Está na lei. Mais precisamente, no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Vender, fornecer, ministrar ou entregar cigarro para criança ou adolescente constitui crime, com pena de prisão (2 a 4 anos) e multa. No Paraná (a exemplo do que ocorre no cenário nacional), contudo, boa parte dos comerciantes não tem respeitado o ECA, revela estudo divulgado ontem pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA).
Segundo informações da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), do IBGE, praticamente um em cada quatro adolescentes paranaenses (25,5% do total) já consumiram cigarro alguma vez na vida. O estado, inclusive, apresenta o quinto maior índice do país de jovens que já fumaram, atrás apenas de Roraima (28,2%), Mato Grosso do Sul (27%), Rio Grande do Sul (26,4%) e Acre (26,2%).
Em grande medida, o alto índice de jovens que já experimentaram cigarro se deve à facilidade no acesso ao produto, ainda que sua comercialização a menores de idade seja legalmente vedada. De acordo com a pesquisa (de título bastante sugestivo) “Descumprimento da legislação que proíbe a venda de cigarros para menores de idade no Brasil: uma verdade inconveniente”, os adolescentes conseguem comprar cigarros com facilidade tanto no comércio varejista formal quanto no informal ambulante.
Divulgado nesta terça-feira por ocasião do Dia Nacional de Combate ao Câncer, o estudo revela que 86,1% dos fumantes com idade entre 13 e 17 anos que tentaram comprar cigarros nalgum momento nos 30 dias anteriores à pesquisa não foram impedidos. Entre os jovens com idade de 13 a 15 anos a proporção de êxito foi de 82,3%, enquanto entre os mais velhos (16 e 17 anos) chegou a 89,9%.
“Esta é uma situação muito grave, pois o descumprimento da lei que proíbe a venda de cigarros a menores pode ter contribuído para a reversão da tendência histórica de queda na iniciação ao fumo no Brasil. Dados da PeNSE mostram um aumento na proporção de fumantes entre 13 e 17 anos, de 5,1%, em 2012, para 5,6% em 2015. Esta violação está permitindo que nossos adolescentes se iniciem na dependência à nicotina,” alerta a médica do INCA Tânia Cavalcante, coautora do estudo, ressaltando que a idade média de iniciação ao consumo regular de cigarros no Brasil é de 16 anos, segundo o PeNSE.
Mesmo no comércio legal os adolescentes não enfrentam grande resistência para comprar cigarros. No Paraná, por exemplo, 33,8% dos jovens declararam ter comprado o produto nalguma loja ou botequim, enquanto 29,2% pediu ou deu dinheiro a alguém para comprar, 12,2% pegou escondido, 8,8% conseguiu com uma pessoa mais velha e apenas 3,2% comprou com vendedores de rua (camelôs).
“Combinação explosiva e perfeita”
André Szklo, pesquisador do INCA e autor principal do estudo divulgado ontem, aponta que a“combinação explosiva e perfeita” para que a iniciação ao fumo volte a crescer entre adolescentes consiste nos seguintes fatores: o amplo acesso à compra, inclusive de cigarros a varejo (unitários); o baixo preço dos cigarros legais, decorrente do congelamento dos preços mínimos (apenas R$5 por maço com 20 cigarros) e das alíquotas de impostos; os ainda menores preços dos cigarros ilegais contrabandeados do Paraguai; a exposição dos maços perto a doces e balas nos pontos de venda; e o ainda permitido uso de aditivos mentolados e adocicados, que mascaram o gosto ruim do tabaco nas primeiras tragadas da iniciação.
Para evitar que o problema se agrave nos próximos anos, ele recomenda a adoção de ações educativas e de fiscalização por parte das três instâncias de poder (federal, estadual e municipal), inclusive em parceria com organizações representatrivas do comércio varejista, conclamando ainda órgãos como o Ministério Público a promover um termo de ajuste de conduta junto às companhias de tabaco para que assumam parte da responsabilidade de fazer cumprir a lei.
Dados gerais
Experimentaram cigarro alguma vez | 25,5% |
Fumaram nos 30 dias anteriores à pesquisa | 7,8% |
Dentre os que já experimentaram cigarro, quantos fumaram nos 30 dias anteriores à pesquisa | 30,7% |
Usaram outros produtos de tabaco nos 30 dias anteriores à pesquisa | 13,8% |
Modo como conseguiu o cigarro |
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Loja ou botequim | 33,8% |
Vendedor de rua | 3,2% |
Deu dinheiro para alguém comprar | 7,6% |
Pediu a alguém | 21,6% |
Pegou escondido | 12,2% |
Conseguiu com uma pessoa mais velha | 8,8% |
Conseguiu de outro modo | 12,7% |