O Brasil viverá tempos tempestuosos, independente de quem seja vencedor no 2º turno. O recado do eleitorado foi direto e objetivo contra os políticos tradicionais. Dinamitou o sistema partidário gerador de agremiações artificiais, cuja finalidade sempre foi manter as oligarquias intocáveis nos seus privilégios. A profissionalização da política, após a redemocratização, foi fator determinante pelo predomínio de um conservadorismo insensível às demandas e carências sociais. Ante essa realidade, paralelamente a corrupção sistêmica ganhou força como elemento integrante das políticas de Estado, tão bem retratado na “Operação Lava Jato”. O brasileiro anônimo resolveu mandar um recado direto para os tutores da política nacional. Não fosse os R$ 1,8 bilhão do Fundo Eleitoral, a renovação seria maior. 
A aposentadoria compulsória de dezenas de figuras públicas detentores de mandatos, que se achavam intocáveis, foi um grande avanço democrático. Infelizmente foi parcial, muitos oligarcas políticos continuam mandando e dominando os feudos partidários na crença de que tudo continuará como d’antes no quartel de Abrantes. A oligarquização e a concentração de lideranças personalistas comandando a vida política brasileira ainda terá vida longa. A “partidocracia” que representa unicamente os interesses pessoais e oligárquicos, relegando os interesses nacionais a função secundária, continuará intocável.
O grande e único responsável pela fragmentação partidária é o STF (Supremo Tribunal Federal). Fato ignorado pela imprensa brasileira e pelos formadores de opinião. Em 19 de setembro de 1995, o Congresso Nacional aprovou a Lei dos Partidos que dava prazo de 10 anos para adequações legais, passando a ter validade nas eleições de 2006. Era uma reforma política que mudaria a inflação partidária. Definia: “Tem direito a funcionamento parlamentar em todas as Casas Legislativas, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo 5% (cinco por cento) dos votos apurados”. Extinguia o direito gratuito ao acesso a radio e a televisão e distribuição do Fundo Partidário aqueles que não atingissem a clausula de barreira de 5%.
O que ocorreu? Quando entraria em vigor, o STF implodiu a reforma política brasileira. Usurpando do Congresso Nacional o direito de legislar, o ministro relator Marco Aurélio Mello, atendendo os pequenos partidos, votou pela inconstitucionalidade da Lei.  Foi acompanhado pelo então ministro Ayres Brito que chamou a “lei de cláusula de caveira”. Os ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia proclamavam, respectivamente, que a “lei fere de morte o sistema federativo” e “a minoria hoje tem o espaço para ser maioria amanhã.” Se a Lei não fosse derrubada pelo Supremo, em 2018 existiriam apenas 7 partidos políticos no Brasil. O populismo jurídico do STF tem grande responsabilidade no atual cenário político.
A anarquia partidária com 35 partidos registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e 63 aguardando a aprovação dos seus registros tem  no STF o grande responsável. Tornando atual o que ensinava Ruy Barbosa: “A pior ditadura é a do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”. Em 2018, o Congresso aprovou “pseuda reforma política”, estabelecendo cláusula de barreira de 1,5% e garantindo propaganda gratuita no rádio e na televisão, além dos recursos do Fundo Partidário. Reconhecendo o erro do STF, o ministro Luís Roberto Barroso constata: “Os partidos acabaram virando negócios privados. E frequentemente negócios privados desonestos.”
A realidade binária da eleição no 2º turno tem na anarquia política e partidária, gerada pelo STF, grande responsabilidade. Oxalá quem venha a ser eleito se comprometa com um governo sério e competente para enfrentar a corrupção, a economia deteriorada, a violência nos centros urbanos, a criminalidade institucionalizada, a falência da saúde pública, a péssima qualidade da educação e o corporativismo enquistados nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Sem reformas estruturais a crise ganhará nova dimensão. 

Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP)