Quem olha para a fachada do Teatro Municipal pode imaginar que durante uma tarde comum, a monumental casa de espetáculos está em pausa. Está enganado. Do lado de dentro, um mundo agitado se combina com a correria de São Paulo.

Além das visitas guiadas, locações para programas de TV e ensaios, a direção do Municipal lança um projeto piloto para ocupar a cúpula do teatro com temporadas de espetáculos. Encerra-se neste fim de semana a curta temporada de Fim de Partida, texto de Beckett, que inaugura o projeto. “Após a primeira temporada, surgiu a oportunidade de trazer o nosso bunker para cá”, diz o ator Matteo Bonfitto, que compartilha a direção com o japonês Yoshi Oida.

Espaço pouco conhecido do público comum, a estrutura circular que recobre o teto do teatro costuma abrigar atividades internas, como ensaios do coro e das músicas dos espetáculos que passam pelo Municipal. A ópera A Viúva Alegre, que estreou no dia 14, dirigida por Miguel Falabella realizou seus ensaios nesse espaço.

Para Bonfitto, narrar Fim de Partida no topo do Municipal desperta diferentes ideias sobre o fim e a morte, temas que sempre rodearam a obra de Beckett. “Não é estranho reconhecer que o autor escolheu a família e a natureza, para falar da degeneração do mundo. O bunker que esconde as personagens não está escondido aqui, mas à vista, nas alturas.” Ao lado de Bonfitto, estão no palco Rodrigo Pocidônio, Milton de Andrade e Suia Legaspe.

Durante os ensaios da peça, em Paris, o quarteto experimentou outro tipo de confinamento. A pedido de Oida, que completou 85 anos, a equipe fez seus ensaios em um espaço chamado La Guilhotine (A Guilhotina), em Paris. Grande aprendiz e ex-integrante da companhia do britânico Peter Brook, Oida conduziu um trabalho mais minimalista pelo texto de Beckett, conta Bonfitto. “Ele manteve o foco em construir no ator um canal de experiência, sempre à serviço da palavra e não apenas como uma demonstração de habilidades.”

Entre os ataques existênciais das personagens Nagg, Nell, Hamm e Clov, a peça explora os silêncios e o que há de cômico na miséria criada pelo autor. “É uma forma de enxergar fissuras no texto”, diz Bonfitto. Na peça, a manifestação da descrença e da violência apontam para uma identidade esvaziada. É como se os corpos dilacerados das personagens servissem de espelho para um mundo pronto a se despedir, mesmo que seja rindo. “Esse tipo de humor beckettiano vem de seu profundo interesse em artistas como Buster Keaton e Charlie Chaplin”, diz Bonfitto.

FIM DE PARTIDA

TEATRO MUNICIPAL.

PRAÇA RAMOS DE AZEVEDO, S/N.

TEL.: 3052-2090. SÁB., 21H; DOM., 19H.

R$ 15 / R$ 30. ATÉ 24/11.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.