NOVA YORK (FOLHAPRESS) – Depois de perder duas vezes no Legislativo a batalha para financiar um muro na fronteira com o México, o presidente dos EUA, Donald Trump, decidiu nesta sexta-feira (15) fazer valer sua vontade: declarou a situação migratória na região uma emergência nacional.


Ao fazer a declaração, a 32ª a entrar em vigor no país, o republicano consegue driblar o Congresso e remanejar recursos hoje alocados em outros itens do Orçamento.


Pelas contas do republicano, ele terá cerca de US$ 8 bilhões (R$ 29 bilhões) para reforçar a divisa, o que inclui o US$ 1,375 bilhão (R$ 5 bilhões) aprovado pela Câmara e pelo Senado na noite anterior para instalação de 90 km de cercas.


Trump conseguirá desviar US$ 3,6 bilhões (R$ 13 bilhões) de projetos militares, além de US$ 2,5 bilhões (R$ 9 bilhões) de programas antidrogas e US$ 600 milhões (R$ 2 bilhões) de um fundo do Departamento do Tesouro.


“Nós temos tanto dinheiro que eu não sei o que fazer com ele”, afirmou, ao anunciar a emergência.


Para o presidente, construir o muro não é somente cumprir uma promessa de campanha. É combater o que ele qualificou de uma “invasão de drogas, de tráfico humano, de todo tipo de criminosos e gangues” nos EUA. É deter caravanas de imigrantes “monstruosas” que partem da América Central em direção ao país.


É justamente essa argumentação que acende controvérsia entre adversários políticos, especialistas e mesmo aliados republicanos.


Os dados de apreensão de imigrantes na fronteira com o México apontam para um aumento de julho a novembro, até o patamar de 62 mil.


Mas, em comparação com o histórico dos últimos cinco anos, nada evidencia uma “invasão” como a propagada pelo presidente. Além disso, estudos mostram que a população de imigrantes irregulares no país está recuando.


Segundo o centro de estudos Pew, o número de imigrantes ilegais nos EUA recuou para 10,7 milhões em 2016, o menor nível desde 2004 e um recuo de cerca de 13% desde 2007, quando essa população atingiu o pico de 12,2 milhões.


Organizações de defesa de direitos de imigrantes ressaltam ainda que a maioria dos ilegais nos EUA não entra escondida pela fronteira, mas sim regularmente, por portas de entrada oficiais, permanecendo nos EUA após o visto expirar.


“Ele criou uma crise e está tentando resolver uma crise que não existe. Mesmo se houver uma, é resultado de políticas que ele criou. E eu não acho que a lei de 1976 permite ao presidente fabricar uma crise”, diz David Schultz, professor de ciência política da Universidade Hamline, em Minnesota.


Vários presidentes americanos já recorreram ao decreto de 1976, como George W. Bush após os atentados de 11 de setembro de 2001, e Barack Obama, durante a epidemia da gripe H1N1 em 2009.


Usar o instrumento para reforçar a fronteira “é pouco comum”, reconhece Schultz, para quem parte do problema é a falta de uma definição objetiva sobre o que se constituiria uma emergência nacional. “Aí você dá ao presidente uma ampla arma para tomar esse tipo de decisão.”


O professor adverte ainda para o risco de a estratégia de Trump minar a relação entre Legislativo e Executivo. “Há trâmites segundos os quais uma lei é aprovada, como o dinheiro é alocado.”


Em declaração conjunta, a presidente da Câmara dos Deputados, Nancy Pelosi, e o líder da minoria democrata no Senado, Chuck Schumer, qualificaram a medida de “apropriação de poder de um presidente decepcionado, que ultrapassou os limites da lei para conseguir o que ele fracassou em conseguir no processo legislativo constitucional.”


Pelosi lembrou que a iniciativa abre a possibilidade de o próximo presidente declarar emergência por um assunto que julgue importante.