hoffmann (PR), Lindberg Farias (RJ) e Décio Lima (SC).
Ação do Ministério Público proposta na semana passada acusa Corrêa e Lídia de abuso de poder econômico e pede a inelegibilidade do deputado, que concorreu ao cargo de senador, mas perdeu. A investigação foi compartilhada com os demais estados.
O Ministério Público Federal do Piauí tem um procedimento investigatório sigiloso sobre o caso –o que também poderá ensejar uma ação judicial.
No depoimento de 14 de setembro, Lídia diz que Dias contratou a Fórmula para publicar conteúdos em um aplicativo desenvolvido pela empresa, o “Brasil Feliz de Novo”, tema da campanha presidencial do PT.
O aplicativo é uma espécie de site com notícias pró-esquerda que podem ser compartilhadas pelos usuários em troca de pontos e remuneração.
“O aplicativo “Brasil Feliz de Novo” foi criado por iniciativa da Fórmula e com seus recursos humanos, porém vinculado à campanha nacional do Partido dos Trabalhadores e à militância de esquerda”, disse Lídia em depoimento. Ela afirmou ainda que o aplicativo também produziu conteúdo para Corrêa.
A investigação aponta, porém, que a ação em torno de Dias não envolveu apenas o aplicativo, mas também a compra de posts de influenciadores.
Na data do depoimento, a empresária afirmou que havia emitido a nota fiscal da primeira parcela devida pelo governador do Piauí, de R$ 50 mil, mas que não havia recebido o pagamento.
A prestação de contas do governador mostra um pagamento de R$ 50 mil à Fórmula. Segundo ele, a campanha encerrou o contrato e não pagou os demais R$ 100 mil após a imprensa noticiar as irregularidades em agosto.
Embora Lídia diga no depoimento que não trabalhou com influenciadores para alavancar conteúdos específicos, a investigação anexa emails em que funcionários da Follow, outra empresa de Lídia e Corrêa, e da Lajoy, empresa usada para recrutar os influenciadores, dão instruções sobre as publicações aos influenciadores.
Uma das ações, veiculada no dia 25 de agosto, tinha como objetivo impulsionar conteúdo sobre o governador do Piauí.
“A intenção da pauta de hoje é divulgar e enaltecer a trajetória e as ações do Wellington Dias, que concorre ao seu quarto mandato de governador do Piauí. Queremos um conteúdo leve, divertido e/ou informativo 🙂 “, diz o email de instrução aos influenciadores.
Assinada pela jornalista Carolina Gasparetto Barin, da Follow, a mensagem diz ainda que é obrigatório escrever Wellington Dias no post e monta um esquema de rodízio de horários para a publicação conforme a letra do nome do influenciador.
A influenciadora Danieli Moreira de Souza procurou o Ministério Público Federal em São Paulo para dizer que foi uma das pessoas que fez propaganda para Dias no Twitter e que estaria disposta a colaborar com a investigação.
“Entrei de boa fé, sem saber que era crime eleitoral. Estou disposta a entregar tudo o que tenho de provas, emails, etc, inclusive os que contradizem o que os representantes das agências estão dizendo em público”, afirmou.
PROPAGANDA
O caso veio à tona quando uma influenciadora digital denunciou no Twitter que havia sido contratada pela Lajoy para publicar conteúdos de esquerda e progressistas, mas que estava sendo pautada para elogiar políticos.
A investigação mostra que, de fato, os primeiros contatos com os influenciadores não explicavam tratar-se de uma ação de propaganda eleitoral para candidatos, mas de mobilização de esquerda.
Em 7 de agosto, a jornalista da Follow escreve um email aos influenciadores afirmando que a ação “visa evidenciar as pautas políticas da esquerda no Brasil”. O objetivo seria criar “unidade em torno de pautas progressistas” e derrotar a direita.
“Estamos reunindo perfis de pessoas de esquerda para construirmos nas redes sociais um debate sobre o momento político que estamos vivendo no Brasil”, escreve.
As pautas, afirma Barin, seriam 1. “criticar o governo e/ou a direita”, 2. “debater pautas progressistas”, como mulheres e LGBT, e 3. “notícias sobre a esquerda brasileira”. No dia 8, por exemplo, a pauta pedia uma crítica ao governo Michel Temer (MDB) ou à direita.
Porém, já no dia 25, a pauta pedia elogios ao governador do Piauí.
Leandro Nascimento, da Lajoy, que intermediou a contratação dos influenciadores, também escreveu a eles que a ação não tinha relação com campanha política. Joyce Falete, dona da Lajoy, diz também ter sido enganada por Corrêa.
“Essa ação não tem nenhum tipo de ligação com um candidato, a intenção é dar visibilidade às minorias e as causas que precisam ser discutidas”, escreve Nascimento. “A ideia é apenas pautar causas de ativismo, sem sinalizar realmente ser uma ação política, porém é uma ação que envolve realmente uma luta por igualdade”, completa.
OUTRO LADO
A assessoria jurídica do governador Wellington Dias informou que o contrato formulado durante a campanha era somente para a utilização do aplicativo “Brasil Feliz de Novo”, o que a lei eleitoral permite.
“O contrato já delimitava que não seria permitida a utilização ou contratação de terceiros para a execução do serviço”, diz a nota.
O texto diz ainda que a equipe não tinha conhecimento do uso de influenciadores. “Reforçamos que, em nenhum momento, foi autorizado ou orientado o pagamento a influenciadores digitais na campanha do então candidato à reeleição, Wellington Dias, portanto, não houve no pleito de 2018 qualquer ato que fosse vedado pela legislação eleitoral por parte da coordenação local que sequer se tinha conhecimento de tal atividade.”
A reportagem entrou em contato com o escritório do advogado Sérgio Augusto Santos Rodrigues, que defende Corrêa, mas não houve retorno.